Passe serviria de incentivo a quem busca trabalho

Falta de dinheiro para transporte tira motivação de desempregados: ''Você já chega à empresa para baixo''

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Por Vitor Hugo Brandalise
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A preocupação com o dinheiro do transporte, para desempregados que vivem longe dos principais centros de trabalho da capital, se materializa de diversas formas: mais aperto no fim do mês, valor contado até os centavos em recargas do bilhete único, vergonha de pedir dinheiro emprestado para pagar a condução. Entre quem passa o dia procurando emprego, aliás, passar pela última situação - apelar a um terceiro para juntar as moedinhas - é problema invariavelmente classificado como "humilhação". "A jornada já começa humilhante. Quando tem de apelar para o irmão, vizinho ou cunhado para conseguir o dinheiro do ônibus, você já chega à empresa, à agência de empregos, se sentindo pra baixo", conta a costureira Rosemari Fernandes, de 46 anos, desempregada desde junho do ano passado. "Já aconteceu de desistir de procurar num dia, porque não tinha nada para a condução." Ao menos três vezes por semana, de Sapopemba, na zona leste, até o Brás ou Bom Retiro - principais redutos empregatícios do setor na cidade -, Rosemari pega dois ônibus para ir, mais dois para voltar. Gasta cerca de R$ 50 por mês em condução para buscar um novo emprego. "É muito, para quem vive de bicos (cerca de R$ 150, costurando para vizinhos). Aí não tem jeito, tem de pedir emprestado", afirma. "Se isso (passe livre) funcionar, vai dar ânimo para continuar procurando." Desde o dia 18, quando foi comunicado oficialmente pela Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social, o Sindicato das Costureiras de São Paulo realiza cadastramento para descobrir quantos são os trabalhadores atualmente desempregados. A estimativa da entidade é de que o número de beneficiados da categoria chegue a 2,4 mil trabalhadores. "Para quem não tem emprego, qualquer ajuda já é bem-vinda", disse o metalúrgico Alexandre Souza, de 30 anos, desempregado desde novembro - foi uma das vítimas da crise financeira, que atingiu a empresa onde trabalhava com a demissão de 30% dos empregados. "Vai pelo menos uns R$ 40 por mês em ônibus. Já dá para melhorar um pouquinho", diz Souza, morador da Parada Inglesa, na zona norte. Por dia, ele faz ao menos duas viagens de ônibus. No Sindicato dos Metalúrgicos - categoria mais numerosa entre as beneficiadas, com 260 mil filiados -, os trabalhadores também serão cadastrados e a informação já começou a circular em boletins. Trabalhadores de indústrias de brinquedos, setor atingido por fatores sazonais - as empresas costumam realizar demissões em massa após o Natal, por exemplo -, também comemoraram a decisão. "Fui demitida em janeiro com outras 30 pessoas, 70% de todos os empregados", afirma Jaqueline Silva, de 27 anos, que trabalhava numa fábrica de brinquedos e mora em Anália Franco, na zona leste. "Não parei de procurar. Como tudo é longe, a melhor maneira é o ônibus mesmo. Acho que isso vai ajudar muita gente a voltar ao mercado."

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