PUBLICIDADE

Estudo oficial alerta para abandono e vulnerabilidade das fronteiras do País

Trabalho de 140 páginas assinado por grupo ligado ao Ministério da Integração Nacional registra a forte presença do tráfico de drogas e do contrabando nessas regiões e propõe 34 medidas, incluindo reforço de segurança e medidas para atrair profissionais

Por Marcelo de Moraes
Atualização:

A poucos dias do fim do mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o governo concluiu o estudo sobre os problemas encontrados na faixa de fronteira do País. Em 140 páginas, o trabalho constata a conhecida vulnerabilidade das extensas áreas (15,7 mil quilômetros) ao contrabando e ao tráfico e exibe a carência de políticas públicas específicas para essas localidades.O relatório foi preparado pelo Grupo de Trabalho Interfederativo de Integração Fronteiriça e entregue ao presidente neste mês. Teve coordenação do Ministério da Integração Nacional e propõe 34 medidas para tentar reagir aos problemas encontrados. As propostas incluem desde os óbvios pedidos de reforço de efetivo policial e de capacitação de agentes, fiscais e outros profissionais para atuar em ações específicas até a criação de gratificações especiais para incentivar profissionais a se interessarem pelo trabalho nessas regiões.Foi considerado prioritário o aumento de infraestrutura de transporte rodoviário, ferroviário, hidroviário e aéreo na faixa de fronteira, especialmente nas isoladas áreas da região Norte do Brasil.Além disso, outra prioridade defendida é a de implementar a infraestrutura hospitalar - quase sempre mínima ou inexistente nesses locais. O grupo de trabalho ainda sugere a legalização do processo de contratação de médicos e de outros profissionais de países vizinhos, mas apenas para operação nesses locais, e a criação de escolas bilíngues.A ampliação dos horários de funcionamento das aduanas vem como proposta para tentar aumentar o combate ao contrabando. Além disso, é sugerida a criação de um regime especial ou diferenciado para exportações e importações entre micro e pequenas empresas. Segundo o estudo, essas empresas hoje não conseguem operar por conta dos "requisitos legais e cadastrais aplicados de forma igualitária às médias e grandes empresas".Armas e drogas. Os problemas nos cuidados da enorme extensão da faixa de fronteira brasileira se refletem em situações cotidianas, como a entrada ilegal de armas e drogas que chegam aos grandes centros urbanos. A faixa abrange 588 cidades, espalhadas por 11 Estados, envolvendo cerca de 10 milhões de habitantes.Uma característica especial desse vasto território é a presença das chamadas cidades-gêmeas. Na prática, são cidades vizinhas, separadas apenas pela fronteira entre os países. Em alguns casos, isso se resume ao simples gesto de atravessar uma rua.O estudo do governo mostra que, se as cidades-gêmeas podem ajudar na desejada integração da faixa de fronteira, representam também um caminho de acesso ao Brasil para o tráfico e para o contrabando. "Estas também servem de porta de entrada de produtos ilícitos de diversas naturezas e de saída de recursos naturais e minerais, explorados sem controle e ilegalmente, gerando danos ao meio ambiente", cita o documento.Além disso, em várias situações, o chamado "fluxo financeiro e econômico não desejável" acaba tendo a tolerância de governos vizinhos."Cabe lembrar que nem todos os fluxos financeiros e econômicos observados ao longo da zona de fronteira representam situações desejáveis, na medida em que algumas relações ocorrem à margem da lei. Contudo, tratam-se de características do desenvolvimento dessas regiões que acabam por requerer um olhar especial do poder público, no sentido de modificar os incentivos econômicos e promover a adequação das economias locais aos limites da legislação", descreve o relatório."Um exemplo do sistema produtivo de fronteira, que combina comportamentos legais e ilegais, é encontrado na zona de fronteira entre Foz do Iguaçu e a Zona Franca de Ciudad del Este. Esta última concentra empresas que consomem subprodutos de indústrias localizadas no Brasil sob a forma de contrabando, voltando ao Brasil e sendo registrado como produto brasileiro ou paraguaio ou ainda de um terceiro país, dependendo do câmbio e das mudanças na política brasileira de impostos incidentes sobre importação e exportação", exemplifica o trabalho.Desafio. "É um grande desafio conseguir soluções concretas para os problemas apresentados na faixa de fronteira. E eu diria que o ponto central não está na quantidade de pessoas que se coloca para trabalhar nessa região. O principal é a organização e racionalização do trabalho e dos recursos financeiros destinados", avalia Fábio Cunha, diretor do Departamento de Programas das regiões Norte e Nordeste da Secretaria de Políticas Regionais do Ministério da Integração Nacional."O tratamento diferenciado da faixa de fronteira entrou definitivamente na agenda do governo", diz Cláudia Cybelle Freire, gerente-executiva do Programa de Promoção do Desenvolvimento da Faixa de Fronteira.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.