Na selva, os fragmentos do Boeing da Gol

Reportagem sobrevoa clareiras onde estão destroços do Boeing

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Por Agencia Estado
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Parece o mar, mas é verde. Aquele verde vivo que, sabem bem os artistas plásticos, é a cor que mais expande nos olhos. Cerca de 30 metros acima das copas das árvores da Reserva do Xingu, em Mato Grosso, a visão é de uma imensidão que, de perto, parece ser impenetrável e, de longe, se mistura com o céu. O Estado sobrevoou ontem, num helicóptero Super Puma, da Força Aérea Brasileira (FAB), o local onde caiu o Boeing 737-800 da Gol no dia 29, deixando 154 mortos. O helicóptero demorou um minuto para passar sobre as áreas descampadas onde se cria o gado nelore da Fazenda Jarinã, no município de Peixoto de Azevedo (MT), base de apoio da missão de busca e salvamento da FAB. Dali para a frente, a selva. De cima, não se vê o chão. Cerca de 10 minutos depois da decolagem, pequenos pontos brancos despontaram como as primeiras marcas da tragédia. Ao se desintegrar no ar, o gigantesco e sofisticado Boeing 737-800 espalhou-se pelas copas das árvores em pedaços que parecem cascas de ovos. No início da operação, a Aeronáutica procurava destroços numa área de 20 quilômetros quadrados. Essa área foi reduzida, mas a distância entre os fragmentos ainda é grande. Em linha reta, no sobrevôo, foi como se houvesse alguns pedaços no início da Avenida Paulista e outros só no final. A operação abriu na mata uma clareira grande, perto do trem de pouso e de parte do corpo do avião, e outras quatro clareiras menores, onde estão a cabine, a cauda e o motor e outras partes. Cerca de 40 metros abaixo das copas, no chão, o branco é a cor da capa protetora dos peritos. O trabalho deles, como o dos militares, é lutar contra o tempo para evitar que a mata cubra os corpos com folhas e terra e para encontrá-los ainda com chance de serem identificados por impressão digital. Os corpos são içados das clareiras menores até a principal, e de lá para a Jarinã. Na fazenda, ficam num caminhão frigorífico antes de embarcar para Brasília. O Estado apurou que a FAB e a Gol negociam com o dono a compra da câmara frigorífica, porque ela não poderá mais transportar carne. Além de espinhos, abelhas e calor, a equipe de resgate tem de suportar o forte odor dos corpos em decomposição, sentido até de dentro do helicóptero, na clareira principal, onde tremula uma bandeira do Brasil. Havia 150 militares na Jarinã, quase todos da FAB, e ontem chegaram mais 80 do Exército. Em terra também se confundem os laranjas. Primeiro, o da logomarca da Gol, registrado em algumas peças do Boeing localizadas na selva. Depois, aquele reconhecido como cor internacional de busca e salvamento, estampado nos bonés dos homens do Para-Sar, tropa de elite da FAB, que comanda o resgate. Começo e fim de um mesmo ciclo.

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