Famílias de desaparecidos de Brumadinho compartilham sofrimento online
Diário da tragédia revela, aos poucos, sentimentos mudando de esperança para tristeza ou mesmo conformismo
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Por Felipe Resk
Atualização:
Em busca de informação sobre vítimas, moradores de Brumadinho organizaram-se por WhatsApp para compartilhar novidades, perguntar por entes queridos e comentar as ações de resgate. Autorizado por administradores, o Estado acompanhou o grupo “Desaparecidos Brumadinho”, com mais de 200 membros, desde o sábado, 26. Nas mensagens, os participantes acabaram escrevendo uma espécie de diário da tragédia.
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Sábado, 26 de janeiro
No dia seguinte à tragédia, bombeiros faziam sobrevoo de helicópteros e buscas por terra. Foram localizadas 366, além de 34 mortos e 254 desaparecidos. “Gente, que angústia. Nunca pensei que passaríamos por isto”, escreveu uma moça às 19h17, quando o sol de Brumadinho ia se pondo. As famílias sabiam que isso significava a suspensão das buscas até a manhã seguinte. “Espero que todos apareçam”, outro comentou. “É muito triste ficar sem noticia.” Entre as mensagens, porém, havia quem demonstrasse ânimo. “Enquanto não há corpo, ainda há esperança”, escreveram. “Deus, vamos ter fé.”
Domingo, 27 de janeiro
“Que barulho é esse há um tempo? Parece alarme, sei lá”, dizia uma mensagem, antes das 6 horas. Era o início de mais um pesadelo: com risco de desabamento da barragem 6, foi preciso evacuar áreas da cidade e suspender buscas. No grupo, proliferaram notícias falsas: “ALERTA A BARRAGEM ROMPEU”.
“Mães, parentes e amigos que sofrem sem notícia e, para piorar, não podem esperar nem em suas casas porque moram perto de rio”, comentou uma mulher. Às 11 horas, fotos e vídeos do exército de Israel animaram o grupo, mesmo após a informação de que a ajuda só desembarcaria à noite. “Que Deus use eles como instrumento”, dizia um comentário, seguido de emojis de mãos batendo palma. O clima mudou pouco depois. O número de mortos chegou a 58; os desaparecidos, a 305. Já não se falava mais em resgates. “Cada dia a mais, a angústia aumenta”, comentaram. “Ontem, minha prima e afilhada de coração estavam arrumando a casa dela para receber o pai”, contou uma participante. “Ela tem certeza que ele volta. Tem 11 anos.”
Veja imagens do rompimento de barragem de rejeitos da Vale em Brumadinho
1 / 37Veja imagens do rompimento de barragem de rejeitos da Vale em Brumadinho
Tragédia em Minas Gerais
A Agência Nacional de Mineração (ANM) declarou que a mineradora Vale vistoriou, em dezembro de 2018, estrutura da barragem de Brumadinho sem ter apont... Foto: Washington Alves/ReutersMais
Moradores
É comum ver imagens de moradores de Brumadinho olhando para o horizonte em silêncio Foto: Mauro Pimentel/AFP
Catástrofe ambiental e humana
Bombeiro recolhe gaiolas no meio do mar de lama da catástrofe de Brumadinho. Foto: Adriano Machado/Reuters
Animais
Equipes de resgate voluntáriastentaramsalvar a vaca que esta atolada na lama de rejeitos de ferro. O animal teve que ser sacrificado. Foto: Wilton Junior/Estadão
Dificuldade no resgate
Bombeiros têm dificuldade de acessar algumas áreas para fazer o resgate dos sobreviventes Foto: Douglas Magno/AFP
Tragédia em Minas Gerais
Uma barragem de rejeito se rompeu em Brumadinho, na região metropolitana de Belo Horizonte. Foto: Douglas Magno/AFP
Tragédia em Minas Gerais
Lama destruiu estrada em Brumadinho. Foto: Washington Alves/Reuters
Tragédia em Minas Gerais
A tragédia aconteceu na altura do km 50 da Rodovia MG-040. Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
Tragédia em Minas Gerais
As barragens pertencem à mineradora brasileira Vale. Foto: Washington Alves/Reuters
Catástrofe ambiental e humana
Bombeiros tentam, sem sucesso, resgatar uma vaca atolada após rompimento de barragem. Foto: Adriano Machado/Reuters
Tragédia em Minas Gerais
Segundo informações do site da Vale sobre as barragens da região, a estrutura que se rompeu foi construída em 1976. Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
Tragédia em Minas Gerais
A prefeitura de Brumadinho pediu que a população mantenha distância do leito do Rio Paraopeba, que é um afluente do São Francisco. Foto: Douglas Magno/AFP
Tragédia em Minas Gerais
A Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa), responsável pelo abastecimento de água na região metropolitana de Belo Horizonte, afirmou que não ... Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas GeraisMais
Tragédia em Minas Gerais
Segundo a Vale, a área administrativa, onde estavam os funcionários, foi atingida, assim como a comunidade da Vila Ferteco. Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
Tragédia em Minas Gerais
Os bombeiros enviaram equipes com policiais civis e militares, além de enfermeiros e medicamentos. Foto: Washington Alves/Reuters
Tragédia em Minas Gerais
Kombi foi soterrada pela lama após o rompimento da barragem em Brumadinho. Foto: Washington Alves/Reuters
Tragédia em Minas Gerais
Casa foi destruída e foi soterrada pela lama após o rompimento da barragem da Vale em Brumadinho. Foto: Washington Alves/Reuters
Tragédia em Minas Gerais
O governo federal montou um gabinete de crise em Brumadinho. Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
Tragédia em Minas Gerais
Moradores de Brumadinho observam a lama que atingiu a cidade. Foto: Washington Alves/Reuters
Tragédia em Minas Gerais
No município de Brumadinho vivem cerca de 40 mil pessoas. Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
Tragédia em Minas Gerais
O rompimento das barragens da Vale aconteceu na tarde de 25 de janeiro de 2019. Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
Tragédia em Minas Gerais
O presidente Jair Bolsonaro fez pronunciamento no Palácio do Planalto, em Brasília, sobre a tragédia em Brumadinho. Foto: Ernesto Rodrigues/Estadão
Presidente Bolsonaro
Presidente Jair Bolsonaro observa destruição causada após rompimento de barragem da Vale em sobrevoo a Brumadinho Foto: Isac Nóbrega/Presidência da República
Tragédia em Minas Gerais
Voluntários trazem doações para as vítimas da tragédia em Brumadinho. Foto: Paulo Fonseca/EFE
Tragédia em Minas Gerais
Bombeiros retomaram os trabalhos na manhã deste sábado, 26. Foto: Corpo de Bombeiros de Minas Gerais
Tragédia em Minas Gerais
Fernando Nunes de Araujo é uma das dezenas de pessoas que começam a chegar na faculdade ASA de Brumadinho, onde deve ser divulgada a primeira lista de... Foto: Wilton Junior/EstadãoMais
Tragédia em Minas Gerais
Fernando Nunes de Araujo é uma das dezenas de pessoas que começam a chegar na faculdade ASA de Brumadinho, onde deve ser divulgada a primeira lista de... Foto: Wilton Junior/EstadãoMais
Batalha pela Vida
Bombeiros voltam enlameados após resgate em uma das áreas atingidas pelorompimento da barragem de rejeitos de Brumadinho, em Minas Gerais. Foto: Wilto...Mais
Estrada
Moradores observam trabalho dos bombeiros em estrada bloqueada pela lama em Brumadinho (MG) Foto: Wilton Junior/Estadão
Carro atolado
Um carro ficou atolado e destruído no meio da lama após o rompimento de barragem em Brumadinho (MG) Foto: Wilton Junior/Estadão
Helicoptero
Um helicóptero sobrevoa a cidade de Brumadinho, buscando vítimas após o rompimento da barragem Foto: Wilton Junior/Estadão
Bombeiros tentam encontrar sobreviventes em Brumadinho
Bombeiros tentam encontrar sobreviventes em Brumadinho após rompimento de barragem Foto: Washington Alves/Reuters
Corpo encontrado
Bombeiros carregam o corpo de uma das vítimas do rompimeto da barragem em Brumadinho até posto montado em frente da Igreja de Nossa Senhora das Dores Foto: Wilton Júnior/Estadão
Ponte
Ponte arrastada pela lama nas proximidades da barragem do Córrego do Feijão, em Brumadinho, MG, de propriedade da Vale Foto: Antonio Lacerta/EFE
Área devastada
Área devastada pela lama após o rompimento da barragem do Córrego do Feijão,de propriedade da mineradora Vale Foto: Wilton Júnior/Estadão
Equipe de resgate
Grupo de resgate caminha sobre a lama em busca de vítimas do rompimento da barragem do Córrego do Feijão, emBrumadinho (MG), de propriedade da Vale Foto: Antonio Lacerda/EFE
Resgate aéreo
Equipe de resgate usa helicóptero para procurar vítimas do rompimento da barragem do Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG), de propriedade da Vale Foto: Giazi Cavalcante/Código 19
Segunda, 28 de janeiro
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Às 10h35, veio a ideia que acabou monopolizando o dia: “Alguém sabe se estão fazendo buscas nas matas?”. Em pouco tempo, muitos se voluntariaram. Até foi criado um novo grupo só para os interessados. “É um espaço muito grande para poucos bombeiros. Devemos ir todos.” À noite, em coletiva, os Bombeiros descartaram a hipótese de ter sobreviventes na mata. Os mortos, ao todo, eram 84.
Terça, 29 de janeiro
O grupo passou a madrugada calado. “Francis era meu amigo e foi enterrado hoje, caixão fechado”, dizia uma das últimas mensagens, ainda do dia anterior. Nem a prisão de engenheiros que atestaram a segurança da barragem quebrou o silêncio do grupo. À tarde, uma notícia sobre a morte de uma vaca que havia ficado atolada mobilizou alguns. Outro reclamou: “Tô pouco me lixando para vaca, quero encontrar meu irmão”.
Quarta, 30 de janeiro
“Minha esperança é de que encontrem nossos parentes e amigos para que tenham um sepultamento digno”, dizia uma mensagem. Ao longo do dia, muitos perguntavam por atualização de lista de mortos, que só foi divulgada às 22 horas. “Pena que não saiu o nome do meu primo.”
Quinta, 31 de janeiro
As mensagens ficaram espaçadas e muitos, sem ter mais por quem precisar de informação, deixaram o grupo. Às 23h30, alguém quis prestar um serviço e publicou um passo a passo: “Como retirar certidão de óbito”.