Caminhos de um jornal em construção

Foram 4 anos de testes e avanços para se chegar ao ‘Estadão’ que começa domingo

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Por Gilberto Amendola
4 min de leitura

O leitor recebeu em casa um envelope lacrado. A instrução era para que ele o abrisse apenas em um momento específico, durante uma videoconferência com pesquisadores e diretores do Grupo Estado. Foi só então que ele teve em mãos o seu jornal de todo dia, porém em um formato completamente diferente.

Mas para chegar até o leitor esse novo Estadão percorreu um longo caminho. Podemos olhar para o ano de 2017 – quando uma reestruturação da empresa e a sua transformação digital teve início. Os primeiros passos na modernização do grupo e na reestruturação da produção de conteúdo foram dados há quatro anos. Em 2020, com a presença da consultoria Mckinsey, esse movimento, chamado de Estadão 3.0, intensificou-se.

Todo o desenvolvimento dos planosocorreu por videoconferência Foto: DANIEL TEIXEIRA / ESTADÃO

“A gente estava neste processo quando veio a pandemia. A primeira ação da empresa foi cuidar das pessoas. Todos foram para casa. Nos adaptamos bem à situação. E, apesar do distanciamento, todos os planos de mudança continuaram”, contou o editor-chefe do jornal, David Friedlander. 

Seguiram-se as mudanças em todas as áreas da empresa, até que uma questão foi levantada: se estamos mudando e modernizando processos, por que não olhar para o nosso carro-chefe, o jornal impresso? Logo nas primeiras discussões ficou claro aquilo que sempre foi inegociável: a qualidade e a profundidade do conteúdo teriam de permanecer intactas quaisquer que fossem as novidades.

Foi então que, em novembro do ano passado, o editor executivo Multimídia, Fabio Sales, começou a estudar o que havia de alternativas para o formato do jornal. Experiências internacionais mundo afora, como casos do La Nación (Argentina), El Comercio (Peru) e o The Guardian (Inglaterra), serviram de base para as pesquisas de Sales e equipe. Ainda naquele início juntou-se ao time o designer e jornalista Chico Amaral (agência Tric), que já havia sido responsável pelo redesenho do próprio Estadão, em 2010, e de outros jornais no Brasil e pelo mundo.

Amaral vive e trabalha em Barcelona. Sem a possibilidade de viagens intercontinentais (por causa da pandemia), todas as reuniões, apresentações e trocas de arquivo foram feitas por videoconferência – com participantes em Espanha, Argentina e Brasil. “O Fabio Sales foi quem conduziu esse diálogo. Com o fuso horário de 5 horas (a mais), eu era a primeira pessoa com quem ele conversava no dia, ainda no café da manhã”, brinca Amaral.

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Oito cenários

Sales e equipe trabalharam com oito cenários possíveis, que iam de um redesenho puro e simples do jornal que existia a alternativas de tamanho e modelos híbridos. “Fizemos simulações para ver o que valia a pena. O Estadão é um jornal centenário, com público cativo e que tem uma relação de amor com a marca. Tínhamos de saber se a mudança não teria um impacto negativo, principalmente entre leitores mais antigos” ponderou Sales.

Uma série de testes com leitores foi feita nos últimos meses. O formato escolhido foi o germânico (ou Berliner), que tem 28 centímetros de largura por 43 de altura. “A resposta dos leitores foi muito positiva. Primeiro, notando que não houve perda de conteúdo. Depois, viram-se beneficiados com um jornal mais fácil de levar a todos os lugares”, resumiu Sales.

Para Amaral, um formato mais compacto “se encaixa no ambiente da nova relação dos usuários com os jornais”. “O leitor vai reconhecer no novo formato tudo aquilo que ele sempre admirou no Estadão.”

A complexidade da operação envolveu todas as áreas do jornal. Para além da redação, a gráfica, o departamento comercial, o mercado leitor e outras estiveram presentes no passo a a passo da transformação. Com 45 anos de empresa, o diretor industrial Odair Bertoni lembra que essa foi a terceira vez que uma mudança de formato foi cogitada. A primeira reação de Bertoni, quando soube da mudança, foi de desconfiança. “Mas essa perspectiva mudou quando vi todo o comprometimento da empresa com esse passo”, afirmou. “O Estadão vai mudar. Vai ficar mais leve e contemporâneo, mas sem perder sua essência.”

O coordenador de sistemas editoriais, Fábio Britto, prevê que o fechamento das páginas mudará um pouco. “Antes, cada página era concluída individualmente. Agora, serão fechadas em dupla – de acordo com o formato do novo jornal”, avisou. “Estou feliz com essa sensação de renovação. Quem trabalha em jornal já cansou de ouvir que essa é uma mídia que vai morrer. Não, não vai. Ao contrário, vai nascer de novo.” E o diretor de Conteúdo e Operações do Blue Studio, Luís Fernando Bovo, se diz impressionado com a resposta dos leitores às mudanças. “O que a gente ouviu foi que o Estadão não é a forma. É o conteúdo. Ele está olhando para o novo hábito de consumo, para a sustentabilidade e para o futuro.”

Para a diretora do Mercado Leitor, Debora Huertas, esse foi “um projeto construído em equipe”, que “ouviu a voz do cliente”. Ela acompanhou os testes e avalia: “Vi a cara do nosso leitor quando segurava o jornal pela primeira vez. Ao folheá-lo, ao entender as mudanças, a aprovação foi geral e visível no rosto de cada um”.

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* Um novo Estadão vem aí

A versão impressa do Estadão será renovada a partir do próximo domingo, 17.  Com base nas expectativas dos leitores, ouvidos durante os 11 meses do projeto de transformação, o novo impresso terá inovações no conteúdo, com novas seções que priorizam o aprofundamento e o contexto dos fatos. Como resultado das pesquisas, o jornal impresso terá ainda um novo formato, o germânico (berliner). Mais fácil de manusear, ler e carregar, ele se adapta melhor ao dia a dia do leitor e já vem sendo adotado por jornais em vários países. Todas as mudanças têm como alicerce o jornalismo profissional e independente, ativos inegociáveis do jornal fundado há 146 anos.

 

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