PUBLICIDADE

Ministro contradiz Bolsonaro e prevê mais 4,2 mil pontos com radar no País

Número já considera restrições orçamentárias e acordo feito com a Justiça após declarações do presidente contrárias à instalação de mais aparelhos; edital com 8 mil trechos não foi revogado, ao contrário do que Bolsonaro deu a entender em março

Por Patrik Camporez
Atualização:

BRASÍLIA - Contrariando declarações recentes do presidente Jair Bolsonaro, um documento assinado pelo ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, encaminhado à Câmara dos Deputados, informa que, de um total de 8 mil trechos licitados, 4.204 pontos devem começar a ser monitorados por radares do governo ainda em 2019. Os contratos citados fazem parte de um edital de 2016, publicado na gestão do ex-presidente Michel Temer, que dividia as rodovias em 24 lotes, 18 licitados até o início deste ano.

No documento de dez páginas, Tarcísio de Freitas promete dar prioridade a pontos críticos e ressalta que a instalação tem base técnica Foto: HÉLVIO ROMERO/ESTADãO

As empresas contratadas deveriam fazer a instalação dos radares, a um custo total de R$ 1 bilhão. Mas no início do governo o presidente contestou a instalação. “Após revelação do @MInfraestrutura de pedidos prontos de mais de 8.000 novos radares eletrônicos nas rodovias federais do País, determinei de imediato o cancelamento de suas instalações. Sabemos que a grande maioria destes tem o único intuito de retorno financeiro ao Estado”, publicou o presidente em sua conta no Twitter no dia 31 de março. “Demos um golpe na indústria da multa e ainda economizamos.”

PUBLICIDADE

Preocupado com o teor das declarações do presidente, o deputado Ivan Valente (PSOL-SP) cobrou explicações ao ministro da Infraestrutura, que enviou resposta no dia 11 de junho.

No documento, Freitas diz que, “considerando o contingenciamento orçamentário, ficou demonstrada a possibilidade de monitorar, no exercício de 2019, 4.204 pontos. Nesse cenário, haverá priorização dos pontos de maior criticidade”, diz. No caso, também se explica que não há nenhum veto à instalação dos demais aparelhos.

No texto de dez páginas enviado à Câmara, o ministro defende a importância dos radares para a redução de acidentes e mortes nas vias federais. Mas ressalta que nem sempre o aparelho é a melhor alternativa para reduzir acidentes. Segundo o documento, uma alternativa possível, conforme critérios técnicos, é eliminar ou substituir radares por manutenção da via, adequação do traçado da pista, melhoria da sinalização horizontal e vertical, implementação de passarelas e iluminação. 

O ministro diverge do presidente ao dizer que uma possível redução do total de radares, caso ocorra, será por causa do contingenciamento orçamentário da União e critérios técnicos. Bolsonaro alega a existência de uma “indústria das multas”.  “É importante ressaltar que a definição da localização de radares em rodovias federais é uma questão puramente técnica e tem base na avaliação de segmentos críticos, ou seja, definidos em função dos registros de acidentes e da probabilidade de novas ocorrências”, afirma o documento do ministro. 

Freitas acrescenta, ainda, que o Dnit tem celebrado contratos decorrentes do edital firmado em 2016, mas a execução integral pode esbarrar na situação fiscal do País. “Por isso se faz necessária uma avaliação dos pontos críticos, onde os acidentes são causados por excesso de velocidade.”

Publicidade

Justiça

Procurado, o Planalto encaminhou a demanda ao Ministério da Infraestrutura, que o repassou ao Dnit. O departamento informou que está para ser homologado um acordo entre Ministério da Infraestrutura, Ministério Público Federal e o próprio departamento que permitirá a instalação de radares (em menor número) nos pontos mais sensíveis, prioritariamente em áreas urbanas. 

Segundo o órgão, o novo número de radares (sem citar a quantidade) “está coerente com a disponibilidade orçamentária do Dnit para tal finalidade”. “Caso o acordo seja efetivamente homologado, o Dnit entende que o assunto está concluído em relação ao planejamento para 2019, restando apenas sua execução, conforme os termos previstos na negociação”, diz o órgão de trânsito. 

Segundo o Dnit, tal acordo envolve decisão judicial de 10 de abril, da 5.ª Vara Federal Cível de Brasília, que determina que o governo se abstenha de retirar radares das rodovias e impõe a renovação, em caráter emergencial, de contratos com concessionárias que fornecem os medidores de velocidade. A magistrada atendeu a uma ação popular movida contra a União após as declarações de Bolsonaro no Twitter.

O número de aparelhos a ser instalado, porém, é menor do que o previsto no documento enviado à Câmara. O acordo envolveria cerca de mil aparelhos e dois mil trechos, em um prazo de dois meses.

Entre 2012 e 2018, o total de acidentes em rodovias federais caiu de 184 mil para 69 mil. Já as mortes recuaram de 6.987 para 4.496 no mesmo período. 

Motoristas ficam entre aprovação e crítica a excessos

Publicidade

Em um mês, o motoboy Victor Eduardo Bueno, de 22 anos, acumulou R$ 600 em multas por excesso de velocidade aplicadas por radar. O estudante de Medicina lsner Gonzaga, de 26 anos, também cometeu infrações do mesmo tipo - quatro - em um mês. O uso dos equipamentos, porém, divide os motoristas: Bueno vê abusos do governo e Gonzaga reconhece a importância da fiscalização. 

O motoboy vive em Sorocaba (SP), mas costuma pegar estrada por causa do emprego. “De casa ao trabalho, são quatro quilômetros e três radares fixos, além de sempre ter um móvel. É um exagero e não resolve”, critica. Ele apoia a queixa de Bolsonaro sobre os radares. “Não se importam se estou correndo ou não. Só querem pegar meu dinheiro”, diz ele, que já quebrou a perna e ficou internado em um acidente de trânsito. 

Em altaBrasil
Loading...Loading...
Loading...Loading...
Loading...Loading...

Já Gonzaga, também de Sorocaba (SP), costuma dirigir cerca de 380 quilômetros na estrada para visitar a família. “Sei que as rodovias têm muitos radares e ando dentro do limite. Se passei e fui multado, é culpa exclusiva minha”, diz. “Já percebi que não compensa correr, o ganho de tempo é pequeno demais comparado com o risco.”

Redução de risco

De acordo com o consultor de engenharia de tráfego e transportes Horácio Augusto Figueira, os radares ajudam a reduzir acidentes de trânsito. “Está provado que, onde houve a retirada de radar, aumentou o número de acidentes graves”, alerta.  Figueira não vê como comparar a situação do Brasil com o de países da Europa, onde a velocidade é livre em certas autopistas. “Não é só a questão das estradas, que lá são melhores. Enquanto não evoluirmos como motoristas, não entendermos os riscos, será preciso ter o policial, o radar, o drone, até o satélite para monitorar a velocidade”, afirma. /COLABOROU JOSÉ MARIA TOMAZELA

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.