Dono de barco que naufragou no Pará será indiciado

Embarcação fazia trajeto duas vezes mais longo do que o autorizado pela Marinha e levava, ainda, um automóvel; naufrágio causou a morte de ao menos 23 pessoas

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Por Carlos Mendes
Atualização:
A embarcação Capitão Ribeirão afundou na noite deterça Foto: AFP PHOTO / Ulisses Goncalves de Sousa

BELÉM - Após informar erroneamente o destino da embarcação e dizer que transportava apenas dois passageiros, Alcimar Almeida da Silva, o proprietário do barco Capitão Ribeiro, que afundou no Rio Xingu, será indiciado pela polícia do Pará. “O proprietário incorreu no crime de ter colocado em risco a vida das pessoas”, afirmou o delegado Élcio de Deus, de Porto de Moz, município onde morava a maioria das vítimas. A embarcação naufragou com 52 pessoas na terça; 23 morreram e as buscas foram encerradas.

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Uma das principais possibilidades de indiciamento é pelo artigo 261 do Código Penal, que prevê pena de 4 a 12 anos de prisão para quem expuser “a perigo embarcação ou aeronave, própria ou alheia”, de forma a resultar em “naufrágio, submersão ou encalhe”. Esse enquadramento foi o adotado, por exemplo, para os pilotos do Legacy que bateram em um Boeing da Gol em 2006, na tragédia que resultou em 154 mortes. 

O “risco” assumido pelo dono da embarcação vai desde a regulamentação de viagem, passando pelo trajeto até as informações prestadas à Marinha. Um dia após o acidente, a Agência Estadual de Regulação e Controle de Serviços Públicos (Arcon-PA) revelou que o barco de Silva já havia sido autuado em junho por não ter autorização para transportar passageiros. Mesmo assim, continuava a fazer normalmente viagens uma vez por semana.

Silva disse em seu depoimento à polícia que há cerca de três anos trafegava com autorização da Marinha até o município de Prainha, uma distância de 170 quilômetros. Ocorre que, no dia em que o barco afundou, a rota era outra, para Vitória do Xingu, um percurso de 380 quilômetros, sem aval oficial.

Segundo a Marinha, sempre que uma embarcação se desloca deve ser feito um “despacho de saída”, informando o percurso. No caso da Capitão Ribeiro, há despacho apenas com prazo até 20 de outubro deste ano para o trajeto Santarém-Prainha. Além disso, antes da viagem que resultou no naufrágio, Silva mentiu para a Capitania dos Portos ao declarar que transportava apenas dois passageiros – e não os 52.

Na manhã desta sexta, após o içamento do barco naufragado do fundo do Rio Xingu, os bombeiros ficaram surpresos ao encontrar um automóvel dentro da embarcação, exclusiva para passageiros. “Ele pesa toneladas e o centro de gravidade do barco sobe, sujeitando-o a ficar com menor estabilidade. Há risco de emborcamento”, afirma o engenheiro naval Hito Moraes.

Causas. Ainda continuam as investigações sobre as causas do acidente. Para especialistas em meteorologia, é duvidoso que uma forte tromba d’água, assemelhada a um tornado, tenha feito a embarcação virar, como apontaram inicialmente as testemunhas. À Rede Liberal, o coordenador do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), José Raimundo Abreu de Sousa, destacou a importância de se observar a dinâmica dos ventos no momento da tragédia. “Ventos girando em torno de 60 km por hora seriam uma possibilidade.” Imagens por satélite feitas pelo Sistema de Proteção da Amazônia apontam para forte temporal na hora do acidente, com vendavais passíveis até de destelhar casas. 

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Mortos e sobreviventes. Na manhã desta sexta, os corpos de duas crianças foram localizados. De acordo com o governo do Estado do Pará, as vítimas são uma menina, com idade entre 8 e 10 anos, e um menino, com idade aproximada entre 1 e 3 anos. As crianças estavam no porão do barco e foram localizadas durante a retirada de mercadorias estocadas na área. Os corpos seguiram para o município de Porto de Moz, onde está concentrada a estrutura de perícia médica. Com isso, o número de mortos chegou a 23. As buscas também foram oficialmente encerradas, após a localização de mais dois sobreviventes – foram 29 no total. 

Entre eles está Israel da Silva Souza, que passou por Vitória do Xingu, onde recebeu atendimento, e seguiu para Altamira. Todos os sobreviventes devem receber apoio psicológico do governo do Estado do Pará, considerando as possibilidades de traumas e depressão.

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