Empresas ''irmãs'' ganham contratos na Prefeitura de SP

Vanguarda e Nacional, firmas de segurança, mantêm estreita relação comercial, o que pode ferir legislação

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Por e Rodrigo Brancatelli
Atualização:

Duas empresas "irmãs", ambas do ramo de vigilância e segurança patrimonial, concorreram juntas e venceram diversas licitações abertas nos últimos anos pela Prefeitura de São Paulo. As proprietárias da Vanguarda Segurança e Vigilância Ltda - Dilma Gonçalves Pacheco e Oliveira e Odiva Oliveira Sene - são irmãs de Maria Helena Gonçalves Pacheco e Oliveira, uma das sócias da Empresa Nacional de Segurança Ltda. O fato de donos de grupos distintos, que disputam um mesmo contrato, serem parentes não é ilegal. Mas outros quatro indícios reunidos pelo Estado sugerem que, além do aspecto familiar, as duas empresas manteriam também estreita relação comercial - o que configura fraude e fere a Lei de Defesa da Concorrência (nº 8.884/94). A principal evidência da ligação entre elas surgiu no último dia 24, quando a reportagem telefonou para a Vanguarda e pediu para falar com o dono da empresa, sem mencionar o nome. Sem hesitar, a telefonista transferiu a chamada para a secretária de José Adir Loiola, sócio da Empresa Nacional, ao lado de Maria Helena e de Carlos Eduardo Brunello. Naquele instante, porém, Loiola concedia uma entrevista por celular a outro repórter do Estado, como presidente da Nacional. O breve diálogo entre ele e a secretária foi gravado. Apesar do "flagrante", Loiola negou qualquer vínculo comercial com a Vanguarda. "Ah, mas eu posso ter um ramal, tudo bem. Eu não gerencio, eu não opero a Vanguarda. Você não vai encontrar a minha gestão na Vanguarda. Deve ter havido algum equívoco. Sou sócio da Nacional e as irmãs da minha sócia são, sim, donas da Vanguarda. Mas não há nenhum impedimento nisso, já consultei advogados." No dia seguinte, o oposto ocorreu. A reportagem telefonou para a Empresa Nacional perguntando por Maria Helena. A secretária repassou o telefone da Vanguarda, "onde ela fica", segundo as palavras da atendente. As empresas também mantinham proximidade física. De acordo com a ficha cadastral delas na Junta Comercial de São Paulo, ambas instalaram suas matrizes em prédios vizinhos, no centro de São Caetano do Sul. A Vanguarda funcionou no número 129 da Rua Santo Antônio até 22 de janeiro do ano passado. A Empresa Nacional continua no local. Questionado sobre quais empresas ocupavam os imóveis, um vizinho afirmou se tratar de "uma coisa só". "Funciona tudo junto, quem entra num prédio entra no outro. Imagino até que tenha alguma ligação lá por dentro", disse. Além disso, chama atenção o endereço declarado por Maria Helena no cadastro da Empresa Nacional - ela diz morar na Rua Conselheiro Carrão, 192, 5º andar. Entretanto, o prédio localizado na Bela Vista, região central da capital, é atualmente a nova sede da Vanguarda. INVESTIGAÇÃO A Secretaria de Direito Econômico (SDE), braço do Ministério da Justiça responsável pela defesa da concorrência, investiga desde o ano passado a atuação do Sindicato das Empresas de Segurança Privada, Segurança Eletrônica, Serviços de Escolta e Cursos de Formação do Estado de São Paulo (Sesvesp), do qual Loiola é presidente. O procedimento foi instaurado depois de uma denúncia do próprio sindicato contra sete empresas que estariam praticando "preços predatórios". A análise dos técnicos federais revelou que a Sesvesp tentava impor "conduta comercial uniforme" ao setor. Para a SDE, "há fortes indícios de que as práticas do Sesvesp possuem efeitos anticoncorrenciais significativos, os quais não encontram justificativa econômica plausível e, portanto, são passíveis de punição". A Empresa Nacional e a Vanguarda fazem parte de um rol de 12 grupos que detêm os maiores contratos de vigilância e segurança patrimonial com a Prefeitura. Só neste ano, conforme o site De Olho nas Contas, do Executivo municipal, a Empresa Nacional recebeu R$ 15,8 milhões por serviços prestados às secretarias da Saúde, Cultura, Educação, Esportes, Infraestrutura Urbana e Trabalho, além das subprefeituras da Capela do Socorro, Santo Amaro e São Mateus. À Vanguarda, cujos clientes são as secretarias da Saúde, Educação e Esportes e as subprefeituras do Campo Limpo e da Casa Verde/Cachoeirinha, foram pagos R$ 6,3 milhões. CONCORRÊNCIA O Estado levantou quase uma dezena de pregões, nos últimos três anos, em que as duas empresas concorreram juntas por contratos de órgãos públicos. Também já houve casos em que apenas elas disputavam os pregões - como na contratação de segurança patrimonial desarmada na Ceasa de São José do Rio Preto, em 2006. Na ocasião, as propostas tinham valores muito próximos - a diferença entre o preço da Vanguarda (R$ 125.160) e o da Empresa Nacional (R$ 125.880) foi de apenas R$ 720. Embora tenha ofertado o menor lance do pregão (R$ 119.900), a Vanguarda acabou sendo desclassificada, pois seu preço ainda permanecia acima do praticado no mercado (o valor de referência era de R$ 103.161,60).

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