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Desmate no litoral provoca discórdia

Terreno em Ubatuba é embargado pela polícia ambiental e MPE instaura inquérito civil para apurar o imbróglio

Por Adriana Carranca
Atualização:

Quem passou nos últimos feriados pela preservada Praia Dura, a 20 km do centro de Ubatuba, no litoral norte, se espantou com um clarão aberto em mata atlântica. Vista da estrada, a área, três lotes de 1.420 metros quadrados cada um, é privada. O engenheiro Pedro Tuzino, que responde pelos proprietários, diz se tratar de obras de contenção da encosta e erosão. Por isso, justifica, retirou dali 80 caminhões de terra e cortou árvores que promete replantar. Tuzino se respalda em um relatório de vistoria da Comissão Municipal de Defesa Civil (Comdec) de Ubatuba, de 19 de fevereiro, que observou no local risco de escorregamento. O Departamento Estadual de Proteção de Recursos Naturais (DEPRN), no entanto, contesta o documento, alega que a intervenção não poderia ser feita sem autorização do órgão, por ser área de preservação, diz que as obras "extrapolaram os limites" do local de risco e provocaram danos ao ambiente. O terreno foi embargado pela polícia ambiental e o Ministério Público do Estado (MPE) instaurou inquérito civil para apurar o imbróglio. Segundo o DEPRN, houve "dano ambiental, consistente em corte de morro (para abertura de via e criação de platô) e supressão ilegal de vegetação, em área equivalente a 5.400 metros quadrados, parcialmente em área de preservação permanente e tombada pelo Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico)". Tuzino contesta as acusações. "O corte no morro foi feito pelo DER para passar a estrada. O platô e o acesso ao topo já existiam e a nascente fica a mais de 60 metros. O que passa pelo terreno é um curso d?água que eu canalizei por estar assoreado. E é área de risco. Há 18 anos, um deslizamento atingiu a casa da frente", diz. Segundo ele, as árvores cortadas tinham risco de cair. "Além disso, o caráter emergencial da obra exime os proprietários de autorização do DEPRN, conforme resolução do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente)." Em reunião convocada pelo promotor de Justiça Alexandre Petry Helena, no dia 7, o Instituto Geológico (IG) confirmou a retirada de 1 mil metros cúbicos de saibro (argila, areia e pedregulhos), colocando "centenas de blocos e matacões" de rochas estão em situação "emergencialmente perigosa". Mas, afirma que os "demais aspectos de risco" não podem ser considerados de "caráter emergencial". A resolução do Conama, neste caso, não se aplicaria. "Essa noite rolou aquela pedra. Na semana passada, desceu terra. A piscina era só barro", diz o caseiro da propriedade em frente. O promotor deu 30 dias para que Tuzino remova rochas que representam risco e apresente pedido de licenciamento ambiental para as intervenções. DA 5.ª AVENIDA PARA UBATUBA Moradores aguardam apreensivos. "Como podem deixar isso assim?", esbraveja Grace Kawall, de 69 anos. Artista plástica, ela viveu 15 anos em Nova York, onde conheceu o canadense Henry Board, de 63. Há seis anos, o casal trocou o flat na 5ª Avenida pela Praia Vermelha do Sul, com único acesso pela pista parcialmente interditada. "Se isso cair de vez, ficaremos isolados." As praias Brava, Bravinha, Costa e Fortaleza estão na mesma situação. "A cada dia tem menos terra e mais pedras caídas" , diz Grace. "E ali havia uma árvore linda", aponta Henry, que trabalhou com a recuperação de casas antigas. "Não sou engenheiro, mas o que eles fizeram ali não parece correto nem seguro. Não acho que era preciso desmatar. Talvez as árvores tenham morrido de susto", ironiza. Grace faz parte da Associação de Amigos da Praia Vermelha, cujos integrantes juntos chegaram a comprar terrenos só para preservá-los. "Todo o vale é nosso agora. Me perguntam como eu pude deixar Nova York, mas o luxo do luxo é abrir a janela de manhã e dar de cara com a Serra do Mar". FRASE Pedro Tuzino Representante dos proprietários "O corte no morro foi feito pelo DER para passar a estrada. O platô e o acesso ao topo já existiam e a nascente fica a mais de 60 metros. O que passa pelo terreno é um curso d?água que eu canalizei por estar assoreado. E é área de risco. Há 18 anos, um deslizamento atingiu a casa da frente"

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