PM que fuzilou menino é absolvido

Por 4 votos a 3, júri considera que policial agiu ?no cumprimento do dever?; decisão revolta família e governador

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Por Clarissa Thomé
Atualização:

Por 4 votos a 3, o 2.º Tribunal do Júri entendeu que o cabo da Polícia Militar William de Paula, que atirou no carro em que estava o menino João Roberto, morto aos 3 anos, em julho, agiu no "estrito cumprimento do dever legal". Ao acatar a tese da defesa, os jurados o absolveram do crime de homicídio duplamente qualificado (com uso de arma de fogo e sem chance de defesa). Ele foi condenado a prestar 7 horas diárias de serviços comunitários, por um ano, por lesão corporal leve à mãe de João, Alessandra Amorim Soares, ferida por estilhaços, e ao irmão, Vinícius, que teve lesão no ouvido. A decisão revoltou parentes do menino e até o governador, Sérgio Cabral. "Estou chocada. Meu filho morreu em vão. Houve dolo (intenção). Ficou comprovado que houve dolo. (Para os jurados) Ele (o PM)cumpriu o dever dele: matou o meu filho", reagiu Alessandra, chorando muito. Apesar da revolta, o taxista Paulo Roberto Soares, pai do menino, disse que ainda confia na Justiça. "Não podemos aceitar o que aconteceu hoje. É um absurdo dizer que a pessoa estava no cumprimento do dever. Matar uma criança de 3 anos, quase matar minha mulher e meu outro filho e sair daqui impune, estar nas ruas de novo, isso não pode acontecer. Acredito até o fim na Justiça", afirmou. O advogado Nilo Batista, que atuou como assistente da acusação, classificou a decisão do corpo de jurados, composto por uma mulher e seis homens, de "monstruosa". "Eles estabeleceram que existe uma pena de morte para o roubo de carros e deve ser cumprida pelo PM que estiver mais próximo." O advogado João Tancredo, que também foi assistente da acusação, lembrou que a decisão dos jurados foi contrária às provas dos autos. A balística e as câmeras de segurança mostram que o carro de Alessandra recebeu 17 tiros, todos da polícia. "Ele diz que atirou no carro dela, confundindo com o veículo dos criminosos. O absurdo é que o júri não nega os fatos, mas acredita que ele agiu no estrito cumprimento do dever legal. É dizer às tropas: pode matar à vontade." Paulo Roberto disse que sempre se sentiu "acalentado" pelas pessoas, que se solidarizaram com ele após o caso. "Fiquei estarrecido porque a sociedade absolveu o algoz do João Roberto. As pessoas devem se perguntar: e se fosse comigo? Essas pessoas (os PMs) não estão lá para nos defender, mas para nos executar." Tanto a promotoria quanto a defesa recorreram da decisão. O advogado de De Paula, Maurício Neville, não concordou com a condenação pelo juiz Paulo Valdez por lesão corporal (os jurados só decidem sobre crime contra a vida). "O crime menor não pode se sobrepor ao crime maior", afirmou. Para Neville, os jurados entenderam que o cabo não quis matar João Roberto nem atirar contra a família. "Ele está aliviado. Voltou para casa agora à tarde, para os filhos. Ele é pai de três crianças e a mais velha é cega."

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