Congresso corta na área social para financiar turismo

Verbas para urbanização de favelas e erradicação do trabalho infantil foram principal alvo no Orçamento, mostra Contas Abertas

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Por Marta Salomon e BRASÍLIA
Atualização:

O País tem 15,1 milhões de famílias vivendo em favelas, mas as verbas públicas originalmente destinadas à urbanização e à regularização dos chamados "assentamentos precários" estão entre os principais alvos de cortes promovidos por deputados e senadores para financiar gastos maiores em turismo, durante a votação no Orçamento da União para 2011.Levantamento feito pela ONG Contas Abertas detalha os programas que encolheram para dar espaço às emendas parlamentares. A lista dos programas de governo que foram ao sacrifício é encabeçada pelos investimentos em ciência e tecnologia, que deveriam melhorar a competitividade da indústria brasileira e incluíam a instalação de laboratórios de nanotecnologia, por exemplo. Dos pouco mais de R$ 3 bilhões previstos originalmente, a autorização de gastos do programa no ano que vem minguou para R$ 2,6 bilhões. A lista de cortes inclui o programa de erradicação do trabalho infantil, embora dados oficiais mais recentes ainda registrem quase 1 milhão de crianças e adolescentes entre 5 e 13 anos trabalhando.O programa que mais ganhou verbas dos deputados e senadores leva o nome de Turismo Social no Brasil, uma Viagem de Inclusão. Na passagem do Orçamento pelo Congresso, as autorizações de gastos para 2011 mais do que quadruplicaram, ao passarem de R$ 614 milhões para R$ 2,7 bilhões. Sem constrangimento. As regras de discussão e votação do Orçamento do Congresso poupam deputados e senadores do constrangimento de apontar publicamente a origem dos recursos para cada uma de suas emendas individuais. Essa indicação é obrigatória apenas para parte das emendas apresentadas por bancadas estaduais ou comissões temáticas do Congresso. Mas a origem dos recursos aparece no levantamento do Contas Abertas. A revisão da expectativa de arrecadação de tributos e cortes em vários programas bancam as emendas dos parlamentares, que destinam dinheiro público de acordo com seus interesses e de suas bases políticas.Questionada sobre o corte de programas relevantes, a relatora do Orçamento, Serys Slhessarenko (PT-MT) esquivou-se da responsabilidade. "Eu não cortei, tem de ver quem cortou, não fui eu." No caso do programa de erradicação do trabalho infantil, o corte foi feito pela comissão setorial do Orçamento. "Eu assumo os relatórios setoriais, mas não posso fazer nada", insistiu a relatora. Entre os programas que mais encolheram entre a proposta original do Orçamento encaminhada pelo governo ao Congresso e o relatório final está pelo menos uma obra do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC): a transposição do Rio São Francisco perdeu 13% das autorizações de gasto propostas pelo governo. Saneamento. A oferta de saneamento em municípios com até 30 mil habitantes entrou na lista dos cortes e contribui com R$ 156 milhões para financiar emendas de interesse dos parlamentares. O valor é menor do que o cortado do programa de qualidade ambiental, que financiará a modernização do processo de licenciamento ambiental e ações de combate aos efeitos do aquecimento global com R$ 200 milhões a menos do que sua previsão original de gastos. A lista de cortes inclui ainda o programa de segurança de voo e controle do espaço aéreo, do Ministério da Defesa. Cortes nesse programa foram ingrediente da crise dos controladores de voo, deflagrada no fim de 2006, depois da queda de um avião da Gol, que se chocara com um jato da Embraer.

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