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Legacy ficou fora do radar por 15 minutos e recebeu 5 alertas

Análise da caixa-preta do Legacy registrou que não houve resposta dos pilotos americanos aos alertas das torres de controle

Por Agencia Estado
Atualização:

Os controladores de vôo do Cindacta-1, em Brasília, tentaram cinco vezes entrar em contato por rádio com o jato Legacy antes da colisão, na sexta-feira, com o Boeing 737-800 da Gol, que causou 155 mortes. O jato ficou com o transponder (que identifica o avião no radar) desligado 15 minutos antes do acidente. O Legacy só voltou a ser identificado na tela já sobreposto ao Gol, com um alerta de emergência. As gravações da caixa-preta do Legacy confirmam os relatos dos operadores e os registros do Cindacta-1. O último alerta de rádio gravado na caixa-preta foi dado porque o jato estava no limite da cobertura do Cindacta-1 e devia passar a se comunicar com o Cindacta-4, de Manaus. O Legacy havia decolado de São José dos Campos e, depois de voar no eixo São Paulo-Brasília, seguia para Manaus. A caixa-preta registra que não houve resposta dos pilotos americanos. ?Nela há o chamado feito pelo controle de Brasília quando o jato ia passar para Manaus?, disse um oficial da Aeronáutica. Mesmo sem resposta, o Cindacta-1 continuou a transmitir para o Legacy às cegas (?blind?, no jargão do setor). Essa nova informação reforça a hipótese de falha humana da tripulação do Legacy, já que poucos minutos após o impacto com o Boeing o jato voltou a se comunicar por rádio com Brasília. "Esse é um procedimento padrão. Como o controle do tráfego aéreo é fundamentalmente feito por rádio, a primeira medida foi tentar estabelecer contato com o piloto do Legacy", explicou um oficial da Aeronáutica. "Enquanto isso era feito, houve a colisão." A suspeita dos peritos é de que o comandante do Legacy, Joseph Lepore, diminuiu o volume do rádio. Ou que não estava na cabine na hora da colisão - algo que teria admitido em depoimento à polícia. No passo-a-passo reconstituído pelo Estado, o Legacy ignorou seu plano de vôo. Deveria ter descido de 37 mil para 36 mil pés quando passou por Brasília e mudou o rumo para Manaus, o que não ocorreu. O sargento controlador do vôo, que se ocupava de muitos outros aviões na mesma hora, chamou o Legacy pelo rádio pela primeira vez, questionando se o avião tinha mudado a rota. Ficou sem resposta. Chamou mais quatro vezes. Àquela altura, o Legacy já estava com o transponder desligado. A falta do sistema não faz o avião desaparecer da tela do radar. Ele só deixa de ser identificado pelo radar, que perde a exatidão da altimetria do jato. O Cindacta-1 continuava a ver o Legacy por meio do radar primário. Por ele, o controlador via a altitude aproximada do jato - quanto mais longe do radar maior a distorção na tela. O jato aparecia na tela voando numa altitude que variava de 35.800 pés a 36.500 pés. Não estava, portanto, em rota de colisão. Como os controladores são substituídos a cada 1 hora e 59 minutos, o militar que monitorava o Legacy passou a missão para o seu substituto e avisou que ele deveria chamar o piloto americano. Foi o que o novo controlador fez, conforme registros do Cindacta-1, até que o controle repassou a supervisão do vôo para Manaus, porque o sinal estava ficando muito fraco. Chamando o Cindacta-4 pelo rádio, o operador de Brasília alertou que o piloto não estava respondendo, mas o Legacy voava no nível 360 (36 mil pés), conforme determinado no plano de vôo. Além dos contatos por rádio, a alternativa dos controladores seria acionar outras aeronaves próximas para que elas fizessem uma ponte de comunicação com o jato. ?Não houve tempo. No momento em que Brasília pediu para passar para a freqüência de Manaus é que aconteceu (o impacto)?, disse um perito da Aeronáutica. Então, o operador na torre de controle de Manaus teve a primeira indicação da tragédia: a imagem do Boeing na tela do radar ficou congelada, com a do Legacy sobreposta. Em seguida, o identificador do vôo da Gol sumiu e apareceu o do Legacy, o que significa que o transponder foi religado. Imediatamente, surgiu o registro de emergência, com os números 770. O Boeing, depois de sumir, ressurgiu perdendo altitude, antes de desaparecer definitivamente. Quando o transponder do Legacy foi desligado, ele estava a cerca de 300 quilômetros do Boeing. O Legacy voava a 820 quilômetros por hora, enquanto o Boeing vinha a 890 km/h. A velocidade de aproximação deles era de 1.600 km/h ou cerca de 20 quilômetros por minuto. Técnicos da Aeronáutica insistem em dizer que não houve erro no controle do operador de vôo, assim como estão convencidos de que o transponder do Legacy foi desligado, embora não consigam entender por quê. Como era o primeiro vôo do jato, especialistas acreditam que o piloto poderia estar fazendo testes de navegabilidade e queria fugir à supervisão das torres. A hipótese de falha humana ganha força porque no dia seguinte ao acidente foi feita uma reconstituição dos dois vôos. O teste com dois aviões Hawker HS 800 de alta performance não constatou nenhum problema nos radares ou na comunicação via rádio no trajeto.Bruno Tavares, Alberto Komatsu, Tânia Monteiro e Marcelo Godoy

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