Desafio é consolidar imagem positiva do País

Mesmo sem carisma de Lula, próximo governo terá de mostrar transparência e confiabilidade na gestão do pré-sal e na administração da macroeconomia

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Por Riordan Roett
Atualização:

Não há dúvida de que um aspecto importante do destaque conquistado recentemente pelo Brasil no cenário mundial deveu-se a três fatores. O primeiro é a personalidade do presidente Lula.

Inesperadamente, ele se revelou uma figura popular de sucesso dotada de espírito e humor no cenário internacional.

 

O segundo foi o crescimento econômico global até o final de 2008, que permitiu que o Brasil explorasse a demanda asiática por suas exportações.

 

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O terceiro foi a decisão de dar prosseguimento a várias políticas do governo do presidente Fernando Henrique Cardoso na área da gestão fiscal, e de continuar as reformas na área dos bancos e do desenvolvimento social (Bolsa-Família).

 

Nos oito anos do governo Lula, a classe C cresceu de maneira impressionante, favorecendo o surgimento de uma classe média brasileira ávida por consumir, o motor fundamental da recuperação econômica do país da crise financeira de 2008-2009 nos países industrializados. Como o presidente gosta de dizer, o Brasil foi o último grande país a entrar na crise e o primeiro a sair dela.

 

Qual será a próxima fase do desenvolvimento global para o Brasil? O novo governo não terá um líder tão carismático. Um dos pontos cruciais será a preservação do impulso criado pela crescente importância do país, que dependerá da capacidade do próximo presidente de confirmar e consolidar a atual imagem econômica do Brasil.

 

Isso significará manter políticas como a meta inflacionária, reafirmar a autonomia do Banco Central e continuar o programa de reformas - fiscal, da educação, da infraestrutura física e da flexibilidade do trabalho. São estes os elementos básicos que permitirão melhorar a produtividade e a competitividade do país.

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A gestão das descobertas de petróleo no pré-sal será importante para a projeção de uma imagem de transparência e confiabilidade. Quanto à imagem do Brasil no exterior, o próximo presidente precisará agir rapidamente afim de acelerar os preparativos para a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016.

 

O público lembra ainda que, recentemente, a Índia por pouco não conseguiu se preparar para os Jogos da Comunidade Britânica . O Brasil é capaz de cumprir suas obrigações no plano internacional, mas o tempo é escasso. Entretanto, a gestão da economia é apenas uma das responsabilidades do próximo governo.

Agora, espera-se que o Brasil mantenha sua liderança no plano internacional. Lula estabeleceu uma presença positiva nas reuniões do G-20, realizada em Washington no final do governo George W. Bush, e nas outras reuniões do Grupo, na Grã-Bretanha, nos EUA e no Canadá.

 

Preparando-se para a próxima cúpula de chefes de Estado marcada para novembro, na Coreia do Sul, os presidentes dos bancos centrais e ministros das Finanças do G-20 reuniram-se no fim de outubro na cidade sul-coreana de Gyeongju. Por algum motivo, os representantes brasileiros não estiveram presentes.

 

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Ausência notada. Talvez em razão da intensificação da campanha eleitoral ou por estarem convencidos de que muito pouco seria conseguido, mas a ausência do Brasil foi notada. A ausência das autoridades da área financeira do Brasil foi considerada estranha, porque o ministro das Finanças, Guido Mantega, havia afirmado recentemente que caiu por terra o conceito de uma moeda internacional, uma vez que os governos de todo o mundo estão preocupados em baixar as respectivas taxas cambiais e aumentar a própria competitividade.

 

A cúpula da Coreia do Sul representa a continuação de uma tendência a incluir os principais países emergentes em uma discussão política muito ampla sobre as questões mais fundamentais do globo. A reunião de Gyeongju é mais um passo na tentativa de superar as divergências referentes às prioridades das principais economias e abrandar as tensões das atuais disputas.

 

Os participantes da cúpula concordaram que deveriam desistir de enfraquecer suas moedas e permitir que o mercado exerça sua influência no estabelecimento das taxas cambiais. Além disso, decidiram conceder aos países que mais crescem a possibilidade de se manifestarem amplamente no Fundo Monetário Internacional (FMI).

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Brasil, China e Índia agora poderão exercer uma influência maior na orientação das políticas do Fundo, e participar da elaboração da futura agenda do G-20. Trata-se de uma enorme responsabilidade, e o Brasil precisará trabalhar intensamente com seus pares, demonstrando que as economias emergentes encaram com toda a seriedade e responsabilidade o exercício da liderança internacional. Durante os mandatos de Lula, o Brasil assumiu um papel de líder entre os países do Bric (Brasil, Rússia, Índia e China). Em abril deste ano, Brasília foi a sede da segunda cúpula do grupo. Espera-se que continue sendo uma voz forte nas conversações globais sobre comércio, mudanças climáticas e a nova arquitetura financeira. No próximo governo, será essencial que o perfil internacional do Brasil continue se expandindo e consolidando nos planos regional e internacional.

 

Embora o grupo Bric continue simbolizando a emergência de novos atores globais, a presença regional do Brasil deverá ser uma das principais prioridades para o Planalto também. A União das Nações Sul-Americanas (Unasul), o Conselho Sul-Americano de Defesa e outras iniciativas são o resultado da atuação do Brasil nessa área e deveriam continuar tendo o apoio do novo governo. Não há outro candidato na região capaz de despertar o respeito de que o Brasil agora desfruta entre seus vizinhos.

 

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Haverá uma escolha para o novo governo, com relação aos vizinhos. Há regimes que são democráticos e merecem apoio determinado; há regimes que preferem enfraquecer a governança democrática. O governo do Brasil deveria deixar claro que apóia aqueles que acreditam na democracia, na liberdade de expressão, em eleições livres e regulares.

 

Esse será um programa complicado para o próximo governo, mas o Brasil provou que está preparado para exercer a liderança em termos regionais e internacionais. Os últimos 16 anos demonstraram a admirável capacidade de duas administrações democráticas de estabelecer prioridades e corresponder às expectativas globais. A próxima administração precisará continuar apoiando a próxima fase de desenvolvimento do país. / TRADUÇÃO ANNA CAPOVILLA

 

*É CIENTISTA POLÍTICO AMERICANO ESPECIALIZADO EM AMÉRICA LATINA, CONDECORADO COM A ORDEM DO RIO BRANCO PELO GOVERNO BRASILEIRO EM 2001

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