Rede de amigos no País banca vinda de africanos

Todos os 25 resgatados no fim de semana tinham parentes no Brasil, que pagaram atravessadores; grupo planejava chegar ao Porto de Santos

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Por Diego Emir
Atualização:
Modou Lo e Aliou Seck. Primos de origem senegalesa relataram problemas desde o início Foto: Diego Emir/Estadão

SÃO LUÍS - Pagando um valor entre 1 mil euros (R$ 4,3 mil) e 1,1 mil euros (R$4,7 mil), um grupo de 25 africanos foi seduzido por uma vida melhor no Brasil. Transportados por dois brasileiros em uma embarcação com capacidade para 15 pessoas, partiram de Cabo Verde e tinham como destino final o Porto de Santos, de onde partiriam para São Paulo, Rio, Brasília, Curitiba e Fortaleza, entre outras cidades. Acabaram resgatados no sábado, após mais de uma semana à deriva no litoral nordestino.

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Entre os africanos estavam 20 cidadãos de Senegal, 3 da Nigéria e 2 de Guiné-Bissau. Todos que chegaram tinham parentes no País, que foram responsáveis por manter contato com intermediários dos supostos atravessadores – popularmente chamado de “coiotes”. A investigação da Polícia Federal e os depoimentos dos africanos apontam que uma extensa rede formada por brasileiros e cabo-verdenses está trazendo pessoas para o Brasil.

++ Imigrantes resgatados em barco precário no Maranhão estavam há 35 dias no mar

Relato. Modou Lo, de 31 anos, e Aliou Seck, de 28 anos, são primos de origem senegalesa, que já têm parentes em Fortaleza. Ao relatar a travessia de Cabo Verde até o Brasil, Modou Lo contou que não faria nunca mais a viagem, pois ficou com medo de morrer. O senegalês diz sonhar em trazer o restante de sua família, porém prefere juntar dinheiro e pagar uma passagem de avião.

Alseny Diallo, de 31 anos, conta ter um primo residindo em São Paulo, que foi o responsável por fazer contato com um homem em Cabo Verde. O valor de ¤ 1 mil teria sido pago a esse intermediário. O senegalês diz que trabalhava como motorista e buscava no Estado paulista um trabalho melhor, além da possibilidade de estudar. “Só que passamos um mês e cinco dias no mar. Com 15 dias de viagem, a comida acabou. Foram os piores dias da minha vida.”

A viagem começou no dia 16 de abril, em Cabo Verde, onde o grupo já passou por situações degradantes. Sem condições adequadas de transporte e alimentação, os africanos ficaram expostos a maresia, sol e chuva, além de ter apenas dois biscoitos e um litro d’água por dia. No dia 14 de maio, houve problema no motor e quebra do mastro da vela, o que os deixou à deriva.

De acordo com o delegado da Polícia Federal, Robério Chaves, a procedência do barco era do Haiti, porém não havia nenhum haitiano na embarcação nem a informação se de fato foi comprado no país caribenho.

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Os brasileiros detidos, um do Rio Grande do Norte e o outro da Bahia, responsáveis pelo transporte, não tiveram a identidade revelada. Eles foram transferidos para o Complexo Penitenciário de Pedrinhas ainda no domingo. Segundo os delegados, os brasileiros entraram em contradição em seus depoimentos. Um afirmou estar fazendo turismo no mar de Cabo Verde e já o outro disse que acabaram prestando ajuda aos africanos que estariam em um barco à deriva.

Sem precedente. O chefe da Delegacia de Imigração, Luis André Lima Almeida, não descartou a possibilidade de o Maranhão estar virando uma rota clandestina de tráfico de pessoas. Só que o caso tem caráter inédito no Estado. “Nos últimos dez anos, não temos relato de tamanha quantidade de pessoas tentando entrar irregularmente pelo Maranhão.”

Nesta segunda, os africanos passaram por atendimento médico e fizeram exames. Todos estão com anemia. O grupo já foi atendido por uma equipe multidisciplinar da Secretaria Estadual de Direitos Humanos, que identificou a vontade de os africanos permanecerem no País. O delegado Luis André informou que será aberto procedimento de repatriação ou pedido de refúgio aos africanos, dependendo da situação de cada um. 

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