Em Barão de Cocais, MG, a primeira casa no caminho da lama caso a barragem da Vale se rompa

A propriedade do operário Ademir Pereira de Jesus, que vive com sua família, fica às margens do Rio São João, caminho natural da lama na hipótese da represa se romper

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Por Leonardo Agusto
Atualização:
A família do operário Ademir Pereira de Jesus, de 53 anos, moradora do bairro Três Moinhos, em Barão de Cocais, com amulher, o filho e a filha Foto: Leonardo Augusto

Barão de Cocais. A família do operário do setor de montagem industrial Ademir Pereira de Jesus, de 53 anos, moradora do bairro Três Moinhos, em Barão de Cocais (MG), voltou a se reunir na última quarta-feira, 29. Ademir tinha emprego no Rio Grande do Sul. Pediu contas e retornou para a mulher, o filho e a filha. O operário estava preocupado e cheio de razão para isso. Sua casa será a primeira da cidade a ser atingida pela lama de rejeitos de minério de ferro da Vale caso a barragem Sul Superior, da empresa no município, se rompa.

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A propriedade da família fica às margens do Rio São João, caminho natural da lama na hipótese da represa se romper. Está a 50 metros da barreira montada pela Defesa Civil de Minas para proibir o acesso à estrada que dá aos distritos de Cocais, como Socorro e Piteiras, já evacuados. 

Praticamente ao lado do muro da casa de Ademir, lê-se em placa "Posto de bloqueio da Defesa Civil. Não ultrapasse". No local há ainda uma guarita com seguranças e dois veículos com equipamento de som que serão usados para emitir o aviso para que a população saia de casa se a barragem ruir.

A previsão da Defesa Civil é que, rompida a represa, a lama atingirá a cidade, e, portanto, a casa da família de Ademir. O percurso da lama até o local deve ser de 1h12min. "Fiquei agoniado com isso. Com a família aqui sozinha", disse o operário, que não pensa em deixar a casa. "Se tivesse outra aqui, até que poderia ser", ponderou. Apesar de o medo em Barão de Cocais perdurar desde 8 de fevereiro, quando ocorreu a evacuação de moradores dos distritos de Barão de Cocais, Ademir só decidiu voltar para cada depois do anúncio pelas autoridades de que o talude da mina de Gongo Soco, de onde era retirado o minério cujo rejeito ia para a barragem da Vale no município, começou a desmoronar.

O principal impacto disso seria o rompimento da barragem, provocado por um possível abalo sísmico, que seria gerado caso volume maior do talude caia. Na sexta-feira, 31, por volta das 5h, monitoramento apontou desmoronamento maior do o que vinha ocorrendo. Não houve, segundo a Vale, impacto na barragem, estrutura que já passa por problemas de estabilidade. Em 22 de março, a represa foi colocada em nível 3 de segurança, que alerta para a possibilidade de ruptura a qualquer momento.

Ademir de Jesus acredita que não terá problemas em salvar sua vida e a de sua família caso a lama desça. Ele confia no alarme a ser dado pelos veículos de apoio será suficiente. Conforme orientação das autoridades, os moradores de Barão de Cocais precisam sair imediatamente de suas casas ao ouvirem o sinal e devem se dirigir a um dos pontos de segurança da cidade. 

No caso da residência dele, o ponto mais próximo fica distante seis minutos de caminhada. "Pego minha moto e saio", avisou o filho do operário, Davi Pereira de Jesus, de 19 anos. A orientação da Defesa Civil, no entanto, é que os moradores saiam a pé de casa. O objetivo é evitar congestionamento, o que colocaria em risco ainda maior a vida das pessoas.

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A família mora ali há 12 anos. A residência tem quatro quartos, três banheiros e um enorme quintal com pés de manga, abacate, banana e mamão. Um regato corta a propriedade e deságua no São João. "Investi todas as minhas economias aqui", lamentou o operário, que agora procura emprego na cidade. A mulher dele, Lucilene Rodrigues, de 48 anos, afirma ter condições de suportar o momento. "A religião ajuda", justificou a dona de casa, que é evangélica. 

Bombeiros de prontidão em ponto estratégico, em casode rompimento da barragem de Gongo Soco Foto: JF DIORIO / ESTADÃO

De partida

Mas em Barão de Cocais há quem fica e há quem vai. A dona de casa Emilaine da Cruz, de 39 anos, também morava próximo ao São João, numa área mais próxima ao centro da cidade. Ela dividia o lar com dois filhos, um de quatro anos e outro de apenas um, e se mudou neste sábado, 1, para uma casa que considera mais segura. "É uma área de risco, mas, com crianças, as coisas ficam mais difíceis. E se tivermos que sair à noite, por exemplo?", questionou. 

Emilaine afirma que já queria ter deixado a casa em que vivia. "Mas não achava outro lugar para morar", logo respondeu. "Vamos ver se mais pra frente teremos uma tranquilidade maior". O que Emilaine espera para o futuro, hoje, é algo raro em de Cocais. As conversas nas ruas, praças e comércio invariavelmente recaem na possibilidade de ruptura da barragem.

A movimentação de veículos da Vale e autoridades também sinaliza o tempo todo para um possível desastre provocado pela lama na cidade. Neste sábado, 1º, um efetivo de 31 bombeiros e 11 viaturas foi colocado no município para acompanhamento de obras que a Vale faz para tentar conter a lama, caso a barragem se rompa.

Na expectativa do rompimento da tragédia, vivem o casal Ademir e Lucilene Pereira, além dos filhos Lívia e Davi e a cadela Xispita. 

Áreas de risco na cidade de Barão de Cocais tiveram as guias pintadas de laranja , no caso rompimendo da barragem de Gongo Soco Foto: JF DIORIO / ESTADÃO
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