Mais polêmica que sucesso em 10 anos de vida pública

Denise Abreu colecionou desafetos e frases infelizes nos 17 meses em que esteve na direção da Anac

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Por e Rodrigo Brancatelli
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Difícil, forte, teatral, autoritária, bem relacionada. Em menos de dez anos de vida pública, a advogada paulistana Denise Maria Ayres de Abreu, de 45 anos, colecionou mais adjetivos, apelidos, polêmicas e desafetos do que sucessos propriamente ditos. Foi justamente no auge da carreira, ao assumir a direção colegiada da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) por 17 meses, que ela consolidou sua fama. Formada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (foi colega de turma do deputado cassado José Dirceu na PUC, onde os dois se formaram em 1983), Denise foi procuradora do Estado e trabalhou por um breve período durante o governo Mário Covas na Secretaria de Administração Penitenciária. Prestou consultorias jurídicas na Junta Comercial do Estado, acompanhou processos de execução fiscal de empresas e atuou na área jurídica da extinta Fundação do Bem-Estar do Menor (Febem). "Ela sempre foi truculenta", diz o advogado Ariel de Castro Alves, coordenador do Movimento Nacional de Direitos Humanos, que teve vários atritos com Denise. "Não respeitava ninguém, costumava impedir advogado de entrar na Febem. Uma vez em 2000 eu fui com um relator da ONU na unidade de Franco da Rocha, e ela não nos deixou entrar. Ela queria mandar em tudo e em todos." Um ex-procurador que trabalhou com Denise na Procuradoria-Geral do Estado também critica a postura da advogada. "Na época em que ela estava na Febem, houve muitas denúncias dos internos de maus-tratos", diz. "Mas ela não apurava, colocava a culpa nos próprios internos. Do pouco contato que tive com ela, sei que defende com muita ênfase, mais do que o necessário, as instituições que ela representa." Seu cargo mais vistoso foi o de assessora e subchefe-adjunta da Subchefia para Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência, de 2003 e 2005, sob o comando do então ministro e seu amigo José Dirceu. Quando deixou o governo no escândalo do mensalão, Dirceu prometeu a Denise um cargo importante. Ele veio na forma de diretora da recém-criada Anac, que substituiu o Departamento de Aviação Civil - autarquia ligada ao comando da Aeronáutica. Mal assumiu e já ganhou a alcunha de "piloto sem brevê". Isso porque, embora tenha insistido que foi indicada para a diretoria por méritos profissionais, Denise nunca teve experiência para administrar o setor aéreo. Nas quatro páginas do currículo, aprovado em 15 de dezembro de 2005 pela Comissão de Infra-Estrutura do Senado, ela recheia sua biografia com vagas experiências, sem citar detalhes. Do tipo: "experiência burocrática e executiva", "experiência em assessoramento", e "experiência em negociações de risco". A bem da verdade, a "experiência" mais próxima com aviação está nessa citação: "participação em grupos de trabalho acerca do setor aéreo". A imagem de Denise perante as empresas aéreas não era muito diferente da retratada por seus pares. Por diversas vezes, protagonizou discussões acaloradas com executivos e integrantes do governo. Nos bastidores, sempre foi acusada de defender os interesses das companhias - fato reforçado pela descoberta de que o irmão dela, o advogado Olten Ayres de Abreu Júnior, havia prestado serviços para a TAM na Europa. "Apesar da personalidade forte, ela assumia as responsabilidades, enquanto os demais diretores ficavam atônitos", diz um executivo do setor. Na primeira crise, a primeira polêmica. Depois do acidente entre o Legacy e o Boeing da Gol, em setembro do ano passado, Denise teve de pedir desculpas aos parentes dos 154 mortos. De acordo com relatos de familiares das vítimas, ela teria reagido da seguinte forma quando abordada sobre a operação de resgate dos corpos: "Vocês são inteligentes, o avião caiu de 11 mil metros de altura, o que vocês esperavam? Corpos?" Um oficial da Força Aérea Brasileira (FAB) lembra que, após a entrevista, parentes das vítimas se recusaram a receber informações da Anac. "A declaração foi tão desastrosa que fomos obrigados a intervir." Em 30 de março deste ano, na mesma noite em que os controladores de vôo pararam os aeroportos do País, Denise foi flagrada pela reportagem do Estado fumando charuto na festa de casamento da filha de Leur Lomanto, também diretor da Anac, em Salvador. Participaram da celebração, além de dirigentes da Infraero, executivos da Varig, da BRA e da Gol. "Acho que o próprio ministro Waldir (Pires, demitido após o acidente da TAM) vai tomar a iniciativa de se retirar do governo", disse Denise para os colegas durante a comemoração. "Essa crise tem sido estressante para nós, que já não somos brotinhos, imagine para alguém com 80 anos de idade." Questionada na CPI do Apagão Aéreo do Senado sobre a festa em Salvador, Denise adicionou mais uma frase à coleção de aspas infames: "Fui exposta à nação como uma mulher insensível. Não fumo charuto. Nunca fumei charuto. (O ex-premiê britânico Winston) Churchill, sim, fumava charuto. Ele veio de família humilde e foi um grande estadista". Em tempo: neto do sétimo duque de Marlborough, Churchill vinha de uma das mais aristocráticas famílias britânicas.

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