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Hospital deve ser obrigado a notificar suspeita de violência contra a mulher?

Pelo projeto de lei, unidades de saúde eram obrigadas a informar à polícia casos suspeitos em até 24 horas; especialistas divergem - leia os dois posicionamentos e participe da enquete

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Por Redação
Atualização:

SÃO PAULO - O presidente Jair Bolsonaro comunicou ao Senado Federal que decidiu vetar, integralmente, o projeto de lei que obrigava os hospitais das redes de saúde pública e privada a notificar casos suspeitos de violência contra a mulher à polícia em até 24 horas.

Grupo faz ato contra a violência contra as mulheresno vão livre do Museu de Arte de São Paulo (Masp), na Avenida Paulista, na região central de São Paulo Foto: Rafael Arbex/Estadão

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No projeto, a deputada federal Renata Abreu (PTN-SP) afirmou que "não existe por parte dos órgãos governamentais qualquer canal de comunicação entre hospitais e delegacias que mapeie de forma significativa as áreas com maior concentração de violência à mulher".

Já o governo argumentou que a medida "vulnerabiliza ainda mais a mulher, tendo em vista que, nesses casos, o sigilo é fundamental para garantir o atendimento à saúde sem preocupações com futuras retaliações do agressor".

O Estado consultou duas especialistas, que divergem sobre o tema. Leia os posicionamentos e participe da enquete.

NOTIFICAÇÃO DEVE SER OBRIGATÓRIA?

SIM

Todo tipo de doença hoje já é notificada pelos hospitais: dengue, zika, sarampo, aids... Por que não pode notificar espancamento?

Luiza Nagib Eluf, advogada criminalista e ex-procuradora

Para a advogada criminalista e ex-procuradora Luiza Nagib Eluf, o veto do presidente Jair Bolsonaro foi "um erro incompreensível e injustificável", que deveria ser derrubado pelo Congresso Nacional. Na visão dela, a lei contribuiria para o combate à violência contra a mulher, uma vez que poderia melhorar a qualidade das estatísticas, consequentemente, as políticas públicas voltadas ao tema.

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"Historicamente, os casos de violência de gênero são subnotificados, esses registros seriam importantes para se avaliar a profundidade da tragédia no Brasil", diz. "Como vamos conseguir formular estratégias de governo ou tomar medidas sem dados ter acesso a dados adequados?"

Para Luiza, a comunicação obrigatória de casos suspeitos não significaria mais riscos à vítima.

"Apenas estaria mostrando números. Ninguém vai publicar o nome, RG ou endereço da vítima e nem processar o suposto agressor", afirma. "Todo tipo de doença hoje já é notificada pelos hospitais: dengue, zika, sarampo, aids... Por que não pode notificar espancamento?"

NÃO

Se fosse uma comunicação só para fins estatísticos, tudo bem. Mas a redação da lei, da forma como estava, não era deixava isso claro

Silvia Chakian, promotora

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A promotora Silvia Chakian, do Grupo de Enfrentamento a Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher (Gevid), do Ministério Público de São Paulo (MPE-SP), afirma que "neste momento" o veto do presidente Jair Bolsonaro "foi positivo". Para ela, antes de tornar obrigatória a notificação de casos suspeitos, é necessário debater melhor quais seriam os possíveis efeitos colaterais.

"Há preocupação grande de que as mulheres acabem não procurando mais o sistema de saúde, com medo de que isso vá parar na delegacia", afirma.

Nesses casos, segundo a especialista, não só a mulher deixaria de receber atendimento como também aumentaria as taxas de subnotificação de violência de gênero, que historicamente já são altas.

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"Todos devem debater melhor o assunto e buscar estratégias que não provoquem desestímulo, aumento de subnotificação e revitimização", diz.

Na interpretação da promotora, a lei não dava, ainda, garantia de sigilo à vítima.

"Se fosse uma comunicação só para fins estatísticos, tudo bem. Mas a redação da lei, da forma como estava, não era deixava isso claro."