Combinação de fenômenos não pôde ser prevista

Bloqueio atmosférico agravou a situação; caso não tem registros semelhantes, segundo meteorologistas

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Por Rodrigo Pereira
Atualização:

A combinação atípica de fenômenos meteorológicos, impossíveis de ser quantificados pelos atuais sistemas de medição, provocou as chuvas torrenciais que resultaram na tragédia na região norte de Santa Catarina. O quadro foi agravado pela situação de bloqueio atmosférico, que impediu mudanças climáticas em todo o hemisfério sul e fez com que os temporais caíssem por quatro dias ininterruptos em Santa Catarina.   Número de vítimas das chuvas já chega a 84 em Santa Catarina Tragédia em Santa Catarina  Veja galeria de fotos dos estragos em SC   Número de vítimas deve subir  Para governador, será preciso muito recurso  Morador de Blumenau relata a situação  Todas as notícias publicadas sobre a tragédia   "O caso de Santa Catarina não tem registro no passado. Prevíamos uma situação extrema com três dias de antecedência, mas esses valores máximos nos surpreenderam", avaliou Maria Assunção Dias, coordenadora do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).   O Centro de Informações de Recursos Ambientais e de Hidrometeorologia de Santa Catarina (Ciram), ligado ao governo estadual, emitiu comunicado no dia 17 de novembro à Defesa Civil Nacional e Estadual, alertando para a possibilidade de alagamentos e deslizamentos – reforçados nos dias subseqüentes. "Nós estávamos prevendo chuva de 100 milímetros por dia, o que é muita coisa, mas chegou a 300 milímetros. O tempo para as autoridades tomadoras de decisão acabou ficando muito curto", disse Marilene de Lima, meteorologista do Ciram.   Maria Assunção, do Inpe, explicou que o primeiro fator das chuvas no norte catarinense foram os anticiclones formados pelo sistema de alta pressão estacionado no litoral. A posição desses anticiclones (ciclones que giram no sentido horário) provocou ventos úmidos e quentes em direção ao continente. Ao se deparar com a serra catarinense, essa massa de ar começa a formar as nuvens.   Segundo Morgana Almeida, do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), as águas do oceano próximas do litoral catarinense estão 1ºC mais quentes que no ano passado. "E essas águas da superfície oceânica contribuíram para mais chuvas."   Outro causador de chuvas atuou simultaneamente no Vale do Itajaí, conhecido na meteorologia por "vórtices ciclônicos". Eles foram originados de uma massa de baixa pressão atmosférica de aproximadamente 500 quilômetros de diâmetro e a 5 quilômetros de altura na porção central e leste do continente catarinense. Girando no sentido anti-horário, esses vórtices "sugam" o ar úmido do continente para "preencher" ou "compensar" o ar rarefeito da massa de baixa pressão. Como se encontra entre 15º C e 20º C mais fria que o ar "sugado", a massa de baixa pressão potencializa o efeito da chuva, causando os temporais.   "Os casos extremos são esses em que acontece uma conjunção de fatores que normalmente ocorrem sozinhos", definiu Maria Assunção. O estopim da catástrofe, segundo os especialistas, foi o fato de esse quadro, que normalmente provocaria grandes danos se fosse apenas passageiro, ter perdurado por pelo menos quatro dias em função do bloqueio atmosférico.   Segundo Maria Assunção, esse bloqueio é comum no verão e o atual englobou todo o hemisfério sul, provocando chuvas torrenciais na Indonésia e no Oceano Pacífico, seca no Nordeste e chuvas no sul da Bahia e norte do Espírito Santo. A coordenadora do CPTEC disse que só ontem os vórtices começaram a se dissipar, amenizando o quadro crítico de Santa Catarina – as chuvas torrenciais cessaram, mas persiste a previsão de chuva por ao menos três dias na região.

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