Frank Gehry: de Bilbao aos Simpsons

Um dos arquitetos mais famosos do mundo, ele já foi motorista de caminhão e montador de cozinhas

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Por Jonathan Glancey
Atualização:

Sami Gehry me conduz pelo escritório do pai, em Los Angeles. Filho do arquiteto Frank Gehry, ele tem 28 anos. Olhando ao redor, a maior parte dos cerca de 200 empregados parece ter idade parecida e fazer maquetes que se contorcem, retorcem e serpenteiam. Logo o pai aparece, de jeans, camiseta e meio século a mais. Sentado em seu escritório com camisetas de hóquei no gelo emolduradas, fotos de família, poltronas giratórias de papelão, estatuetas de Mickey Mouse, pinturas de amigos e um grande peixe de madeira, o arquiteto mostra desenhos e livros de projetos anteriores: casas de influência japonesa, esquemas para habitação social, construções parecidas a caixas. Seu impulso criativo é fruto de uma infância peculiar. "Comecei construindo pequenas maquetes de cidades com minha mãe no chão de nossa casa em Toronto, enquanto meu avô lia a Torá." A família da mãe havia emigrado da Polônia em 1913; a do pai era da fronteira entre Polônia e Rússia. Ele fabricava e vendia móveis e, por um tempo, fez balanços de papel machê em forma de cavalo para as crianças. Os Gehry eram pobres. "Na escola, era surrado por meninos poloneses católicos. Mas os católicos franceses, minoria em Toronto, estavam ao meu lado e aprendi a reagir. Até fiquei bom no hóquei." Quando tinha 11 anos, um especialista em caligrafia lhe disse que seria arquiteto famoso. Aos 17, a família mudou-se para a Califórnia. Gehry se tornou motorista de caminhão, entregando e instalando cozinhas. Um de seus clientes era Roy Rogers, rei dos caubóis. Rogers fez o jovem de 17 anos se sentir à vontade em sua casa. "Fui convidado para o jantar de Natal e pude comparecer a estréias de filmes e festas. Senti um pouco do que a Califórnia tinha a oferecer." Numa palavra, a liberdade. "Comecei a freqüentar a escola noturna, cursar desenho - de início, recebi nota F - e depois caligrafia, projeto de livros, arquitetura. Disseram-me que era bom arquiteto. E um elogio pode ter grande efeito sobre um jovem." A Guerra da Coréia havia acabado, e ele passou o serviço militar projetando móveis para o Exército. Finalmente, entrou em Arquitetura. Mostrou seu trabalho ao austríaco Richard Neutra, pioneiro do moderno estilo californiano: casas abertas, de aço ou madeira geométricos e vidro. Neutra lhe ofereceu emprego. Com mulher e dois filhos, ele mencionou o salário. Neutra ficou horrorizado: Gehry deveria pagar pelo privilégio de trabalhar com ele. "Era comprometido com o modernismo, mas também estava em busca de criar mais encanto na arquitetura." Levou algum tempo até encontrar o caminho de uma arquitetura que expressasse movimento. Até que se lembrou da forma dos peixes e passou a desenhá-los por toda parte. Após capturar o espírito em movimento, nunca mais olhou para trás. O Guggenheim Bilbao, de 1997, fez dele um dos arquitetos mais famosos do mundo. A ponto de aparecer nos Simpsons e ter seu Disney Concert Hall adotado pela Câmara do Comércio de Los Angeles como símbolo da cidade, substituindo a famosa placa de Hollywood sobre a colina. "O grande objetivo agora, para mim, é estimular todos esses jovens talentos. Adoraria ver o pessoal da geração de Sami fazendo o escritório funcionar. A arquitetura é um continuum; precisamos continuar em movimento."

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