Elogios para a polícia e críticas a museus

Filho de Portinari diz que desfecho do caso não elimina ?vergonha?

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Por Bruno Paes Manso e Rodrigo Brancatelli
Atualização:

João Cândido Portinari fala correndo, às vezes atropelando as palavras. "Acabei de ficar sabendo da notícia, a minha esposa me ligou do shopping center para contar que encontraram os quadros do Masp", diz o diretor-geral do Projeto Portinari, responsável pela preservação da obra e da memória do pintor. "Graças a Deus, que alegria, que alegria." O filho de Cândido Portinari, cuja obra O Lavrador de Café foi furtada do Masp no dia 20, é taxativo ao pedir mudanças nos museus brasileiros. "O que aconteceu foi uma vergonha", conta. "Estava profundamente triste. No começo, até achava que iam pedir resgate e devolver o quadro. Mas depois, quando o tempo começou a passar, perdi as esperanças. A sensação que eu tive foi de quase um luto. Era um 11 de setembro, tinham atingido um grande símbolo da nação, que é o Masp. Não tinham roubado o nosso bolso, mas sim um pedaço da nossa memória, da nossa história, da nossa alma. Apesar da alegria desta noite, isso não pode cair no esquecimento. O roubo do patrimônio histórico está acontecendo por todo o País, o governo precisa zelar pela nossa memória." O diretor do Departamento de Museus do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), José do Nascimento Júnior, também espera que a recuperação dos quadros sirva de exemplo. Segundo ele, o trabalho da polícia paulistana deveria ser exaltado. "Essa notícia vai melhorar a imagem do País", diz ele, que recentemente enviou carta a todos os governadores, pedindo que criassem uma delegacia especializada na repressão de crimes contra o patrimônio e os bens culturais. "A polícia de São Paulo é exemplar nesse quesito. Encontrou obras roubadas da Biblioteca Mário de Andrade, do Museu do Ipiranga e agora do Masp. Eu me sinto de alma lavada, é uma grande emoção." Igualmente emocionado, o ex-curador do Masp, Luiz Marques, líder do movimento SOS Masp, que defende a mudança no comando do museu, preferiu só comemorar. "Isso é magnífico. Os quadros pareciam estar perdidos para sempre", diz. O arquiteto Marcelo Ferraz, ex-diretor-executivo do Instituto Lina Bo Bardi e P. M. Bardi, ressalta que a recuperação das obras não pode esfriar as discussões a respeito das mudanças da diretoria e do conselho do Masp. "Não podemos perder esse olhar que foi voltado ao museu. Está na hora de a diretoria do Masp passar o bastão." O curador da Bienal Internacional de São Paulo, Ivo Mesquita, reforça a idéia de que a opinião pública não deve perder os problemas do museu de vista. Para o bibliófilo e colecionador Pedro Corrêa do Lago, apesar do trabalho da polícia, era "evidente que o roubo havia sido feito por amadores". Ele diz que a suposição de que quadrilhas organizadas haviam praticado o crime é irreal. "Não existem colecionadores loucos que encomendam um quadro de um pintor como Picasso para ver escondido em uma salinha. Obras como essa ou valem R$ 100 milhões ou não valem nada." Corrêa do Lago afirma que a escolha de um Portinari mostrou mais desconhecimento dos ladrões. "Não há mercado lá fora para Portinari." Segundo afirmou, o destino de ladrões que roubam obras famosas é sentar-se em cima da obra ou acabar preso. "Eles ouvem dizer que valem milhões. Depois que roubam, descobrem que é impossível vender. O maior risco era que eles destruíssem as obras para não ser presos."

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