Equipes exaustas na procura por mortos

Agora o trabalho é de revirar a lama na busca por cadáveres

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Por Rodrigo Brancatelli
Atualização:

"Não me entenda mal, por favor, mas eu darei graças a Deus se apenas quatro ou cinco pessoas estiverem soterradas por aqui." Com essas 22 palavras e suas olheiras profundas de dias sem dormir direito, o policial civil Cristiano Laviando resume da maneira mais clara e honesta possível o sentimento dos moradores da região do Morro do Baú, entre Blumenau e Ilhota. Somente ontem de madrugada, cinco dias após o início dos deslizamentos no Estado, bombeiros, militares, voluntários e policiais como Cristiano conseguiram pisar na região e começar os trabalhos para resgatar as vítimas da tragédia. "Os helicópteros já retiraram os vivos. Agora, temos que encontrar os mortos", diz o subtenente José Eduardo Fabres de Jesus, de 40. "Nunca vi uma tragédia dessas. Aqui podem ter dezenas de pessoas mortas, sem falar o risco de doenças que existe a partir de agora e a possibilidade de novos deslizamentos. Sabemos que há três pessoas mortas soterradas em um morro aqui perto, mas não conseguimos chegar ainda porque nós podemos virar vítimas também." A região tem cerca de 100 quilômetros quadrados e está encravada no meio de dois vales, o que e potencializou a catástrofe e dificultou o acesso. Pelo menos sete mortes já foram confirmadas. O Estado sobrevoou ontem a região com um helicóptero do Exército e percorreu a pé uma das áreas mais afetadas do Morro do Baú. Morros exibem rastros de árvores arrastadas pela lama, como se fossem cicatrizes no meio do verde. Casas se transformaram em destroços e memória. O cheiro de fezes e de urina já se mistura com o odor podre dos animais mortos. Pelo menos 65 moradores dormem nas dependências da igreja da região, dividindo poucos colchonetes, racionando água e tentando ajudar. Eles inclusive já separaram caixões de madeira para enterrar as vítimas que ainda não foram encontradas. Há caixões para adultos e crianças. "A gente sabe que tem mais gente morta por aqui porque há muitos desaparecidos e a avalanche de terra foi instantânea", recorda o desempregado Cleber Alves, de 31 anos, que perdeu a casa e agora está abrigado na igreja do Baú. Os militares e civis que trabalham agora no Baú têm mais uma preocupação pela frente - as chuvas que estão previstas para este fim de semana. Pelo menos seis helicópteros estão incessantemente levando mantimentos e remédios para as áreas mais distantes da região. "Se realmente chover, vai ser outra tragédia, os morros vão começar a desmoronar novamente", prevê o subtenente José Eduardo Fabres de Jesus. Outras localidades continuam com o acesso complicado para quem trabalha no resgate. Apesar de o governo de Santa Catarina afirmar que não há mais lugares isolados, pelo menos cinco comunidades de Blumenau e dois bairros do município de Garcia só são acessíveis por helicóptero ou por grandes jipes do Exército. Os militares também se preocupam com a segurança pública. Além de boatos estupros na periferia de Blumenau e do Baú, há relatos de que pessoas com fardas falsas do Exército estão entrando nas casas para roubar. No entanto, o tenente-coronel Dalri, comandante das operações na região, nega esse tipo de ocorrência. "Já vi pessoas com armas à noite, rondando as casas para ver se há algo de valioso", diz o policial civil de Blumenau Marcos Augusto Pomarim. "Soubemos até de criminosos que estão indo aos abrigos para checar se há alvos valiosos e para descobrir quais casas estão abandonadas. A natureza humana é assim, há voluntários que estão há dias sem dormir apenas para ajudar a sua comunidade, enquanto há pessoas que só querem se aproveitar."

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