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Rio condena mais os pequenos traficantes

Maioria pega com drogas é ré primária, presa em flagrante

Por Felipe Werneck
Atualização:

A maioria dos condenados por tráfico no Rio é de réus primários que foram presos em flagrante, sozinhos, desarmados e com pequenas quantidades de droga, aponta pesquisa realizada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Foram analisadas 391 sentenças entre outubro de 2006 e maio de 2008. O objetivo do trabalho, encomendado pelo Ministério da Justiça, foi analisar a aplicação do artigo 33 da lei n.º 11.343/06, a Lei de Drogas. O secretário de Assuntos Legislativos do ministério, Pedro Abramovay, disse que o objetivo é usar pesquisas como essa para subsidiar eventuais mudanças na legislação. "Muitas vezes a criação de leis ocorre por pressão da mídia ou porque um deputado acha que vai ganhar votos. O debate não pode ser feito a partir de preconceitos", disse ele, durante a apresentação. Abramovay ressalvou que o resultado não reflete necessariamente a opinião institucional do governo, mas disse que, agora, o debate "pode ser feito com argumentos e passa para o campo da democracia". A coordenadora da pesquisa, Luciana Boiteux, avalia que a lei atual não permite uma diferenciação segura entre usuários e traficantes. Segundo ela, na maioria das vezes quem fica responsável pela distinção são delegados. "Os juízes tendem a manter a primeira tipificação dada pela polícia", disse. Nas varas criminais do Tribunal de Justiça do Rio, 66,4% dos condenados eram réus primários, 60,8% estavam sozinhos no momento da prisão, apenas 14% usavam armas e 91,9% foram detidos em flagrante. Metade dos condenados por tráfico de cocaína levava até 21 gramas da droga. Nas varas federais, o porcentual de réus primários chegou a 80,6%. A pesquisa também analisou 339 sentenças em Brasília. Lá, os réus primários representaram 38% nas varas criminais e 60%, nas federais. "A gente espera que a pesquisa seja o ponto de partida e não de chegada, que ela possa contribuir para a melhoria da legislação atual. O direito penal só deve ser usado em último caso", disse Luciana. Ela defende uma mudança na redação do parágrafo 4.º do artigo 33 da lei que delimite de forma clara quem é o pequeno traficante. A pesquisadora aponta como contraponto a legislação portuguesa, que descriminalizou o uso e definiu o usuário como aquele que leva até dez doses diárias da droga, para consumo próprio. "Será que a atual estratégia em relação às drogas é a melhor?", indagou Abramovay. "Me parece que trata-se de uma política equivocada. Talvez o que estamos fazendo seja só engrossar as fileiras do crime organizado." Para ele, o contato de réus primários com o crime organizado que ocorre nas prisões poderia ser evitado se a lei fosse mais clara na definição de quem é traficante e quem é usuário.

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