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Reforma e família recuperam ''Cadeião''

Participação da comunidade foi fundamental para transformar realidade de escola na zona leste de São Paulo

Por Vitor Hugo Brandalise
Atualização:

Com o apelido que tinha, difícil esperar que a Escola Estadual José Chediak, no Parque São Lucas, zona leste de São Paulo, fosse muito mais do que era. Ninguém queria estudar no "Cadeião", como os alunos se referiam ao prédio de janelas cinzentas, grades pretas e paredes azuis desbotadas, tomadas por pichações. "Usavam drogas na rua ao lado, fumavam maconha no banheiro, tinha briga na frente da escola todo dia, ninguém respeitava ninguém", resume Tayna Souza, de 17 anos, aluna da escola desde 2001. "Como estudar num lugar assim?" Parecia impossível livrar o Cadeião da sentença que recebera. A virada veio em maio de 2005, a reboque de pulso firme, incentivo à participação da família no cotidiano escolar e uma reforma no edifício. "Se já está pichado, todo mundo vai querer pichar. Se a escola é bem cuidada, a própria comunidade se orgulha dela e a defende", afirma a diretora, Vilma Lanzotti, que assumiu a direção no início da reforma - e é apontada, por funcionários e alunos, como responsável pelo ressurgimento da escola. Em seis meses, Vilma repaginou as 45 salas de aula, os jardins, o anfiteatro, a quadra. Cobriu o azul desbotado e as pichações por duas mãos de um laranja vibrante. E implementou um conselho de classe "participativo", no qual pais se encontram com os professores a cada bimestre. Além de dar aos pais um retorno do desempenho do aluno, a idéia era mostrar à comunidade a escola que surgia. E foi ali que o Cadeião deixou de existir. "De tanto ouvir falar bem, os pais vieram conhecer a escola e participar dos projetos", afirma Vilma. "Chamamos a comunidade para nós. Hoje, quase não há mais brigas e o índice de comparecimento dos pais às reuniões é de 90%." Bem diferente do que acontecia no antigo Cadeião. "Tinha briga pelo menos três vezes por semana", lembra Tayna. "Havia grupos rivais que brigavam até com barras de ferro. Às vezes acabava no hospital", conta o estudante Felipe Zan Maioralli, de 17 anos. "E tinha briga de professor com aluno. Uma vez, um garoto se irritou com o professor e jogou uma carteira nele", lembra Arthur da Silva, de 18 anos. "E o professor quis revidar, mas seguraram." Para especialistas, esses exemplos de violência localizada, mesmo que de menor impacto, têm significado idêntico ao da "rebelião" ocorrida na Escola Estadual Amadeu Amaral, a 11 quilômetros dali, no Belém - foi lá que, na quarta passada, alunos trocaram socos, quebraram vidros, arrombaram portas. "A violência nas escolas tem origem comum. Ocorre quando a palavra escola perde o significado, deixa de valer como local de crescimento e aprendizado, para ser algo sem valor", afirma a coordenadora de Ciências Humanas e Sociais da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) no Brasil, Marlova Noleto. "Se há fórmula para combater a violência, ela passa, necessariamente, pelo relacionamento com a comunidade e com a família, responsabilidade dos gestores da escola e pelo compromisso com a qualificação dos professores, que deve ser cobrado do Estado." No caso da José Chediak, as melhorias se refletiram em aumento na procura - enquanto entre 2000 e 2005 a busca por vagas na escola declinava, com média de 900 alunos matriculados por ano, em 2006 e 2007 o número de matrículas foi de 1.900. "Aumento no número de alunos também quer dizer maior procura dos pais. Tem dia que atendemos até 15 numa só manhã", afirma Vilma. "Mas é assim que se faz para aproximar a comunidade da escola e é essa a fórmula aqui."

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