Minha Casa Minha Vida tem denúncia de tráfico, milícia e invasão

Segundo maior número de relatos envolve ocupação de apartamentos - e, em grande parte, crimes estão correlacionados

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Por Tiago Rogero
Atualização:

RIO - Moradores de imóveis do programa Minha Casa Minha Vida, construídos com recursos do governo federal, denunciaram problemas com tráfico, atuação de milícias, invasões, venda ilegal de apartamentos e mesmo homicídios em pelo menos 16 Estados brasileiros. A venda de drogas é a ocorrência mais frequente: das 108 denúncias enviadas desde abril aos Ministérios da Justiça e das Cidades, 70% envolvem a presença de traficantes, que por vezes expulsam, agridem e até assassinam moradores. Depois do tráfico, o segundo maior número de relatos envolve a invasão de apartamentos (em grande parte das vezes, os crimes estão correlacionados), presente em 48% das denúncias. Em Rio Branco (AC), por exemplo, um morador do Residencial Rosa Linda, inaugurado em 2011, teria sido ameaçado e espancado, além de ter o imóvel invadido. As denúncias são anônimas. Em Rolândia (PR), no Parque Residencial José Perazolo, uma aposentada teria sido expulsa de casa por traficantes - e o apartamento transformado em boca de fumo.

A lista foi obtida pelo Estado no Ministério da Justiça, por meio da Lei de Acesso à Informação. As denúncias foram recebidas pelo grupo executivo criado em 8 de abril com o objetivo de “desenvolver ações integradas com órgãos de segurança sobre condutas ilícitas no âmbito de programas habitacionais instituídos pela União”. O Estado comprovou as denúncias em Itanhaém, Peruíbe e capital paulista. No ranking de irregularidades por Estado, São Paulo ocupa o quarto lugar: 10 denúncias, atrás de Minas e Rio, empatados com 18, e Bahia, na liderança, com 24. Só de um condomínio de Salvador, o Residencial Pirajá, com 340 apartamentos e inaugurado em março de 2012, partiram sete relatos, relacionados principalmente ao tráfico. No Rio, o maior problema é a milícia. Três denúncias apontam o Condomínio Ferrara, em Campo Grande, na zona oeste. Em agosto, a Polícia Civil prendeu 21 supostos integrantes de uma quadrilha que faturava R$ 1 milhão por mês com a cobrança de taxas, venda e aluguel de imóveis em seis condomínios do Minha Casa Minha Vida, entre eles o Ferrara. Quem não cumpria as ordens era expulso. Se voltasse, era espancado ou morto. Denúncias envolvendo a atuação de milícias representaram 10% do total. A prostituição dentro de condomínios foi informada em 8% dos relatos.

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Resposta. O Grupo Executivo criado pelos Ministérios da Justiça e das Cidades para receber as denúncias já chegou a uma conclusão sobre as invasões aos condomínios, seja pelo tráfico ou pela milícia: têm relação com os locais onde são construídos os imóveis, considerados "áreas de vulnerabilidade". A escolha cabe às construtoras, que em geral optam pelo local mais barato e oferecem o projeto à Caixa, que então concorda ou não com a construção.

Segundo a secretária Nacional de Segurança Pública, Regina Miki, coordenadora do Grupo, "ouvir a área da segurança pública é fundamental não só quando os prédios estão prontos, mas também no 'desenho'". "Precisamos acompanhar o processo desde o início", disse Regina. 

De acordo com a secretária, todas as denúncias foram encaminhadas aos setores de "inteligência" das secretarias de Segurança dos Estados. "Em muitas delas, já houve prisões. Há outras ainda em investigação e também algumas que não procedem", disse. "Mas isso não quer dizer que o MCMV não esteja trazendo benefícios para a população: o empreendimento é um sucesso. Problemas de relacionamento existem até em condomínios de luxo."

São 7,6 milhões de pessoas beneficiadas, de acordo com o Ministério das Cidades, num investimento total de R$ 241,3 bilhões. "Mesmo com os problemas, é o maior investimento já feito até hoje na construção de moradias no País", disse o sociólogo Paulo Magalhães, do IETS.

Segundo a secretária Nacional de Habitação do Ministério das Cidades, Inês Magalhães, é preciso tomar cuidado para não estigmatizar os condomínios do MCMV como territórios com índices de criminalidades maiores que no restante do município. 

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"A milícia no Rio, por exemplo, não é um problema exclusivo dos conjuntos, assim como o tráfico. Dá muito trabalho tirar um estigma depois que ele se instala", afirmou. "O que temos feito é reforçar o trabalho com as famílias, para que tenham acesso a serviços que não tinham antes. Também viabilizamos um canal de denúncias e estamos sensibilizando as autoridades para que possam ter um olhar especial sobre os conjuntos, justamente porque as famílias estão formando uma nova comunidade e precisam do apoio do poder público."

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