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Encontro de maracatus revigora tradição religiosa de Olinda

Nações realizam batuques em Olinda e, no candomblé, evocam antepassados por proteção

Por Angela Lacerda
Atualização:

Com o carnaval nas ruas desde sexta-feira, quando a festa no Fortim do Queijo abriu oficialmente em Olinda a folia pernambucana, a cidade histórica assistiu à quinta edição da Noite Para os Tambores Silenciosos, anteontem. De caráter religioso, os maracatus de baque virado - ou maracatus nação - reverenciaram seus antepassados e pediram proteção e paz. Com orquestras de instrumentos de percussão, os maracatus evocaram a coroação dos reis do Congo - tradição desde a primeira metade do século 19.     Veja também:  Cobertura completa do carnaval 2009     Blog: dicas para quem quer curtir e para quem quer fugir da folia Especial: mapa das escolas e os sambas do Rio e de SP   Dez nações de maracatu participaram do encontro. Na Ladeira dos Quatro Cantos, os grupos se apresentaram e, em seguida, partiram em cortejo até a Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, no Bonsucesso, onde, às 23h30, entoaram loas em iorubá - língua africana utilizada no candomblé - e fizeram rufar cerca de 400 tambores. Houve queima de fogos. À meia-noite, o evento foi encerrado. "Meia-noite é hora sagrada, não nos é mais permitido continuar a celebração", disse a historiadora e membro da coordenação do encontro Aneide Santana. "É a mística da religião."   O mestre Jaílson Viana Chacon, da Nação Porto Rico do Recife, fundada em 1916, definiu o maracatu de baque virado como "um candomblé de rua". De acordo com ele, seus integrantes assumem obrigações com os orixás. "Muita gente vê como um brinquedo, uma manifestação popular, mas o maracatu é mais que isso."   Presidente e rainha dessa nação, Elda Ivo Viana, de 68 anos, afirmou orgulhosa ter sido coroada em 1979, em uma cerimônia na Igreja do Rosário dos Pretos, no Recife, por um cônego católico. Ao seu lado, numa demonstração de vigor da tradição, estava a jovem rainha da Estrela Brilhante de Igarassu, do município da zona da mata, Rafaela Santana Batista, de 18 anos. O grupo é um dos mais antigos em atuação.   Neta da mestra da sua nação, dona Olga, Rafaela encara com seriedade o seu papel. "É uma cultura viva." O rei da Estrela Brilhante, José Paulo Gomes Araújo, de 25 anos, destacou que esse é um dos maracatus que mantêm a tradição original: mulher não toca na bateria, homem não dança, as armadas saias da rainha e da princesa não levam armação de ferro.   Como os outros maracatus, eles, no entanto, estão abertos a quem se interessa pela manifestação. Turistas brasileiros e estrangeiros, que se encantam com o universo do maracatu de baque virado e fazem oficinas para aprender os instrumentos, são acolhidos pelas nações, que permitem a participação nos batuques.   Diferenças   A Noite Para os Tambores Silenciosos de Olinda tem suas diferenças da Noite dos Tambores Silenciosos do Recife - revivido desde 1976, na segunda-feira de carnaval. No Recife, as luzes são apagadas à meia-noite, com rufar dos tambores dos maracatus. Para Márcio Carvalho, presidente do Maracatudo, um dos mais jovens maracatus olindenses, criado em 1990, e participante do encontro de anteontem, o objetivo dos dois eventos é o mesmo: a religiosidade.   Os maracatus nação usam quatro tipos de tambores: as alfaias, tambores de maior porte, de tons mais graves; o repique, um tambor menor, responsável pelos médios-graves; o meião, de som mediano; e o marcante, que faz a marcação. Também são usados a caixa de bateria, o ganzá, o gonguê (espécie de chocalho de boi sem o sino) e mais recentemente o abê (cabaça num manto de contas).   Entre seus integrantes figuram rei, rainha, princesa, príncipe, vassalos, baianas e a dama do paço que carrega a calunga - uma boneca que representa o fundamento religioso da nação. Indiferente aos detalhes que fazem a beleza do maracatu nação, a multidão que assistiu às apresentações não poupou elogios. "É um espetáculo muito lindo", resumiu Hosana da Silva, recifense que viu o encontro pela primeira vez.

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