Em guerra com facção local, PCC já tem 400 membros em presídios paraguaios

No Paraguai desde 2010, o PCC ganhou força nos últimos três anos, após a morte de um líder do tráfico local

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Por José Maria Tomazela
Atualização:

Autoridades paraguaias já estimam haver cerca de 400 membros da facção Primeiro Comando da Capital (PCC) em presídios do país vizinho. Segundo ele, 90% das cadeias têm detentos ligados ao grupo criminoso. No Paraguai desde 2010, o PCC ganhou força nos últimos três anos, após a morte de um líder do tráfico local. No domingo, 16, rebelião liderada pela facção na penitenciária da cidade de San Pedro del Ycuamandyyu terminou com 10 mortos. 

O PCC começou a se infiltrar no Paraguai em 2010, quando um de seus líderes, Elton Leonel da Silva, o Galã, foi à região na tentativa de eliminar intermediários para trazer drogas daquele país. Logo Galã percebeu que o tráfico local era controlado por Jorge Toumani Rafaat, o "rei da fronteira" e, com o apoio da facção carioca Comando Vermelho (CV), montou um plano para matar o rival. Rafaat foi executado numa ação cinematográfica, em Pedro Juan Caballero, em junho de 2016. Rapidamente, o PCC começou a ocupar os espaços deixados, entrando em conflito com os interesses do CV.

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A guerra entre as duas facções já produziu mais de uma centena de mortes na região de fronteira. Além da disputa das rotas de tráfico, os grupos passaram a arregimentar mão-de-obra nas prisões. Para manter seu poder sobre os seguidores, os criminosos cooptam agentes e dirigentes do sistema prisional. 

Em resposta à ofensiva das facções, o governo paraguaio passou a expulsar os bandidos. Em 2018, foram extraditados 97 presos brasileiros, 60% mais que no ano anterior. Entre os expulsos, estão líderes do PCC, como Thiago Ximenes, o 'Matrix', entregue à polícia brasileira em março, e Jarvis Chimenez Pavão, vinculado ao CV, extraditado em novembro. 

Rebelião com 10 mortos e 12 feridos

A suspeita das autoridades paraguaias é de que a rebelião desta semana no presídio San Pedro del Ycuamandyyu foi por uma briga entre o PCC e a facção local, conhecida como Clã Rotela, pelo comando da cadeia. Além dos dez mortos, que foram decapitados, queimados ou baleados, houve 12 feridos

"O que sabíamos é que essa gente do clã Rotela trabalhava antes com o PCC. Não tivemos a informação de que esse tipo de confronto pudesse acontecer", disse o ministro da Justiça, Julio Javier Ríos. Segundo as investigações preliminares, o massacre está relacionado ao assassinato de dois detentos na sexta, 14, no presídio de Tacumbú, em Assunção. 

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A suspeita das autoridades paraguaias é de que a rebelião desta semana no presídio San Pedro del Ycuamandyyu foi por uma briga entre o PCC e a facção local, conhecida como Clã Rotela Foto: Omar Acosta / ABC COLOR

Na ocasião, membros do PCC executaram dois presos e deixaram outro ferido, durante 'batismo de sangue' da facção para admitir novos integrantes. As vítimas seriam do clã Rotela. Dois presos envolvidos nessas mortes foram transferidos para San Pedro e, ao encontrarem o grupo criminoso rival, houve confronto.

O governo anunciou nesta segunda a destituição do diretor do presídio de San Pedro, Wilfrido Quintana, e do diretor de Estabelecimentos Penitenciários do Paraguai, Blaz Martínez. Segundo ele, as primeiras apurações indicam que as recentes matanças em unidades prisionais do país podem ter acontecido devido à negligência ou cumplicidade dos agentes penitenciários, com a omissão dos dirigentes.

O ministro Ríos afirmou que os membros do PCC envolvidos nos assassinatos podem ser expulsos do país. Ele admitiu, porém, que alguns membros da facção já têm documentos paraguaios, o que dificulta a extradição. “Há muitos criminosos poderosos dentro do sistema, não só do clã Rotela, como também do PCC, do Comando Vermelho e de outros paraguaios que atuam em negócios sujos."

Quem é o clã Rotela, uma família de traficantes no Paraguai

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O traficante paraguaio Armando Javier Rotela Ayala é líder do Clã Rotela, rival do PCC na disputa pelo tráfico de drogas. Embora conhecido como o "czar do tráfico", ele é considerado peixe pequeno quando comparado às facções brasileiras. Conforme estimativas da Secretaria Nacional Antidrogas, o clã Rotela tem cerca de 100 membros distribuídos entre os principais presídios do país. Na maioria, são viciados que protegem seu líder em troca de porções de cocaína e crack. No domingo, ele teve de ser transferido ao quartel do Grupamento Especializado da Polícia Nacional em Assunção, logo após o massacre de integrantes do seu grupo pelo PCC. 

Rotela está em guerra com o PCC porque a facção também quer controlar o negócio de drogas dentro das prisões. O traficante foi capturado e preso em 2011, mas escapou da prisão de Misiones no ano seguinte, segundo recapturado em 2016. A maioria dos seus colaboradores está condenada por tráfico ou roubo. 

Os que estão livres são pequenos traficantes incumbidos de fazer a droga chegar ao interior dos presídios. A própria filha de Rotela foi surpreendida, em 2011, quando entrava com pedras de crack na mochila, escondida entre cadernos escolares, em visita ao pai. Um primo do “czar”, Óscar Rotela, que estava na unidade penal de Emboscada, também foi transferido para Assunção, por ter entrado na mira do PCC.

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Um esquadrão da morte na fronteira?

A guerra de facções espalha mortes também fora dos presídios. Só neste mês, ao menos 16 pessoas foram executadas na região de Pedro Juan Caballero, fronteira com Ponta Porã (MS). Nesse domingo, 16, os corpos de dois jovens de 24 e 25 anos foram achados crivados de balas na cidade paraguaia de Bella Vista. Os dois tinham passagens por roubo e porte ilegal de arma. Em Ponta Porã, uma mulher grávida foi achada morta com sinais de execução.

No dia 13, um empresário brasileiro e a namorada dele, paraguaia, foram mortos a tiros. No mesmo dia, dois homens com passagens por roubo e homicídio foram executados com disparos de pistola. No dia 11, um médico paraguaio de 50 anos que morava no lado brasileiro foi alvejado e morto quando saía do plantão, em Pedro Juan.

Além da disputa por droga, a polícia investiga também um suposto grupo de extermínio - espécie de esquadrão da morte que se autodenomina 'justiceiros da fronteira' agindo na região. No dia 5, três homens foram sequestrados e dois deles, mortos. Os autores dos crimes deixaram um bilhete manchado de sangue no qual diziam que as vítimas eram 'ladrões de motos'.

Mortes deixam Mato Grosso do Sul em alerta

Secretário de Justiça e Segurança Pública de Mato Grosso do Sul, Antônio Carlos Videira disse que as rebeliões com mortes e feridos nas prisões paraguaias colocam em alerta as cidades do lado brasileiro. "Estamos, por meio da inteligência, monitorando ininterruptamente a fronteira." No último dia 3, o ministro da Justiça Sergio Moro esteve em Pedro Juan Caballero para discutir acordos entre os dois países visando a combater o crime organizado. Os dois países desenvolvem em conjunto a operação Nova Aliança, contra o tráfico. Moro cedeu dois helicópteros da Polícia Federal para auxiliar a polícia paraguaia na identificação das plantações de maconha.

Nesta segunda-feira, 17, autoridades paraguaias anunciaram a apreensão de 82 toneladas e a destruição de 413 quilos de maconha no departamento de Amambay, na fronteira com o Brasil. Os cultivos foram localizados com o uso dos helicópteros brasileiros e de aeronaves da Força Aérea Paraguaia, com apoio da Marinha Nacional. Pelo twitter, o ministro Moro comemorou os resultados da operação. "Essa foi a segunda operação desta natureza este ano. A intenção do MJSP é intensificar a cooperação internacional no combate do narcotráfico", escreveu.

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