
12 de março de 2011 | 00h00
Outro fato a ser notado nessa discussão é que o presidente do Incra, embora seja tecnicamente subordinado ao ministro do Desenvolvimento Agrário, possui mais poder de fogo do que ele. A começar pelo número de funcionários sob seu comando: dispõe de 6 mil, enquanto os do ministro beiram a 250.
No ano passado, dos R$ 6,3 bilhões destinados pelo governo ao ministério, R$ 4,3 bilhões pousaram nos cofres do Incra, a autarquia federal que executa de fato quase todos os programas relacionados à reforma agrária. Só na compra de terras para a instalação de novos assentamentos, Rolf Hackbart, que deve deixar a presidência do Incra na próxima semana, despendeu R$ 934 milhões - quase metade do orçamento administrado pelo ministro, no valor de R$ 1,9 bilhão.
A superioridade do Incra se manifesta também no apoio às famílias assentadas (controla até programas de educação para assentados) e até em áreas onde não administra os recursos. É o caso do Programa Terra Legal, destinado à regularização fundiária na região amazônica: ele é executado pelos funcionários da autarquia, com dinheiro do ministério.
Essa disparidade entre o poder de fogo do subordinado e o do seu superior tem sido uma constante fonte de tensões. Funcionários da autarquia chegam a dizer que o ministério é dispensável. Também se afirma que a atual discussão sobre a necessidade de maior controle sobre as superintendências regionais, que são loteadas entre partidos políticos, destina-se na verdade a subordinar o Incra e transferir para as mãos do ministro a chave de todos os cofres.
As tensões ficaram mais visíveis após a posse de Dilma Rousseff, que gosta de falar em agricultura familiar e Bolsa Família, mas ainda é vista como uma incógnita em relação à reforma agrária - uma das principais razões da existência do Incra. Ela não nada até agora, por exemplo, sobre a necessidade de atualizar o Programa Nacional de Reforma Agrária, que foi uma prioridade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no início do seu governo.
O ministro Afonso Florence, que é ligado à Democracia Socialista, corrente ideológica do PT que domina o ministério desde 2003, vem exibindo por sua vez um discurso cada vez mais alinhado com o da chefe, e, consequentemente, mais distante do pessoal do Incra. Para piorar, ele ainda não reclamou abertamente do corte em seu orçamento para 2011, promovido no bojo do enxugamento geral de despesas, no valor R$ 50,1 bilhões, anunciado recentemente por Dilma.
É nesse cenário que são avaliadas propostas de reestruturação do Incra, para evitar o loteamento político das superintendências regionais e dar mais eficiência à sua administração e à aplicação dos recursos.
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