Máscaras venezianas, uma aula e um futuro na Rocinha

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Por Agencia Estado
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Roberto Ramos Marques, de 19 anos, sempre morou na Rocinha e não fez vestibular porque tinha que trabalhar para ajudar a família. Mas, agora está desempregado. Ou melhor, estava porque, no mínimo, Roberto já tem um futuro: ?Quero ter o meu ateliê e trabalhar com carnaval e moda.? Roberto foi um dos alunos do curso do escultor italiano Guerrino Lovato, que criou as máscaras usadas no baile do filme De Olhos Bem Fechados, o último de Stanley Kubrick, voltou ontem para Veneza, terminado ontem. Foi uma sorte. ?Algumas pessoas sempre comentavam que eu deveria desenhar em vez de limpar o chão?, ele diz. ?Acho que eu já nasci com esse dom, mas ainda não tinha tido oportunidade. O Guerrino disse que começou a fazer máscaras com a minha idade e hoje tem 25 anos de profissão, que era para eu não desistir, apesar das dificuldades.? Roberto, durante o curso, recebeu R$ 50 por semana. No entanto, dos 50 alunos iniciais, disse ele, havia 36 ?realmente interessados, que não vieram só pelo dinheiro e o lanche?, concluíram o curso. Guerrino Lovato, voltou ontem para Veneza, após passar três semanas no Rio. Ele veio à cidade para ensinar o ofício a 50 alunos, todos eles moradores da Favela da Rocinha. As aulas foram dadas em um galpão alugado pela Casa de Cultura da Rocinha, financiadas pelo governo da região de Veneto por meio da organização não-governamental italiana Instituto para a Cooperação Econômica Internacional e os Problemas do Desenvolvimento (Iceps). Foi embora bem impressionado com a favela. ?Faço muitos cursos pelo mundo. Eu não conhecia a Rocinha. Nas andanças pela favela, para conhecer a comunidade e almoçar, vimos crianças armadas, mas a verdade é que as pessoas daqui já conhecem a gente e somos tratados com muito respeito?, disse Lovato, que trouxe da Itália o técnico Nonato Desimone para auxiliá-lo no curso. ?Tenho menos medo aqui na favela que nas ruas do centro. É tudo perfeito para nós, mas temos consciência de que isso acontece porque os traficantes sabem que estamos trabalhando pela favela?, disse Lovato. Mas haverá lembranças desagradáveis, também. ?O centro me desagradou, me passou uma sensação de perigo e abandono. Em vinte minutos, tentaram me roubar duas vezes, quando eu chegava ao Museu Nacional de Belas Artes (MNBL). Não uso nada de valor, me visto sempre assim, mas não adianta, tenho cara de turista mesmo, eu sei?, disse ele, de bermuda, camisa de malha e sapato artesanal de couro, sem meia. Ele também não gostou nada dos museus da cidade, dos quais criticou ?a falta de museus, com horários absurdos de funcionamento. Pior, só o Museu de Arte Contemporânea (MAC), em Niterói, projetado por Oscar Niemeyer: ?É um museu belíssimo por fora, sem nada para ver dentro.? Apesar de tudo, Lovato, que também é dono da loja de máscaras Mondo Novo Maschere, em Veneza, prometeu voltar quando o cooperativa estiver funcionando. ?Infelizmente, isso só vai acontecer se houver algum tipo de ajuda institucional. A Itália já pagou R$ 150 mil para trazer Lovato ao Brasil e financiar o curso, mas precisamos de um lugar para manter a cooperativa?, disse a representante da ong italiana no Rio, Margareth de Araújo. Segundo ela, todas as máscaras criadas durante o curso, inclusive algumas feitas por Lovato, como uma do Cristo Redentor, serão expostas no Hotel Intercontinental durante o carnaval.

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