Grávida, idosa e crianças acampam em frente à prefeitura do Rio por moradia

Maioria é de desempregados e moradores de favelas da região, que não têm como pagar aluguéis; PM retirou grupo de prédio da telefônica Oi

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Por Roberta Pennafort
Atualização:

RIO DE JANEIRO - No grupo de 150 pessoas acampadas em frente à prefeitura do Rio de Janeiro neste sábado, 12, há doze crianças, entre elas dois bebês, uma grávida de nove meses e uma senhora de 82 anos. Eles dormiram na porta do prédio após terem sido retirados à força de imóvel da telefônica Oi, no Engenho Novo, zona norte carioca. O edifício foi ocupado durante 11 dias até a reintegração de posse, feita pela Polícia Militar nessa sexta-feira, 11.

Eles têm perfil semelhante: mulheres ou casais desempregados ou subempregados (são ambulantes, pedreiros, domésticas sem carteira assinada), com dois filhos ou mais, moradores de favelas da região, que não têm mais como arcar com os aluguéis. O grupo dormiu sobre lençóis e sacos plásticos.

 

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Boa parte deles é egressa de comunidades cujos imóveis tiveram valores reajustados depois da instalação de Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), como Jacarezinho, Manguinhos, Arará e Mandela. As áreas se valorizam com a recente diminuição da criminalidade. A maioria das pessoas ouvidas pelo Estado contou que paga cerca de R$ 300 por mês por quitinetes. Algumas estavam sob viadutos da zona norte. As que têm vínculo empregatício relatam ganhar o salário mínimo, atualmente de R$ 724.

Entre ficar de favor na casa de parentes e ocupar o edifício de quatro andares da Oi (um antigo almoxarifado desativado que ganhou o nome de Favela da Telerj, em alusão à antiga companhia telefônica do Rio), preferiram a segunda opção, mesmo sob risco de expulsão violenta. Elas levaram eletrodomésticos e gastaram o pouco que tinham guardado para comprar material de construção para fazer divisórias entre os barracos - sem ventilação e de no máximo nove metros quadrados.

Sem lugar. Na sexta-feira, com o prédio cercado pela polícia, os pertences e entulho foram retirados de caminhão. Funcionários da Light, companhia energética do Rio, desfaziam gatos de luz. O confronto dos ocupantes com a PM resultou em 16 feridos, sendo nove policiais. Veículos foram incendiados, dois supermercados, saqueados e lojas e agências bancárias, depredadas. Por volta de três mil pessoas moravam ali.

“Estava vivendo dentro de uma igreja evangélica no Jacarezinho e achei que valia ir a pena para o prédio. Sou camelô e pedi dinheiro para minha sogra para comprar água e refrigerante e vender no edifício mesmo. A polícia ficou com tudo, ainda bebeu na minha frente, debochando”, conta Daniele Neves, de 28 anos, que deixou os dois filhos com a avó e a bisavó, temendo a ação da PM.

Com dois meses, o bebê Carlos Alessandro foi mantido com a mãe, que tem outros quatro filhos. Na sexta de manhã, ela deixou o menino com a irmã, Adriana Aldeir, de 40 anos, sob uma sombra em frente à Prefeitura, para procurar um lugar para tomar banho. “Sabia que podia não dar certo, mas tinha que tentar. A polícia entrou como se fosse o Carandiru. É pedir muito querer um teto para morar?”, diz Adriana, que é doméstica e teme perder o emprego em apartamento em Ipanema, na zona sul. “Não posso sair daqui sem pelo menos meu nome num cadastro”.

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O grupo chegou à Prefeitura na sexta à tarde. Servente aposentada, Gelsa Ramos, de 82 anos, que até dois anos atrás fazia faxina para conseguir sobreviver, não pretende sair dali. “Se nós não ficamos, o governo acha que não estamos precisando”. A manicure Angela Xavier, de 34 anos, admite que o grupo foi ingênuo ao acreditar que poderia ter uma nova vida no prédio. “Não achei que a justiça iria esnobar o pobre dessa maneira e proteger uma empresa que tem um prédio vazio há anos. A injustiça social desse País é inacreditável.”

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