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IPT aponta má qualidade da obra, que tinha até paredes finas de concreto

Relatório aborda aspectos construtivos e deficiências na fiscalização dos trabalhos na futura estação de metrô

Por Bruno Tavares
Atualização:

Mais do que apontar os 11 fatores que desencadearam o colapso da futura Estação Pinheiros do Metrô, o relatório produzido pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) faz menção direta à baixa qualidade do túnel sobre a Rua Capri. Ao longo de um ano e cinco meses de investigação, os técnicos observaram, por exemplo, a existência de paredes de concreto com dimensão menor do que o previsto, quantidade de fibras de aço inferior ao recomendável e até mesmo a ausência delas. A animação gráfica preparada pelo IPT e anexada aos 29 volumes do laudo final também ajuda a explicar em detalhes a dinâmica do acidente. O vídeo começa mostrando que o projeto não levou em consideração o modelo geológico complexo do local. Durante a remoção dos escombros, os peritos encontraram o mesmo perfil de terreno mapeado em 1997 pelo próprio IPT para a elaboração do projeto básico de construção da Linha 4. A investigação técnica também concluiu que, mesmo tendo sido desconsiderado os estudos geológicos, as empreiteiras tiveram pelo menos outras duas oportunidades para corrigir os rumos da obra: durante a escavação do poço da Rua Capri e da calota (porção superior) do túnel. "Havia ampla disponibilidade de conhecimento e informações sobre a geologia do local. Apesar disso, foi empregado um modelo geomecânico deficiente e, conseqüentemente, a estrutura foi projetada com suporte de baixa capacidade", afirma o IPT. A água também contribuiu para o colapso. Isso porque os túneis foram projetados para serem escavados na condição de "drenados", ou seja, sem pressão de água sobre eles. No entanto, a investigação detectou uma coluna de água sobre a calota, o que contribuiu para dar ainda mais instabilidade às paredes do túnel da estação. O terceiro fator apontado pelo IPT já havia sido revelado pelo Estado em março. O consórcio executou uma escavação maior do que a prevista no projeto. Isso contribuiu para aumentar a exposição das paredes frágeis e das estruturas geológicas desfavoráveis, reduzindo o apoio para o suporte das chamadas cambotas (treliças com barras de aço de 20 milímetros de diâmetro, colocadas a cada 80 centímetros). De fato, os peritos do instituto confirmaram que o maciço rochoso teve um "comportamento anômalo" no dia do acidente, como já havia sido alegado por representantes do Via Amarela nos dias seguintes à tragédia. Os investigadores do IPT, no entanto, são taxativos ao avaliar a conduta dos engenheiros do consórcio diante das informações fornecidas pela instrumentação (monitoramento) do terreno. "Exigia-se ação para a avaliação da instabilidade do túnel por meio de retroanálises. Não há documentos nem declarações que comprovem essa ação", afirma o IPT. Naquele 12 de janeiro, houve duas campanhas de instrumentação, de manhã e à tarde, segundo o relatório. Os dados, porém, não foram utilizados nem para ações corretivas nem para o acionamento do plano de emergência, o que permitiria a evacuação do entorno do canteiro de obras e, possivelmente, evitaria as sete mortes. INVERSÃO Para o IPT, a inversão no sentido de escavação do túnel também pode ter colaborado para o desabamento. O projeto original previa que os trabalhos tivessem início no poço da estação e seguissem em direção à Rua Capri. A mudança até agora inexplicável pode ter contribuído para a instabilidade do túnel. Além disso, houve aumento de 30% da profundidade de escavação da primeira camada de terra (tecnicamente denominada primeiro rebaixo). Num terreno de baixa qualidade e estrutura geológica desfavorável, isso tornou ainda mais instável o apoio das cambotas. Também houve modificação na seqüência de escavação do primeiro rebaixo. O projeto original previa que o trabalho começasse pela parte central do túnel, a fim de evitar maior impacto das detonações no pé das cambotas. Como isso não foi respeitado, houve mais danos ao maciço rochoso. Na avaliação do IPT, o grande número de desconformidades - "desde aspectos construtivos até o sistema de gerenciamento de riscos" -, aliado às deficiências na fiscalização do trabalho e a um sistema de autocertificação ineficiente comprometeram a qualidade de execução do túnel. TIRANTES O IPT constatou ainda que, apesar de terem perfurado as paredes do túnel para a instalação de tirantes (espécie de parafusos gigantes), os engenheiros acabaram não colocando os pinos que ajudariam na sustentação. Na época, o então presidente do Metrô, Luiz Carlos David, disse que os operários trabalhavam nisso quando foram obrigados a deixar o canteiro às pressas. O fato é que os buracos feitos na rocha e a ausência dos tirantes pioraram a qualidade do maciço rochoso. As detonações realizadas no dia do acidente, embora de baixa intensidade, agravaram a instabilidade do túnel ao produzirem vibrações. Os gases liberados pelos explosivos também acabaram por preencher as fraturas cobertas por argila, o que ocasionou danos ao terreno. Por fim, o IPT argumenta que a inexistência de gestão de risco e de planos de contingência e de emergência levaram o consórcio a desconsiderara a possibilidade de um colapso de grandes proporções.

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