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População opina sobre o parque Villa-Lobos

Por Agencia Estado
Atualização:

Não é nenhum Ibirapuera. Mas, com as copas das árvores já intrincadas, formando bosques típicos de mata atlântica, pássaros dando o ar da graça e muita gente nas alamedas, ciclovia, quadras de futebol, tênis e basquete, pedalando bicicletas e deslizando em patins, o Villa-Lobos - parque de R$ 1.386.923.879,83 na Marginal do Pinheiros - aos poucos vai se integrando à paisagem da zona oeste e conquistando mais e mais adeptos. De segunda a sexta-feira, cerca de 3 mil pessoas caminham, correm, exercitam-se nos aparelhos de ginástica, praticam esportes, namoram, contemplam o pôr-do-sol. Nos sábados, esse número pula para 20 mil. Nos domingos e feriados de tempo bom, são 30 mil em busca de lazer. Durante o horário de verão, o parque tem ficado aberto até as 19 horas, a não ser quando desaba um temporal, com raios, como no aniversário da cidade. Nesse caso, as pessoas são convidadas a sair. Sentados em círculo, sob o sol forte, alguns adolescentes de Pirituba tocavam violão e cantavam em um dos gramados, um dia desses. No meio da tarde, a chuva os empurrou para baixo da marquise, na entrada do parque, que mais lembra uma pista de pouso ou uma praça de pedágio. Mesmo molhados, os jovens continuaram a cumprir, modestamente, o destino musical idealizado para o parque pelo arquiteto Décio Tozzi, que o projetou. Concertos - Muito verde e muita música. Uma "cidade da música", imaginou Tozzi que seria o parque que tem o nome de Heitor Villa-Lobos, o revolucionário compositor brasileiro de música clássica, um sonhador. Concertos de orquestras, corais, balés e até uma ilha musical onde 10 mil pessoas assistiriam aos espetáculos. A mata está em formação. Quanto à música... Além do canto dos bem-te-vis, por enquanto pode-se ouvir o violão e as vozes dos meninos de Pirituba. Com dinheiro no bolso só para uma condução, para chegar lá eles se encontraram na Vila Piauí e pegam o ônibus que passa no parque. Ao chegar na entrada árida, cheia de concreto, onde se concentram as bicicletas de aluguel e os vendedores de comilanças, Heitor Villa-Novas, de 9 anos, sentiu uma fome danada. "Queria tanto um pastel com caldo de cana", contou. "Mas tive de esconder a vontade no fundo do estômago." Chocada com o custo do parque, Nancy, de 17 anos, irmã de Heitor, acha que o governo fez um péssimo negócio. "Tudo bem que é bacana vir aqui, mas tem coisas que a gente precisa muito mais." Para Ísis Guarnieri dos Santos, da mesma idade, o Villa-Lobos é mais aproveitado pelos moradores das redondezas. "É muito difícil ver alguém realmente pobre aqui. Deve ser porque não têm dinheiro para o ônibus nem para o pastel". "O parque fica na divisa do Alto de Pinheiros, que é de rico, com o Jaguaré, carente. Atrai os dois públicos", diz a secretária-adjunta da Juventude, Esporte e Lazer do Estado, Luciana Temer Castelo Branco. Segundo ela, 300 crianças pobres da região têm aulas gratuitas de tênis. Shows de grande porte, avisa, não vão ser mais realizados no parque. "Queremos levar música clássica com caráter pedagógico, explicando o que está sendo tocado." Acertos ainda estão sendo feitos para a Jazz Sinfônica do Estado exibir-se lá uma vez por mês. Projeto - Tozzi lamenta que o Parque Villa-Lobos não seja ainda nem a metade do que ele imaginou. O projeto dele tem dois grandes elementos - o bosque e o programa cultural. Com mata biodiversificada (60 mil árvores de 300 espécies diferentes, incluindo jequitibás, angicos, cedros, jacarandás e pau-brasil), o bosque tem a importante função de restabelecer o equilíbrio ambiental na região, trazer de volta a fauna, o frescor do vale. "Estudos da USP mostram que massas de asfalto e concreto formam as ilhas de calor que expulsam a fauna e transformam a natureza em deserto. É preciso dotar a cidade de massas arborizadas para atingir o recomendável para metrópoles, de 12 a 15 metros quadrados de área verde por habitante." São Paulo tem menos de 3 metros quadrados. Além da mata atlântica, o bosque do Parque Villa-Lobos contém 12 grandes clareiras para uso da população. Como é um parque absolutamente contemporâneo, de última geração, é temático. Os de primeira geração se destinam a caminhadas, passeios, contemplação - têm um certo clima bucólico. Os novos parques procuram unir o tempo livre a conhecimento, lazer e cultura. No parque idealizado pelo arquiteto, as crianças teriam um centro de convivência, um museu e uma "oficina de pensar". Haveria auditórios, espaços para artes visuais, um anfiteatro ao ar livre para 5 mil pessoas e um grande ponto de encontro, o Passeio Uirapuru - uma das peças do maestro Villa-Lobos. Nada feito ainda. Por enquanto, os freqüentadores contam com o bosque, alguns jardins e quiosques, a ciclovia e uma disputada área esportiva com meia dúzia de quadras e um campo de futebol. O projeto que, segundo Tozzi, não é só dele mas dos moradores da região, que sempre quiseram ocupar com um parque aquela área vazia, utilizada para desova de entulho e cadáveres, está sendo zelado pelas associações de bairro. "Elas se manifestam sempre que alguém quer fazer alguma coisa fora da proposta." Em 1988, quando levou a idéia ao governador Orestes Quércia - morador do bairro, na época - o Estado avaliou o terreno em cerca de US$ 40 milhões e achou o preço bastante razoável. "Hoje em dia seriam US$ 80 milhões ou R$ 240 milhões se o valor tivesse sido depositado em juízo", diz Tozzi. "A cidade teria um parque do tamanho da metade do Ibirapuera a um custo normal." Para o arquiteto, o preço atual do Villa-Lobos é um grande equívoco. O terreno fica numa Z-8, com baixíssimo potencial de aproveitamento imobiliário e sem grande valor comercial. "Como cidadão, espero que a Justiça encontre os meios para rever o absurdo que se tornou o custo dessa desapropriação." Lotação - É também o desejo da vendedora Edilaine Álvares, de 34 anos. Segunda-feira, ela foi com o colega Rodrigo Queiroz jogar tênis. Todas as quadras estavam ocupadas. "Deviam fazer outras. Quanto ao pagamento da dívida, sou contra. Tem de se dar um jeito no preço." Mesmo achando injusto, para Queiroz só não se pode perder o parque. "Está sempre lotado e não há outro nessa região." Morador ao lado, o comerciante Eduardo Angelini, de 41 anos, acha que o parque não vale o que está sendo pago. "Há outras prioridades. Aqui ou se corre ou se anda de bicicleta: é pouco benefício para um preço tão alto." Também freqüentadora assídua, a médica Ana Cecília Sucupira, de 45 anos, que reside na Vila Madalena, é taxativa. "Não vale de jeito nenhum. É um parque só para rico." O engenheiro, professor e autor de livros didáticos Geraldo Covre vive no Alto de Pinheiros, a 300 metros do parque, e anda lá todo dia. Ele sente falta de um lago para diminuir a aridez do local. "Quanto à situação que foi criada pelo moço que morava naquele prédio ali (referindo-se ao ex-governador Orestes Quércia) é irreversível, não dá para devolver." Gerente de uma panificadora, Sílvio da Silva Ferraz, de 32 anos, morava até pouco tempo atrás em Santo Amaro, zona sul, onde corria pelas ruas menos movimentadas. Agora reside no Alto da Lapa e às 15 horas já está dispensado do serviço. Aproveita para correr no parque. "Claro que vale a pena", diz, sem interromper a corrida. "É excelente, mas não vale tudo isso", opina o comerciante Mauro Vieira, de 42 anos, também morador no bairro. Nos fins de semana, ele leva o filho, Matheus, de 6 anos, para brincar no parquinho e andar com a própria bicicleta. Para ele, aluga uma, por R$ 3,00. "É muito mais cômodo." De segunda a sexta, Alexandre Nunes, de 40 anos, vende cosméticos. Nos fins de semana, aluga bicicletas no parque. A frota de quatro locadoras chega a 350 veículos. "O pessoal de classe média vem só durante a semana. Nos outros dias, o parque é do povo." Proibição - Admirador incondicional do parque, o analista de sistemas Renato Guglielmetti Júnior, de 49 anos, acha que a afluência de público justifica o investimento, ainda mais depois da proibição de uso da Cidade Universitária. Segundo ele, todas as pessoas que conhece adoram o parque. "A área verde é ainda bebê, mas muito agradável." Em visita ao Villa-Lobos pela segunda vez, a terapeuta holística Samira Cardoso, que mora na Mooca, concorda. "Este parque é necessário." O administrador de empresas Antonio Silvio de Queiroz, de 40 anos, orgulha-se de ter apresentado o Villa-Lobos aos amigos. De vez em quando, caminhando, esbarra com um deles. "Fizemos divulgação no boca a boca e hoje vem uma massa." Embora ele, os filhos e o cãozinho Bruce del Plata desfrutem muito o parque, Queiroz sente-se constrangido de pensar no que se poderia fazer com tanto dinheiro gasto na compra. "Seria melhor investir em moradia e saúde, mas a gente também precisa de áreas de lazer."

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