Lixo acumulado nas ruas ampliou tragédia no RJ

Atual prefeito diz que administração anterior deixou 50 toneladas de lixo acumuladas

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Por Antonio Pita , Heloisa Aruth Sturm e Marcelo Gomes
Atualização:

RIO DE JANEIRO - O acúmulo de lixo em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, provocado pela falta de coleta regular nos últimos três meses, agravou os estragos causados pelo temporal da última quinta-feira, 3. No município, uma pessoa morreu, mil estão desalojadas (temporariamente fora de suas casas) e 276, desabrigadas (tiveram as casas destruídas). A força das águas destruiu 45 casas e outras 200 foram danificadas, segundo balanço divulgado nesta sexta-feira pela Defesa Civil do Estado.Segundo o prefeito Alexandre Cardoso (PSB), recém-empossado, a administração anterior, de José Camilo Zito dos Santos (PP), deixou 50 toneladas de lixo acumuladas. Dez toneladas foram retiradas nos dois primeiros dias do ano, mas as 40 restantes, com a força das chuvas da madrugada de quinta-feira, 3, se misturaram à lama e ao entulho que desceu dos morros e das casas destruídas, o que dificultou ainda mais a vazão das águas dos rios.O lixo, segundo Cardoso, prejudicou a dragagem, especialmente do rio Capivari, que inundou e causou grandes danos no distrito de Xerém. "Todo o sistema de drenagem está assoreado, pois entrou lixo nas galerias", afirmou o prefeito. A previsão da prefeitura é de que em 48horas todo o entulho seja retirado das ruas e "em no máximo cinco dias" toda a cidade esteja sem lama, para recomeçar o trabalho de drenagem. "O que aconteceu foi um alerta, poderíamos ter tido muito mais mortes."Derrotado na tentativa de reeleição em outubro passado, Zito tem sido procurado há vários dias pela reportagem do jornal O Estado de S. Paulo, mas não é encontrado. Na casa do prefeito, no bairro Doutor Laureano, um homem que não se identificou disse não saber quando o ex-prefeito estará de volta. No dia 20 de dezembro, agentes da Polícia Federal recolheram documentos e computadores na residência do político, investigado por suspeitas de desvio de verbas da saúde.Na tarde desta sexta-feira não havia lixo acumulado na calçada em frente à mansão de Zito, que fica em uma esquina. No entanto, montanhas de detritos se espalhavam em ruas próximas, inclusive na praça em frente à casa do ex-prefeito, onde há uma escola municipal. Em Xerém, os moradores relataram que, pela falta de coleta, muitos jogavam lixo nos rios. Nesta sexta-feira, além dos lixos, móveis e eletrodomésticos danificados pelas chuvas formam pilhas nas esquinas.O acúmulo de lixo também preocupa moradores e autoridades em função das doenças relacionadas à chuva. Agentes de saúde percorreram as casas orientando os moradores sobre as doenças. Nos postos de saúde e abrigos, a prefeitura distribuiu vacinas contra o tétano e difteria e produtos contra a proliferação de ratos, em alerta para um possível surto de leptospirose."Vim aqui pois estou muito preocupado com todo o lixo. Ele se mistura à lama e na água e para pegarmos uma doença é muito fácil", comentou o aposentado Carlos Martins, de 64 anos, na fila do posto de saúde. "Meu maior medo é com a leptospirose, mas não tem vacina e não querem distribuir o veneno pois têm medo de contaminação", contou.Belford RoxoEmbora sem a gravidade de Duque de Caxias, situação semelhante de coleta irregular repetiu-se na cidade vizinha de Belford Roxo. No dia 2 de janeiro, o novo prefeito, Dennis Dauttmann (PC do B), iniciou um mutirão para recolher 30 toneladas de lixo acumuladas nos últimos meses de 2012, ao final da gestão do prefeito Alcides Rolim (PT), que tentou a reeleição, mas nem chegou ao segundo turno.Segundo a Defesa Civil do Estado, a força das águas de Duque de Caixas chegou a Belford Roxo e provocou a inundação de rios e o alagamento de várias ruas, deixando mais de 500 desalojados e oito desabrigados. A assessoria de imprensa da prefeitura disse que os danos foram causados pela chuva e o volume excessivo de água, mas que não havia lixo acumulado nos rios. Segundo a prefeitura, 330 pessoas já tinham voltado para suas casas na tarde de ontem, mas foram alertadas para a possibilidade de novas chuvas.Tanto no caso de Duque de Caxias quanto de Belford Roxo, as administrações anteriores tinham contrato de limpeza urbana com a mesma empresa, a Locanty, a quem acusaram de ter interrompido o serviço. A Locanty, por sua vez, reclamava de falta de pagamento. Nenhum representante da Locanty foi localizado para explicar a falta de coleta regular nos dois municípios.MortesAs chuvas de quinta-feira, 3, causaram duas mortes no Estado do Rio: uma em Duque de Caxias e outra na capital. Na manhã de sexta-feira, foi encontrado o corpo de Roberto Magessi, de 49 anos, morto em consequência de um deslizamento na Estrada da Paz, no Alto da Boa Vista, zona norte do Rio. Segundo a Polícia Militar, Magessi verificava uma caixa d''água do prédio onde morava quando foi atingido por uma árvore e morreu antes da chegada dos bombeiros.Roberto era irmão da inspetora de Polícia Civil e ex-deputada federal Marina Magessi. Ela acredita que o acidente tenha ocorrido por volta da meia-noite. Segundo a policial, Roberto fez uma visita à irmã na noite de quinta-feira, 3, e, ao sair, disse que faltava água no edifício e pretendia conferir a caixa d'água quando chegasse em casa.Encontrado na madrugada de quinta-feira, 3, pelos bombeiros em Xerém, distrito de Duque de Caxias, Luiz Carlos da Silva, de 63 anos, foi identificado por amigos que foram ao Instituto Médico Legal (IML). As circunstâncias da morte de Luiz Carlos não foram esclarecidas.Há ainda um desaparecido em Duque de Caxias, o funcionário da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae) Enéas Paes Leme. Ele sumiu quando trabalhava em uma represa em Xerém, no momento da enxurrada. Enéas é casado e tem um filho. "Estamos procurando, temos de procurar, mas não temos mais esperança de um retorno", afirmou o cunhado da vítima, José Carlos Leme.IndenizaçãoApós se reunir com o governador do Rio, Sérgio Cabral, e com o ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra, o prefeito Alexandre Cardoso anunciou que, em caráter emergencial, cerca de 300 famílias que tiveram suas casas destruídas ou danificadas receberão até R$ 5 mil de indenização para compra de roupas, alimentos e colchões. O plano da prefeitura inclui ainda a recuperação das pontes, ruas e estradas danificadas. Os recursos, ainda sem valor estimado, serão liberados pelo governo federal em até 60 dias.Nesta sexta-feira, por toda a cidade os moradores limpavam casas e fachadas na tentativa de recuperar algum pertence e minimizar os estragos causados pela chuva. A comerciante Roseli Inácio, de 42 anos, e outros 11 comerciantes se uniram para limpar a rua e reabrir seus comércios. "A gente tem de se ajudar muito para tentar voltar à vida normal. Um depende do outro. As mulheres estão empenhadas nas igrejas, fazendo almoço e coletando donativos, enquanto os homens participam do mutirão de limpeza", afirmou.

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