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Músico de carteira assinada, aos 93 anos

Seu Juca passou no concurso para ensinar no conservatório de Tatuí

Foto do author José Maria Tomazela
Por José Maria Tomazela e SOROCABA
Atualização:

Se mesmo para os mais jovens é difícil conseguir emprego nestes tempos de crise, imagine para uma pessoa com mais de 90 anos de idade. Pois José Teixeira Barbosa, o seu Juca, de Tatuí, região de Sorocaba, se orgulha de ter conseguido trabalho com carteira assinada aos 93 anos. Ele passou num processo seletivo em março e foi contratado para dar aulas de clarinete no Conservatório Dramático e Musical Doutor Carlos de Campos. Seu Juca é o empregado mais idoso do Brasil, segundo o Ministério do Trabalho. A carteira de trabalho do aposentado foi assinada no dia 11 de março. De lá para cá, três vezes por semana ele chega à escola dirigindo seu carro, assina o livro de ponto e, em pé, assiste à entrada dos alunos na sala de aula. O músico foi contratado pela Associação de Amigos do Conservatório, uma organização da sociedade civil criada para fornecer mão de obra à escola de música, que é vinculada à Secretaria de Estado da Cultura. Apesar de sua experiência, o professor de clarinete teve de disputar o posto com dezenas de outros pretendentes. A escola é uma das mais concorridas do País. "Não foi fácil, não, pois tive de fazer prova e passar por entrevista", conta. O conservatório de Tatuí tem 190 professores, 170 músicos e 50 funcionários da administração. Muitos dos atuais professores foram alunos de Barbosa, que já soma 38 anos como professor no estabelecimento, mas não era registrado. Até o fim do ano passado, ele trabalhava na condição de associado de uma cooperativa. A prestação de serviços foi considerada irregular e o conservatório decidiu abrir concurso. Quando soube que precisava passar pelo processo de seleção, seu Juca até pensou em desistir. "Fiz uma cirurgia no peito e me puseram uma ponte de safena", conta. Na escola, já se falava em um substituto para o velho mestre, quando ele apareceu avisando que iria concorrer. "Ainda não é hora de parar", dizia. Nas provas, desbancou músicos até 60 anos mais jovens, segundo a administração. Barbosa toca clarinete há 70 anos e chegou a fundar uma orquestra para animar bailes. Já foi professor de trabalhos manuais em colégios de São Paulo e se aposentou como diretor de escola, mas nunca parou de trabalhar. "Reduzi um pouco o ritmo, pois agora só dou aula três vezes por semana." Ele disse que saberá quando for a hora de "pendurar o clarinete". A direção da escola o considera "um patrimônio artístico". O professor Max Eduardo Ferreira, spala da Banda Sinfônica do Conservatório, diz que se trata de um mestre das antigas. "É rígido e exigente, mas fora da sala de aula é um doce." O aluno Pedro Augusto Coutinho, de 17 anos, confirma. "Se não se preparar para a aula dele, você passa vergonha na classe." Mas seu Juca anda um pouco preocupado. Terá de renovar a habilitação em outubro e teme o exame médico. Um dos ouvidos deu de falhar e ele precisou recorrer a um aparelho. Coutinho, porém, diz que ele escuta muito bem. "É só errar uma notinha que ele manda parar no ato." O subdelegado do Ministério do Trabalho na região, Vitório Cattai, não encontrou registro de outro trabalhador que tenha sido contratado após os 90 anos. As contratações de maiores de 65 anos deixam de ser contabilizadas por faixa etária no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), por se supor que, nessa faixa, as pessoas já estão aposentadas. "Ele é um caso raro, se não for o único no Brasil", disse Cattai. FRASES Vitório Cattai Subdelegado do Trabalho "Ele é um caso raro, se não for o único no Brasil" Pedro Coutinho Aluno "É só errar uma notinha, que ele manda parar"

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