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Santos quer levar ossos de inventor

Restos mortais de Bartolomeu de Gusmão, que estão em SP, viraram motivo de disputa entre as duas cidades

Por Rodrigo Brancatelli
Atualização:

Estava praticamente tudo certo - festa marcada, convites enviados, imprensa avisada, comes e bebes encomendados. Todos os detalhes prontinhos em Santos para que a cidade no litoral paulista recebesse os restos mortais de um de seus filhos mais ilustres, o cientista e inventor Bartolomeu Lourenço de Gusmão, depois de 285 anos de sua morte. Um espaço especial na cripta da Catedral de Santos já tinha sido até reservado para receber a valiosa urna funerária talhada com cruzes e folhas, forrada com veludo vermelho e com os ossos embrulhados em um nobre tecido roxo. Só faltou nessa história toda avisar a cidade de São Paulo, que não gostou nada, nada mesmo, da notícia. Bartolomeu de Gusmão, considerado por muitos o inventor do balão a ar quente e uma das maiores figuras da história da aeronáutica mundial, repousa desde 2004 na cripta da Catedral da Sé, no centro da capital. É considerado o primeiro cientista das Américas - sua mais famosa criação completou 300 anos neste mês. Como ele morreu em Toledo, seus restos mortais só voltaram ao País em 1966, para serem guardados no Museu de Aeronáutica da Fundação Santos Dumont, no Parque do Ibirapuera, depois em uma igreja em Cotia, depois no Mosteiro de São Bento e finalmente na Sé. Após tantas mudanças e cuidados para proteger a ossada, os guardiães paulistanos torceram o nariz quando descobriram os planos santistas de levar Bartolomeu de Gusmão para a praia. O que era para ser uma festa virou então um longo debate, uma bela polêmica e uma briga nos bastidores digna de uma disputa política na Assembleia. "Não tem sentido ir para lá, ele está quietinho aqui", diz o padre Paulo Flávio da Silva, coronel capelão do 4º Comando Aéreo Regional, que, em 2006, organizou uma festa com o canto gregoriano dos monges de São Bento para homenagear Bartolomeu de Gusmão. "Fizemos um grande esforço para trazer os ossos da Espanha, fui eu mesmo que colocou os ossos na urna, embrulhados em um tecido lindo. A Sé é referência no Brasil, ali na cripta estão os restos mortais de arcebispos, do padre Feijó e do cacique Tibiriçá. Todo dia há grupos que vão lá conhecer a cripta, então não teria por que ele sair dali." Em meio a colunas de granito, arcos com tijolos aparentes com pé direito de 7 metros de altura e piso de mármore de Carrara por quase 620 m², a urna do inventor santista (ainda) está abrigada na cripta da Sé. Para marcar visita é preciso ligar no telefone 3107-6832. Segundo a prefeitura de Santos, no entanto, essa não é a melhor morada para os restos de Gusmão. "Desde que ele veio de Toledo, era já para ter vindo para cá. Tenho até recortes de jornal da época que mostram isso, até com o presidente Castelo Branco afirmando que iria participar do cortejo até Santos", diz o presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Santos, Paulo Gonzalez Monteiro. "Encaro a estada dele em São Paulo como provisória." INVENTO Há milhares de anos os chineses utilizavam balões como brinquedos. No entanto, o primeiro voo da história num aeróstato (aeronave que ganha altura e se mantém no espaço por efeito da ação de um gás mais leve do que o ar) deve-se a Bartolomeu de Gusmão que, em 1709, perante a corte em Lisboa, apresentou um invento da sua autoria batizado de Passarola - nada mais do que um balão de ar quente de grandes dimensões A secretária de Turismo de Santos, Wânia Seixas, tem reunião marcada para 4 de setembro com o arcebispo d. Odilo Pedro Scherer para tentar resolver o imbróglio. "Já fizemos o pedido formal para que a urna venha para a nossa cidade", diz. "Queremos recuperar a memória de Santos e trazer Bartolomeu de Gusmão para cá seria uma iniciativa nesse sentido. Sempre que pensam em Santos pensam em Pelé, mas queria que também pensassem no inventor do balão."

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