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Em missa, pai não perdoa PMs por matar João

Família pensa em deixar Rio; mãe, que estava no carro alvejado, não pode ouvir nem barulho de porta batendo

Por Fabiana Cimieri
Atualização:

Cerca de 300 pessoas participaram ontem da missa de 7.º dia pela morte do menino João Roberto Amorim Soares, de 3 anos e 11 meses, morto após o carro em que estava com a mãe ter sido alvejado por 17 disparos de policiais militares. Nenhuma autoridade do governo estadual compareceu. No fim da cerimônia, a avó Cirene Amorim, hipertensa, passou mal e desmaiou. A mãe, Alessandra, amparada por parentes e amigos, teve de ser levada para a sacristia. O pai do menino, o taxista Paulo Roberto Soares, disse que a família cogita passar um tempo fora do Rio. Segundo ele, sua mulher está traumatizada. "Ela não pode ouvir um barulho, como uma porta batendo, porque fica apavorada." Ele conta que o momento mais doloroso foi quando voltou para casa para pegar alguns objetos e entrou no quarto do filho. "Eu me emocionei muito." Questionado se seria capaz de perdoar os policiais militares, Paulo respondeu: "Eu não tenho essa grandiosidade, eu não consigo". Durante a cerimônia, celebrada na Catedral Metropolitana, no centro do Rio, o padre Haroldo disse aos pais de João Roberto que "não deixem a vingança tomar conta do coração". "Lutem pela conversão dos seus algozes, mas não deixem de lutar por justiça", declarou. Na homilia, ele perguntou a Alessandra, que dirigia o carro atingido pelas balas disparadas pelos PMs, se João Roberto teve tempo de falar alguma coisa após ter sido baleado. Chorando, a mãe respondeu: "Não. Não teve." Parentes de outras vítimas da violência compareceram à missa para prestar solidariedade aos pais do menino. Daniela Duque, mãe do estudante Daniel, que também morreu baleado por um policial militar em uma briga entre freqüentadores de uma boate de Ipanema, na zona sul, há menos de um mês, era uma das mais emocionadas. "A gente veio porque a dor deles é igual à nossa. E a gente pode dividi-la um pouco, porque só Deus mesmo para fazer a gente levantar todos os dias." Na quinta-feira, ao receber o laudo do Instituto de Criminalística Carlos Éboli (ICCE) sobre a Palio Weekend de Alessandra, mãe do menino, o delegado Walter de Oliveira, da delegacia da Tijuca (19° DP), disse estar convicto de que os disparos no carro não resultaram de tiroteio com bandidos que teriam roubado um Fiat Stilo, como argumentaram os policiais que atiraram. Segundo Oliveira, o laudo aponta que foram disparados 17 tiros contra o veículo e confirma o que câmeras de segurança de prédios vizinhos ao local flagraram. "O Stilo passa em alta velocidade. Três veículos seguem atrás e só então o carro das vítimas encosta. Não houve troca de tiros", afirmou.

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