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De metas a empréstimos, estudiosos propõem medidas contra homicídios

Sugestões foram apresentadas em evento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública; ideia é que governos adotem mecanismos baratos em curto prazo

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Por Marco Antônio Carvalho
Atualização:
Intenção é que, em curto prazo, governos e instituições adotem mecanismos com pouco ou nenhum custo financeiro Foto: DANILO RAMOS/Divulgação

BRASÍLIA - Pesquisadores, policiais e especialistas do Fórum Brasileiro de Segurança Pública divulgaram nesta sexta-feira, 23, a sugestão de sete medidas que consideram emergenciais para a redução da violência letal no País. A intenção dos estudiosos é fazer com que, em um curto prazo, governos e instituições adotem mecanismos e comportamentos com pouco ou nenhum custo financeiro para enfrentar o número crescente de assassinatos; em 2014, foram 58.497 crimes dessa natureza.

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As sugestões envolvem desde o diálogo e planejamento estratégico das polícias até a possibilidade de financiamento de recursos internacionais para a criação de um fundo emergencial para ações na área. A análise foi feita a partir do debate entre pesquisadores de instituições públicas e privadas, além de operadores da Justiça e de órgãos de segurança pública.

“São medidas que podem ser colocadas em prática amanhã, não precisa esperar dinheiro. O dinheiro é consequência até para saber como, onde e quando gastar. Não adianta pensar que as pessoas já sabem o que fazer porque não sabem. Do contrário, a mudança já estaria acontecendo”, disse o vice-presidente do Fórum, Renato Sérgio de Lima.

O documento pede que haja um diálogo na prática, com fixação de metas comuns entre as polícias estaduais nos Estados em que isso ainda não é uma realidade. Segundo o Fórum, apenas 11 unidades federativas estabelecem metas claras quanto à redução da violência. Focando nos currículos das academias de polícia, há também a sugestão de que haja uma revisão da matriz visando à elaboração de uma doutrina de investigação de mortes violentas, com a fixação de protocolos comuns.

Sobre as armas de fogo, os estudiosos pedem a revisão de mecanismos e sistemas para controle, como a integração dos sistemas de registros da Polícia Federal e do Exército, que hoje funcionam separadamente. O funcionamento em conjunto do banco da PF, com dados de armas de civis, e do Exército, que concentra informações sobre colecionadores, caçadores e atiradores esportivos, além de armas de policiais, está previsto no Estatuto do Desarmamento, promulgado em 2003.

Para o diretor executivo do Instituto Sou da Paz, Ivan Marques, essa medida pode ajudar na investigação dos homicídios. “Armas estão em 72% dos assassinatos e por vezes são ferramentas importantes na investigação. Só que a burocracia hoje faz com que se demore até seis meses para acessar essa informação, tempo que prejudica a investigação”, disse. “É uma mudança que dá para fazer com uma portaria, mas parece que não há vontade de fazer.”

Pensando em financiamento de futuras ações, o Fórum pede ainda a criação de um grupo de trabalho para análise da viabilidade de implementação de um fundo emergencial para ações de prevenção e enfrentamento à violência letal. Os estudiosos acreditam na possibilidade de captação internacional de recursos junto ao Banco Mundial, Banco Interamericano de Desenvolvimento e do Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF) em trâmites de dez meses.

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“A questão da segurança enfrenta uma omissão de governos ao longos dos últimos 20 anos. A nossa segurança pública está estruturada para enfrentar um inimigo e não enfrentar o problema. Tem a tradição de ver um inimigo que precisa ser aniquilado. Ao fazer isso, a gente cria estereótipos de quem é esse inimigo e reforça perfis, mais do que necessariamente enfrenta o problema”, disse Lima. Com intuito de apoio ao policial, as medidas preveem contratação de apólice de seguro de vida, em razão do risco e da exposição à violência.

O conjunto de medidas defende ainda a aprovação do Projeto de Lei 4894/2016, do deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), que prevê a criação da Lei de Acesso à Informação na Segurança Pública, obrigando órgãos da União, Estados e Municípios a divulgar as estatísticas por eles produzidas. O objetivo, apontou o Fórum, é “de fomentar a produção e acesso a indicadores”. A proposta foi aprovada em julho na Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado, da Câmara, e agora tramita na Comissão de Constituição e Justiça, sem prazo para ser analisada.

Homicídios. A implementação de um plano nacional de redução de homicídios também foi alvo de cobrança dos especialistas. Em 2015, a meta de 5% de redução dos assassinatos chegou a ser anunciada pelo então ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, como parte de um “pacto” pelo enfrentamento ao problema. A mudança da gestão, no entanto, emperrou o projeto. 

Em julho, em meio a publicação de um relatório sobre a segurança pública no País, o Tribunal de Contas da União (TCU) deu prazo até 3 de outubro para que o Ministério da Justiça enviasse informações sobre essa iniciativa, o que ainda não ocorreu. 

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O diretor executivo da Anistia Internacional no Brasil, Atila Roque, criticou a ausência do plano nacional sobre o tema. “Estamos com diagnóstico e metas elaboradas para o antigo plano, e isso está pronto para ser adotado, mas fica parado nas mesas daqueles que têm o poder e autoridade para levar isso para frente”, disse.

Ele criticou a passividade social e dos gestores diante da situação. “Vivemos uma situação absolutamente dramática nessa área, convivemos com essa epidemia de mortes, mas ao mesmo tempo vemos uma epidemia da indiferença. Vamos dormir todas as noite como se literalmente não houvesse uma pilha de corpos sem perguntar o porquê de isso acontecer. Por que o Estado brasileiro aceitou conviver com essa grau de passividade frente a tragédias?”

A reportagem questionou o Ministério da Justiça sobre a elaboração do plano contra homicídios, mas nenhuma resposta foi apresentada até as 19h desta sexta-feira, 23.

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* O repórter viajou a convite do Fórum Brasileiro de Segurança Pública