Pilotos deixam de relatar situações de risco, por medo de ações judiciais

Para Cenipa, criminalização de acidentes fez notificações caírem de 90, no ano passado, para 9, em 2008

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Por Bruno Tavares
Atualização:

A criminalização dos dois maiores acidentes aéreos da história do País - a colisão entre o jato Legacy e o Boeing da Gol, em 2006, e a tragédia com o Airbus da TAM, no ano passado - fez despencar o número de relatórios confidenciais para a segurança de vôo (RCSV) encaminhados por tripulantes à Aeronáutica. O Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) recebeu 9 notificações neste ano, ante as 90 registradas em 2007. A emissão do RCSV não é obrigatória, mas se tornou uma das principais ferramentas de que os militares do Cenipa dispõem para elaborar planos de prevenção. Embora possam ser anônimos, não é difícil identificar o emissor do documento. ''Quando um tripulante elabora um relatório e depois vê aquilo sendo usado judicialmente, ele se sente inibido e deixa de colaborar'', disse ontem o chefe do Cenipa, brigadeiro Jorge Kersul Filho. ''Não estou dizendo que a Justiça não deve investigar, mas nossas ações devem correr em paralelo.'' A legislação sobre o assunto veta a utilização de RCSV ''para relato de fatos que constituam crime ou contravenção penal de qualquer natureza''. Na prática, porém, as notificações têm servido como prova em ações tanto na esfera cível quanto na criminal. Também há temor por parte das empresas de que ocorrências consideradas corriqueiras, como uma arremetida, causem pânico entre passageiros e parem em CPIs. ''Essa exposição desmedida jogou no lixo um trabalho de mais de 30 anos da FAB. Agora, será difícil reverter essa desconfiança dos tripulantes'', diz Ronaldo Jenkins, diretor do Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias (Snea). O primeiro sintoma de que tripulantes e companhias haviam criado resistência aos relatórios surgiu após o acidente da Gol. De 2005 para 2006, o número de RCSVs caiu 76% (de 159 para 38).

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