''Execução sumária firmou-se como parte da política de segurança''

José Cláudio Souza Alves: professor da UFRRJ; para sociólogo, governo não combate milícias e só permite reconfiguração [br]do crime para ampliar sua base eleitoral

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Por Felipe Werneck
Atualização:

Professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), o sociólogo José Cláudio Souza Alves, de 46 anos, passou os últimos 15 estudando grupos de extermínio na Baixada Fluminense. No livro Segurança, Tráfico e Milícias no Rio, organizado pela ONG Justiça Global, seu artigo trata das "mudanças na economia política do crime" provocadas pelas milícias. Após 40 anos de atuação de grupos de extermínio, afirma que a execução sumária firmou-se como parte da política de segurança. Para ele, o governo do Estado "não toca de forma fundamental na estrutura das milícias" e teria objetivo de "ampliar sua base eleitoral" com atuação desses grupos. Indagado sobre a falta de provas, disse: "Faço analogia, estou depreendendo por uma lógica histórica, geopolítica. Não tem trabalho de campo, porque criminoso não faz ata." Morador de Vigário Geral, Alves define as milícias como "continuidade aperfeiçoada" de grupos de extermínio. "Elas não surgiram do nada, por geração espontânea." Leia trechos de sua entrevista: Qual sua avaliação do secretário José Mariano Beltrame? O Mariano é honesto, se expõe publicamente, é aquilo que está falando. Quer repressão, confia na repressão, acha que a lógica de confrontos é a melhor. Ele é útil a essa estrutura. Um governo que mantém política dessa envergadura em termos de execuções sumárias e não toca de forma fundamental na estrutura das milícias só permite que alguns sejam tocados. E deixa rolar. Na ponta está sendo beneficiado. E vai se beneficiar do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). Deixar áreas como o Alemão dominadas pelo tráfico seria a solução? Não. Mas se valer de milícias ou reconfiguração do crime para ampliar base eleitoral, estrutura de dominação... Que reconfiguração é essa? Tirar a área do Comando Vermelho. Um estudo decente seria ver nas áreas de milícias e favelas como o Alemão quem era eleito antes e quem será agora. Haverá uma reconfiguração a partir da segurança, que deixou de ser pública e se tornou de interesses econômicos e políticos bem consolidados. O plano mais forte hoje é eliminar o CV, que era predominante e está perdendo espaços estratégicos. O Alemão é seu bunker no Rio. Foi escolhido para a operação de 19 mortos (em 2007). Mas recente relatório da Subsecretaria de Inteligência indicou que mais de dois terços (119) das 171 áreas dominadas por milícias não eram de facção. Suspeito, vindo de onde vem. Teria de ir lá e checar. A Secretaria da Segurança diz que brecou nomeações políticas em delegacias e batalhões e investigações têm levado à prisão vereadores e deputados. Isso é farsa. Permanece quem mantém a estrutura. Vão fazer uma ou outra modificação, fazer algo para calar a opinião pública. Vai ter de cair alguém. É o lado mais frágil da estrutura, talvez mais ambicioso e ignorante e menos articulado, que vai para o sacrifício. E o ex-chefe da Polícia Civil Álvaro Lins, que foi cassado? Esse caiu porque ficou muito exposto, deixou muita ponta, e a Polícia Federal pegou. São operações que vêm de fora. E mesmo assim foi por muito pouco, só um voto. Ele tinha certeza de que não seria cassado. Acho que foi o que melhor estruturou (as milícias). Pode ser o grande nome por trás, mas tenho medo de grandes nomes. O que vejo é uma rede muito bem estruturada. Quem é: José Cláudio Alves Sociólogo, com doutorado pela USP, e especialista em grupos de extermínio Professor e pró-reitor de Extensão da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro

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