Prisão de 159 pessoas em show no Rio foi politizada, diz defensor público

A defensoria alega que 139 deles não têm antecedente criminal, que foram presos sem flagrante e, portanto, sem justificativa

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Por Fernanda Nunes
Atualização:

RIO - A prisão de 159 pessoas em um show de pagode na zona oeste do Rio, no último dia 7, "foi um caso de flagrante injustiça", segundo o defensor público-geral do Rio de Janeiro, André Castro. "Isso jamais aconteceria numa casa de show da zona sul", complementou. O ministro extraordinário de Segurança Pública, Raul Jungmann, disse em entrevista que os presos devem explicar o que faziam numa festa de milicianos. Mas a defensoria alega que 139 deles não têm antecedente criminal, que foram presos sem flagrante e, portanto, sem justificativa e que foram cometidas arbitrariedades legais nas prisões, o que demonstra a politização da ação da polícia.+ 139 dos 159 presos acusados de integrar milícia não eram investigados

A Polícia Civil afirmou que a operação desarticulou uma milícia que atuava em Santa Cruz, na zona oeste da capital fluminense Foto: Polícia Civil

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Segundo Castro, o episódio é ainda mais grave do que "os casos clássicos de prisões de jovens negros e pobres", comuns nas comunidades mais carentes da cidade do Rio de Janeiro. Esse, em sua opinião, tem o agravante de ter sido cometido coletivamente e com pessoas que, nitidamente, não teriam como participar de quadrilhas de milicianos, como sustenta a acusação contra os presos. 

Em nota, a assessoria de imprensa da Polícia Civil informou que todas as prisões foram feitas em flagrante e depois foram convertidas em preventivas pela Justiça. Para os investigadores, o evento no qual as 159 pessoas foram presas era “uma festa em homenagem a milicianos, com ostentação de armas e seguranças com fuzis controlando todo acesso às dependências do local”.

“Ressalta-se que em audiências e decisões que passaram pelo crivo da Justiça não foi mencionada nenhuma ilegalidade. Cabe esclarecer que, no Estado Democrático de Direito, quem decide sobre a culpabilidade durante o processo criminal é o Judiciário”, diz a nota enviada pela Polícia Civil.

Já para a Defensoria Pública, a maior parte dos presos mora na região onde aconteceu o show, no bairro de Santa Cruz, e tem profissão comprovada. Esse é o caso do artista circense Pablo Martins, que deixou o Complexo Penitenciário de Bangu, também na zona oeste, na tarde de sábado, 21. Ele passa a maior parte do tempo fora do País e, nesta semana, deve viajar para a Suécia.

"O caso do Pablo é idêntico ao dos demais. Por isso acredito que a liberação dele deve ser estendida aos outros. Ele saiu antes pela repercussão midiática da sua prisão. Associar um palhaço à milícia é muito difícil, um absurdo", afirmou o defensor público-geral.+++Artista liberado de Bangu pede justiça para amigos presos em suposta festa de miliciano

Há outros exemplos como o de Pablo, segundo Castro. O defensor conta que entre os presos há um homem com transtorno mental, que precisa de remédios e tratamento médico. Até ontem, 40 famílias procuraram a Defensoria Pública em busca da defesa dos seus parentes. Na manhã deste domingo, após a soltura do artista circense, o número cresceu, de acordo com Castro. Ele não soube dizer exatamente quantos casos a Defensoria Pública defende.

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O instrumento de defesa utilizado até agora tem sido o habeas corpus e recursos nos pedidos de habeas corpus. A denúncia ainda não foi oferecida pelo lado da acusação, o que limita o trabalho da Defensoria. "Politizaram muito para demonstrar que foi uma grande ação contra a milícia. Mas não foi o caso. Por isso, agora, têm dificuldade de retroceder", afirmou o defensor público-geral, acrescentando que, no dia, há relatos de agressão de mulheres e que homens foram liberados da prisão por não caberem no ônibus que transportou parte do público do show à prisão.

Em vídeo gravado após sua liberação do presídio de Bangu, o artista circense Pablo pede justiça para os amigos. "Não desejo isso para ninguém, nem para um inimigo, nem para os meus amigos. Que a justiça seja feita o mais rapidamente possível", afirmou.

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