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Assassinatos de jovens até 19 anos dobram no País desde o ECA

Segundo Unicef, entre 1990 e 2013, nº de crianças e adolescentes mortos passou de 5 mil para 10,5 mil - ou 28 homicídios por dia

Por Lisandra Paraguassu
Atualização:

BRASÍLIA - Nos últimos 25 anos, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) permitiu diversos avanços na proteção da infância no Brasil, da redução da mortalidade até cinco anos à inclusão de mais crianças na escola. Não conseguiu, no entanto, fazer com que os jovens deixassem de ser o alvo principal das mortes violentas no País - ao contrário. Dados levantados pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef, na sigla em inglês) mostram que, entre 1990 e 2013, o número de assassinatos de crianças e adolescentes até 19 anos passou de 5 mil para 10,5 mil por ano - 28 por dia. 

"O Brasil não tem conseguido impedir o alarmante crescimento de assassinatos dos seus adolescentes", diz o relatório do Unicef feito em comemoração aos 25 anos do estatuto, que tem entre suas previsões a garantia à vida. "No entanto, após a aprovação dessa lei, o número de homicídios de brasileiros até 19 anos dobrou."

Enterro da estudante Caroline Silva Lee, de 15 anos, assassinada durante um assalto em Higienópolis, na região central de São Paulo, em outubro de 2012 Foto: Paulo Liebert/Estadão

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Dos adolescentes que morrem por causas externas, 36% são assassinados, mas de sete vezes o índice da população em geral e um número que transforma o Brasil em vice-campeão mundial no assassinato de jovens - perde apenas para a Nigéria.

Os jovens mortos têm cor, gênero, classe social e endereço: são pobres, moram na periferia das grandes cidades, são homens e negros. Ser homem aumenta em 12 vezes a chance de um adolescente ser assassinado. Os negros morrem quase quatro vezes mais do que os brancos.

O retrato traçado pelo Unicef encontra correspondência com a imagem do jovem Douglas Eduardo Silva da Conceição, de 13 anos, assassinado no ano passado em São Paulo. Morador do limite entre a capital e Diadema, no ABC paulista, Douglas acumulou recorrentes casos de abusos desde a infância e acabou aliciado para trabalhar para traficantes da região. Viciado em maconha e crack, roubou para sustentar o vício, mas acabou pego e sendo violentamente agredido e morto por vizinhos.

“Ele me falava para ajudá-lo, que ele queria sair dessa, se tornar bancário, tocar a vida dele. Ainda sonho com o dia em que ele vai chegar aqui na minha porta e falar que foi um engano, que não foi ele quem morreu. Mas não tem jeito”, lamentou a mãe do garoto, a auxiliar de serviços gerais Maria Cristina da Silva, de 43 anos.

Maioridade. O Unicef defende que a culpabilização dos adolescentes, verificada nas proposta de redução da maioridade penal aprovada pela Câmara dos Deputados, é um retrocesso que não vai resolver o problema da violência no Brasil, mas, sim, agravá-lo.

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"O sistema penitenciário adulto brasileiro é mundialmente conhecido por seus graves problemas", lembra o relatório. "Nesse sistema, os adolescentes estarão expostos às facções do crime organizado e às precárias condições do sistema prisional brasileiro."

O relatório elogia a criação os avanços trazidos pelo ECA na punição de jovens infratores dentro de parâmetros adequados à idade. No entanto, lembra que muitas das medidas não funcionam porque até hoje o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase) não foi implementado adequadamente, com unidades de internação superlotadas e em condições insalubres, falta de projetos pedagógicos e o uso de internação, que deveria ser uma medida extrema, como padrão.

"Em 2012, 30 adolescentes morreram em unidades de internação", informa o estudo, mostrando o que é classificado de "fragilidade da implementação do sistema".

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Depois de 25 anos, analisa o Unicef, o ECA permitiu e ajudou o avanço em diversas áreas de proteção da infância. Superou as metas de redução de mortalidade infantil, chegou próximo de assegurar a matrícula de 100% das crianças no ensino fundamental, garantiu a vacinação, o atendimento à saúde, o acesso à alimentação com a implantação do Sistema Único de Saúde (SUS) e programas como o Bolsa Família. 

Ainda assim, o sistema de proteção não alcança grupos consideráveis de crianças, especialmente as indígenas, destacadas no relatório como o grupo onde a mortalidade infantil, a desnutrição, a falta de registro e de acesso à escola ainda é muito maior do que o aceitável. / COLABOROU MARCO ANTÔNIO CARVALHO

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