Orlando Silva, John Lord e Dilma Rousseff

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Existe em São Paulo uma Rua João Guimarães Rosa, discretíssima, dois quarteirões apenas, um deles sem saída. Enquanto temos uma Doutor Arnaldo inteira dedicada a este doutor Arnaldo, Guimarães Rosa padece na lateral desprestigiada da Praça Roosevelt, ligando pedestramente a Consolação à Augusta. É uma rua superlativa na sua feiúra. Principalmente a parte ladeada pela porção superior do túnel onde desembocam os carros vindos do Minhocão. Aos domingos acontece lá uma feira de hortifrutigranjeiros. Pelas aberturas na parede do túnel é possível arremessar uns tomates lá embaixo. Aos sábados, porém, a Rua Guimarães Rosa é uma beleza: ali se localiza a melhor roda de samba do mundo. Chama-se Você Vai se Quiser. No sábado retrasado, quem quis foi o ministro Orlando Silva, que lá estava arrastando suas sandálias de couro. Só no sapatinho, e já de posse da minha cerveja com gelo (drink muitas vezes necessário), colei no ministro com a má intenção jornalística de escutar alguma impropriedade. Devo até tê-lo feito. Mas no dia seguinte não me lembrava de nada. Roda de samba é como terreiro de candomblé: você vai naquela batida do atabaque e de repente o santo baixa. A diferença é que além da percussão tem os instrumentos de corda - e cerveja, caipirinha, caipiroska. O resultado é um êxtase coletivo, ninguém é de ninguém, laiá laiá e vamo que vamo. Foi por essas alturas aí que eu colei no ministro: "Você vem sempre aqui?" Não é que ele vinha mesmo?! E desde os tempos do Butantã, quando a roda se reunia em torno de um intérprete especial, o Chico Aguiar, médico do HC, professor da USP e pesquisador do samba. Com a falência do Bar do Bilu, vizinho do famoso Rei das Batidas, dois freqüentadores endinheirados levaram a roda para um estacionamento no Itaim, em 2002. Um deles era o empresário Roberto Suplicy, irmão do senador e dono do saudoso Supremo Musical, nos Jardins. Embora a roda tenha sido batizada como Traço de União, o Chico, de família quatrocentona, não agradou muito da elitização que se deu, desunindo-se com parte do grupo. É dessa dissidência que nasceu o Você Vai se Quiser, capitaneado hoje pelo técnico em eletrônica José Alfredo, o Paqüera (um dos fundadores do Samba da Vela) e pela poderosa intérprete Graça Braga, funcionária pública lotada na Corregedoria-Geral da Justiça, e por isso conhecida também como "a musa do Judiciário". Roda de samba é como uma família cheia de parentes. Só que melhor: você conhece todo o mundo apenas mais ou menos. Para efeito de identificação a terceiros, conferem-se então uns apelidos. Na rodinha da Rua Guimarães Rosa tem o Bruninho Chateaubriand, sempre com a camisa do São Paulo. Dilma Rousseff, a presidenta. John Lord, roqueiro e técnico de som. Zé Bonitinho, o cabeleireiro. E há o ministro dos Esportes, Orlando Silva, esse de verdade. Pelo menos foi o que me pareceu àquela altura do campeonato.

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