Escassez de matas acirra conflitos no Pará

Madeireiros aumentam a busca por matérias-primas em reservas extrativistas

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Por Daniel Bramatti
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ENVIADO ESPECIAL A MARABÁHá cerca de cinco anos, as serrarias de Nova Ipixuna, no sudeste do Pará, estavam com os pátios cheios de toras e tinham alta produtividade. O subproduto de sua atividade, a serragem, alimentava com folga as fábricas de tijolos e telhas instaladas na cidade.O quadro mudou desde então. As árvores nas áreas de exploração legal ficaram mais escassas. A busca por madeira nas reservas extrativistas aumentou, gerando denúncias de desmatamento ilegal. E a fiscalização do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), que multou e embargou empresas, se intensificou.Foi nesse contexto que ocorreu o assassinato dos líderes extrativistas José Cláudio Ribeiro da Silva e de sua mulher, Maria do Espírito Santo, há duas semanas. Eles eram militantes da causa ambientalista, queriam manter a floresta em pé, enquanto parte dos demais assentados na reserva Praialta-Piranheira preferia fazer negócios com os madeireiros, "limpar" o terreno, fabricar carvão e criar gado.A crise de produtividade das madeireiras pode ser medida pelo que ocorreu nas cinco fábricas de tijolos de Nova Ipixuna. Há dois anos, elas passaram a "importar" serragem de cidades como Goianésia e Parauapebas. "Ou a floresta acabou ou ficou muito longe", disse o administrador da Cerâmica Modelo, Jhony Rodrigues. "Até pouco tempo atrás, nunca tivemos esse problema de falta de matéria-prima.""Donos" das poucas fontes ainda disponíveis de madeira na região, os assentados na reserva onde viviam José Cláudio e a mulher passaram a ser mais assediados por empresários e atravessadores, segundo relatos colhidos pelo Estado. De acordo com a Comissão Pastoral da Terra (CPT), após a criação do assentamento, em 1996, a maioria das famílias ficou em áreas isoladas, longe das estradas vicinais abertas pelo Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Isso ensejou o aparecimento da figura do "madeireiro-prefeito"."Eles aparecem por lá com máquinas e se oferecem para abrir uma estrada até o lote do assentado", explicou José Batista Afonso, advogado da CPT. "O pagamento é acertado com a própria madeira que existe no lote.""A primeira coisa que muitos sem-terra fazem, ao ser assentados, é vender a madeira", confirmou Manoel Lopes Soares, da Fundação Zoobotânica de Marabá, vizinha a Nova Ipixuna.Essas negociações irregulares entre assentados e madeireiros foi documentada e denunciada por José Cláudio e Maria do Espírito Santo. O Ibama foi um dos destinatários dos pedidos de providência.Fiscalização. Apesar de Nova Ipixuna não ser prioridade para o instituto, já que está em 68.º no ranking dos municípios que mais desmatam, equipes de fiscalização estiveram lá, encontraram irregularidades e multaram serrarias."Desde 2006, não houve uma única serraria que não foi autuada e teve produtos florestais ilegais apreendidos", disse Marco Vidal, coordenador da operação de fiscalização lançada após a morte do casal extrativista. "Agora, seremos mais rigorosos."

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