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NY também não é mais a mesma

Restrição a bares e clubes e o alto custo de vida fizeram noite da metrópole ficar mais sonolenta

Por Camila Viegas-Lee
Atualização:

Depois de uma década em dormência, Nova York perdeu o título de melhor vida noturna do mundo e entrou em coma. Registrada em filmes como Party Monster, com Macaulay Culkin, a ''''cidade que nunca dorme'''', com memoráveis festas ''''after-after hours'''' - começando às 5 horas -, ficou para trás. ''''Nova York não é mais a mesma'''', diz Marivaldo dos Santos, percussionista brasileiro do grupo Stomp há dez anos. ''''Ela está roncando'''', diz Brie, drag queen do restaurante e bar Lucky Cheng''''s há 13 anos. Quando a questão é levantada, a resposta vem em uníssono: Nova York está cara demais. ''''Não dá mais para alugar uma loja, ter seu ateliê na frente e morar nos fundos, como se fazia no East Village no início dos anos 90'''', explica Dan Safer, ex-dançarino e professor de performance, direção e coreografia da New York University. ''''Hoje um estúdio barato para ensaiar custa US$ 25 por hora. É difícil produzir aqui.'''' A vida noturna de Manhattan começou a adormecer nos anos 90, durante a gestão do prefeito Rudolph Giuliani. Cardeal do Partido Republicano, Giuliani ficou conhecido pelos programas de ''''tolerância zero'''', que reduziram significativamente o crime na cidade, varreram a prostituição da Time Square, limitaram as feiras públicas e ''''sanearam'''' a boemia do downtown. Um dos instrumentos que Giuliani usou para fechar festas e clubes noturnos foi a arcaica licença de cabaré. Desde 1926 é ilegal dançar em bar ou restaurante que não for licenciado, mas a lei não vinha sendo colocada em prática havia décadas. E, de repente, a policia deu um arrastão na cidade, fechando todos os bares em que houvesse alguém se mexendo ao ritmo de uma música. ''''Só aqui e no Afeganistão'''', diz Safer. ''''Mesmo que sua música preferida do David Bowie começasse a tocar no juke-box do bar onde você está tomando uma cerveja, você teria de ficar sentado. Se levantasse, o bar corria o risco de ser fechado pela prefeitura'''', diz Safer. Garçons passavam a noite pedindo para que seus clientes permanecessem sentados. Hoje, o Avalon, um clube noturno que entrou para a história depois de substituir o audacioso Limelight, corre o risco de virar um minishopping center. O Roxy, conhecido pelas festas gays com DJs famosos, como Junior Vasquez e Johnny Vicious, ficou fechado por várias semanas no segundo semestre do ano passado, reabriu em dezembro, mas não resistiu e fechou definitivamente este ano. ''''Nos últimos 15 anos, o número de licenças de cabaré na cidade caiu mais de 20%'''' , diz Robert Bookman, advogado da Associação da Vida Noturna de Nova York (New York Nightlife Association). Para Nicolai Ouroussoff, crítico de arquitetura e urbanismo do jornal The New York Times, a política de Giuliani ajudou a transformar a natureza da cidade. ''''A segurança trouxe de volta a classe média, que estava morando no subúrbio desde as lutas de direitos civis dos anos 60 e 70. E com ela vieram valores suburbanos de segurança, homogeneidade, limpeza e conservadorismo'''', diz. ''''Hoje, as pessoas estão mais interessadas em estudar a história do que se engajar na vida contemporânea e seguir em frente.'''' O crítico dá como exemplo a luta do Whitney Museum para construir uma nova sede downtown. ''''É risível pensar que Nova York foi a cidade vertical original e ergueu edifícios como o Empire State e o Rockefeller Center.'''' Nova York, segundo Ouroussoff, ainda é excelente para o consumo da arte de elite. ''''Se você for rico e quiser freqüentar festas de gala e galerias de arte, aqui é fantástico.'''' Ao mesmo tempo que ex-clubbers lembram das festas com nostalgia, reconhecem o lado bom de sua proibição. ''''Gosto de saber que minha namorada não vai ser estuprada quando voltar a pé para casa à noite'''', diz Safer. Para Trixie, drag queen barista do Lucky Cheng''''s, Nova York ainda vai acordar. ''''É como um pêndulo. Uma hora os tempos dourados desta cidade voltam.''''

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