Controladores de vôo dizem que há ´zona cega´ na Amazônia

Profissionais relatam área onde não há vigilância nem visualização de aviões

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Por Agencia Estado
Atualização:

Os três últimos controladores de vôo ouvidos nesta quinta-feira pela Polícia Federal declararam inocência no choque entre o jato Legacy e o Boeing da Gol, no qual morreram 154 pessoas. Eles puseram a culpa pelo acidente nos pilotos do Legacy e no sistema de monitoramento do espaço aéreo brasileiro adotado pela Aeronáutica, o qual definiram como "obsoleto". Os controladores repetiram a mesma versão dos dez outros colegas ouvidos nos dias anteriores e alegaram que foram induzidos a erro por falhas do equipamento de radar e de comunicação. Segundo relato dos advogados Normando Cavalcante e Fábio Souza, que acompanharam os depoimentos, os controladores, unanimemente, garantiram que existe uma zona cega na Amazônia, que começa 200 milhas ao Norte de Brasília e se estende até a Serra do Cachimbo, no Sul do Pará, onde já ocorreram outros acidentes porque os radares e os sistemas de comunicação falham. Na área, conforme alegaram, não há vigilância radar, nem visualização das aeronaves pela torre de Brasília e até a comunicação por rádio é falha. "Alguns chamam de zona cega, surda e muda, porque você não vê, não é ouvido e não consegue falar", disse Normando. Segundo o advogado, os controladores adotaram todos os procedimentos previstos nas normas internas da Aeronáuticas. "Os depoimentos são compatíveis e deram a certeza de que os controladores não tiveram culpa nenhuma no acidente. Se houve erro foi culpa dos pilotos do Legacy e do sistema operacional", alegaram. Conforme o relato dos advogados, o controlador que assumiu o posto na troca de turno, às 16h, questionou ao que saía sobre a altitude exata do Legacy. Informado de que o jato estava a 36 mil pés, checou o dado na etiqueta eletrônica e ficou atento porque, em seguida, o aparelho deveria subir para 38 mil pés, ao chegar à posição Teres. Logo a seguir, ele percebeu a perda de sinal secundário de comunicação, ficando só com o primário. Como sabia que o Legacy entrava na zona cega, o controlador disse ter feito a primeira chamada, mas não obteve resposta. Depois, tentou mais seis vezes, todas sem sucesso. O advogado lembrou ainda que os pilotos do Legacy podiam ter acionado a freqüência 7600, usado nos casos de falha de comunicação, como manda a norma internacional, mas não o fizeram. "Se eles tivessem feito isso, a torre de Manaus teria enviado o sinal anticolisão para o Boeing da Gol", observou Fábio Souza. A PF constatou coerência nos depoimentos e a Aeronáutica criou uma Comissão Interna, que começa a funcionar nesta sexta, para definir um esquema preventivo e um conjunto de medidas destinadas a evitar futuros acidentes. Os controladores serão ouvidos novamente pela comissão. Depois de ouvir por quatro dias os 13 controladores que monitoraram o Legacy desde sua decolagem em São José dos Campos até o choque com o avião da Gol, a PF não identificou de quem é a culpa pelo acidente e nem o rol de pessoas a serem indiciadas. O próximo passo será ouvir, provavelmente na próxima semana, os pilotos do Legacy, os americanos Joe Lepore e Jan Paladino, que estão com passaportes retidos no Brasil desde o acidente. O delegado Rubens José Maleiner informou que os depoimentos dos controladores foram produtivos, mas considera prematuro falar em culpa ou em crimes antes que os dados obtidos dos pilotos sejam cruzados com as análises das caixas pretas das duas aeronaves, as perícias e demais elementos do acidente, que só esta semana foram entregues à PF por ordem judicial. Maleiner disse que os depoimentos desta quinta encerram um ciclo da investigação e na próxima semana ele entregará todos os dados coletados ao delegado Renato Sayão, titular do inquérito, que se licenciou por dez dias por problemas de saúde. Caberá a Sayão decidir se intima também os controladores da torre de Manaus, que monitoravam o Boeing da Gol. Em princípio, a PF acha essa medida dispensável porque o aparelho vinha na altitude correta e o Legacy é que estava na altitude errada.

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