Massacre no Pará: 58 presos são mortos em Altamira após briga de facções

Governo diz que líderes do grupo criminoso Comando Classe A atacaram integrantes do Comando Vermelho; 16 foram decapitados

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Por Redação
7 min de leitura

BELÉM, BRASÍLIA E SÃO PAULO - Uma briga entre facções dentro do Centro de Recuperação Regional de Altamira (CRRALT), no sudoeste do Pará, deixou ao menos 58 detentos mortos, 16 deles decapitados, na manhã desta segunda-feira, 29. A maioria dos mortosno massacre foi vítima de asfixia. Segundo a Superintendência do Sistema Penitenciário do Pará (Susipe), dois agentes prisionais chegaram ser feitos reféns e foram liberados. No início da tarde, o motim estava encerrado.

Parentes dos detentos se aglomeram em busca de informações sobre as vítimas do massacre no Centro de Recuperação Regional de Altamira, no Pará Foto: Wilson Soares/Panamazonica/AP

A Susipe confirmou que os crimes foram resultado de um confronto entre duas facções criminosas que disputam território dentro da unidade prisional, o Comando Classe A (CCA) e o Comando Vermelho (CV).  O massacre se iniciou por volta das 7 horas, quando líderes do CCA atearam fogo em uma cela que pertence a um dos pavilhões do presídio, onde ficavam integrantes do CV.

Como a unidade é mais antiga, construída de forma adaptada a partir de um contêiner, com alvenaria, o fogo se alastrou rapidamente e alguns dos internos morreram por asfixia. Os corpos ainda não foram retirados porque a temperatura no local estava alta.

Nenhum agente penitenciário foi morto.

O Grupo Tático Operacional da Polícia Militar foi ao local. A Polícia Civil, a Promotoria e o Juizado de Altamira também estiveram na unidade participando das negociações para a liberação dos reféns. 

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"Foi um ato dirigido. Os presos chegaram a fazer dois agentes reféns, mas logo foram libertados, porque o objetivo era mostrar que se tratava de um acerto de contas entre as duas facções, e não um protesto ou rebelião dirigido ao sistema prisional", afirmou o secretário extraordinário para Assuntos Penitenciários do Estado do Pará, Jarbas Vasconcelos.

Altamira.O massacre se iniciou por volta das 7 horas, quando líderes do CCA atearam fogo em uma cela que pertence a um dos pavilhões do presídio, onde ficavam integrantes do CV Foto: Kaio Marcellus/EFE

Não foram encontradas armas de fogo no presídio, apenas estoques - facas improvisadas com material precário.

O secretário disse ainda que não havia qualquer indicativo do setor de inteligência da Susipe sobre o ataque e, por isso, uma transferência de presos não estava prevista. "Não tínhamos nenhum relatório da nossa inteligência sobre um possível ataque desta magnitude de uma facção contra a outra."

Segundo o governo do Pará, o massacre no Centro de Recuperação Regional de Altamira foi motivado por uma briga entre as facções criminosas Comando Classe A (CCA) e Comando Vermelho (CV) Foto: Bruno Santos/AFP

Vasconcelos viajou de Belém a Altamira acompanhado do titular da Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social (Segup), Ualame Machado; do comandante-geral da Polícia Militar do Pará, coronel Dilson Júnior; e do delegado-geral de Polícia Civil, Alberto Teixeira.

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A facção Comando Classe A

O Comando Classe A é uma facção criminosa que nasceu no Pará há 11 anos e domina o crime na região. O grupo está sob comando de Luziel Barbosa, conhecido como Hebraico, preso em Altamira; e Lucenildo Barbosa, o Lúcio VK, que está foragido. A facção foi criada por Oziel Barbosa, conhecido como Tchile. Em 2016, Oziel foi morto em confronto com a polícia, deixando o comando do grupo para os irmãos Luziel e Lucenildo.

Transferência de presos

O ministro da Justiça, Sérgio Moro, conversou nesta segunda com o governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), e se comprometeu a transferir para presídios federais líderes de facções criminosas responsáveis pelas mortes no CRRALT. Dez dos 16 identificados como líderes de facções deverão ir para presídios federais. 

O governo do Pará anunciou, ainda, no início da noite desta segunda, que outros 36 detentos serão remanejados para presídios do Estado. 

No início do ano, alguns chefes do Primeiro Comando da Capital (PPC), incluindo Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, foram transferidos de Rondônia para a penitenciária de Brasília.

Saiba quem foram os mortos no massacre no presídio de Altamira

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O governo do Pará divulgou na manhã desta terça-feira, 30, a identidade das vítimas no massacre:

  1. Adriano Moreira de Lima
  2. Bruno Whesley de Assis Lima
  3. Carlos Reis Araujo
  4. Deiwson Mendes Correa
  5. Deusivan da Silva Soares
  6. Efrain Mota Ferreira
  7. Eliesioda Silva Sousa
  8. Ismael Souza Veiga
  9. Jelvane de Sousa Lima
  10. João Pedro Pereira dos Santos
  11. Josivan Irineu Gomes
  12. Nathan Nael Furtado
  13. Natanael Silva do Nascimento
  14. Rivaldo Lobo dos Santos
  15. Evair Oliveira Brito
  16. Gilmar Pereira de Sousa
  17. Admilson Bezerra dos Santos
  18. Ailton Saraiva Paixão
  19. Alan Kart G. Rodrigues
  20. Alan Patrick dos Santos Pereira
  21. Alessandro Silva Lima
  22. Amilton Oliveira Camera
  23. Anderson dos Santos Oliveira
  24. Anderson Nascimento Sousa
  25. André Carlos Sousa Patrício
  26. Bruno Rogério Andrade
  27. Cleomar Silva Henrique
  28. Clevacio Soares Queiroz
  29. Diego Aguiar Figueiredo
  30. Diego Walison Sousa Reis
  31. Diogo Xavier da Silva
  32. Domingos Fernandes Castro da Silva
  33. Douglas Gonçalves Viana
  34. Edson Costa de Macedo
  35. Delimarques Teixeira Pontes
  36. Francisco Claudizio da Silva Ferreira
  37. Geidson da Silva Monteiro
  38. Hugo Vinicius Carvalho
  39. Itamar Anselmo Pinheiro
  40. Jeová Assunção da Silva
  41. João Nilson Felicidade Farias
  42. José Brandão Barbosa Filho
  43. José Francisco Gomes Filho
  44. Josivan Jesus Lima
  45. Josicley Barth Portugal
  46. Josué Ferreira da Silva
  47. Junior da Silva Santos
  48. Kawe Reis Barbosa
  49. Leonardo Dias Oliveira
  50. Luilson da Silva Sena
  51. Marcos Saboia de Lima
  52. Renan da Silva Souza
  53. Rogerio Pereira de Souza
  54. Sandro Alves Gonçalves
  55. Valdecio Santos Viana
  56. Vanildo de Souza Guedes
  57. Wesley Marques Bezerra

Arma encontrada dentro de TV no sábado

Arma e munições são encontradas dentro de TV no CRRALT Foto: divulgação Susipe

No sábado, 27, durante os procedimentos de revista para entrada de visitantes, agentes prisionais identificaram uma arma e munição dentro de uma televisão. 

Segundo informações da direção da unidade, antes de entrar no bloco carcerário, a televisão passou por revista manual e por um raio X, que detectou a existência da arma e de munições.

O objeto foi trazido por Shirley Pedrada dos Santos, companheira do detento Ezequias Santana da Conceição. A mulher foi presa em flagrante, teve a carteira de visita suspensa e foi conduzida à delegacia de Altamira. Já Conceição vai responder a um procedimento disciplinar penitenciário (PDP).

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Superlotação e falta de agentes penitenciários na unidade de Altamira

O CRRALT tem as condições do estabelecimento penal classificadas como "péssimas", segundo relatório do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) publicado nesta segunda, dia do massacre. Entre os problemas, a unidade convive com superlotação e número baixo de agentes penitenciários para garantir a segurança do local.

Segundo relatório do CNJ, a unidade abriga 343 presos do sexo masculino, mais do que o dobro da capacidade, de 163 vagas. Já os agentes penitenciários, no entanto, somam 33. "O quantitativo de agentes no CRRALT é reduzido frente ao número de internos custodiados o qual já está em vias de ultrapassar o dobro da capacidade projetada", diz o CNJ.

Entre os presos, 308 cumprem pena em regime fechado e outros 35 estão no semiaberto. O Centro de Altamira, no entanto, não tem área separada para abrigá-los. Por causa da situação no presídio, alguns detentos chegam a receber autorização para dormir em casa.

Número de detentos no Pará é quase o dobro do número de vagas

Divulgado em junho de 2017, o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen) aponta que o sistema brasileiro enfrenta superlotação em todas as unidades federativas. Ao todo, a população prisional é de 726.354 pessoas para 423.242 vagas.

No caso do Pará, a população prisional é de 16.123 pessoas, quase o dobro do número de vagas (8.600), o que significa uma taxa de ocupação de 1,92 por vaga (a 11ª mais alta entre as 27 unidades federativas). A média nacional da taxa de ocupação é de 1,72.

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O Infopen também aponta que o País teve 4,8 mortes por "causas criminais" a cada 10 mil pessoas privadas de liberdade no primeiro semestre de 2017. No Pará, a média foi de 21,8 para o mesmo período, a quinta maisalta entre as unidades federativas.

O governo nega superlotação no local. De acordo com o Estado, é prevista para dezembro a entrega de um novo presídio pela Norte Energia, responsável pela Usina Hidrelétrica de Belo Monte. Também é prevista a nomeação de 485 novos agentes prisionais em agosto. 

Rebelião deixou sete mortos em 2018

Em setembro de 2018, sete detentos morreram e outros três ficaram feridos em uma rebelião no CRRALT. Durante o motim, um grupo de 16 presos tentou fugir da unidade, sem sucesso. 

Segundo a Susipe, detentos da cela 3, do bloco A, tentaram fugir do presídio pela janela de ventilação do local. Os agentes prisionais de plantão flagraram a movimentação pelas câmeras de segurança e acionaram a Polícia Militar, que impediu a saída.

Os presos, então, correram em direção ao bloco do semiaberto e atearam fogo na sala do gerador de energia e no galpão de alojamento. No motim, parte das celas e das grades da unidade, além da enfermaria e da secretaria, foram depredadas. Ao todo, 120 presos participaram do motim./ ANA PAULA NIEDERAUER, FELIPE CORDEIRO, FELIPE RESK, MARIANA HAUBERT, PATRIK CAMPOREZ, PRISCILA MENGUE E RITA SOARES, ESPECIAL PARA O ESTADO

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