Silvio Santos evitou morte do seqüestrador

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Por Agencia Estado
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O seqüestrador Fernando Dutra Pinto de 22 anos, não foi morto hoje pela polícia graças ao empresário Silvio Santos. Policiais fixaram por duas vezes o ponto vermelho da mira laser de suas armas na testa de Fernando. Estavam decididos a matar o bandido para salvar o refém. Com os braços abertos, de shorts e camiseta, o apresentador entrou na frente do bandido e disse aos policiais: "Vamos resolver isso com calma." A inferno na mansão do Morumbi começou quando Silvio Santos descera para tomar café e ler os jornais do dia quando, entre a cozinha e a sala de ginástica de sua mansão, deparou-se com Fernando Dutra Pinto. Pistola automática na mão direita, revólver na mão esquerda, gorro na cabeça, Fernando disse. "Eu sou a pessoa que seqüestrou sua filha. Não faça nada. Já fiz muita besteira e posso fazer mais." Ajuda Eram cerca de 7h30. Silvio Santos pediu calma. Sugeriu que os dois sentassem à mesa da cozinha, ofereceu café e prometeu que o ajudaria. "Estão atrás de mim. A polícia quer me matar. Por isso vim aqui. O senhor pode me ajudar", pediu Fernando. Ferido nas nádegas por um tiro disparado por um dos policiais que matou na noite de quarta-feira num flat em Barueri Fernando teve dificuldade para se ajeitar na cadeira, sempre apontando a arma para a cabeça do apresentador e proprietário do SBT. Silvio disse ao rapaz que a família, ainda abalada com o seqüestro de Patrícia, estava dormindo e pediu-lhe que nada fizesse. O aparelho de TV foi ligado na cozinha e na sala para que Fernando pudesse acompanhar toda a movimentação externa. Queria saber a polícia preparava algum plano de invasão. Helicóptero Fernando começou a conversar com o apresentador. Disse que de madrugada, enquanto fugia da polícia, tinha chegado à conclusão de que a única maneira de escapar de ser morto era se abrigar na mansão dos Abravanel. "Aqui tenho chances até para uma fuga. Que pode ser num helicóptero." Ele revelou que dormiu num terreno próximo da casa. Assim que clareou, decidiu entrar, aproveitando um "descuido" dos seguranças. Fernando disse que passou duas vezes em frente a residência. Ao perceber que os seguranças estavam "desatentos" encostou no muro e pulou, arrebentando um dos fios do sistema de alarme da casa, que não funcionou. Nervoso Sempre tratando Silvio Santos por "senhor" ou "senhor Silvio", Fernando ficou nervoso quando viu a chegada de seguranças de uma empresa acionada pelos vigias da mansão e de policiais militares que se postaram diante da casa. Mudou de comportamento. Começou a gritar, ameaçando matar o apresentador se houvesse invasão. O momento mais crítico ocorreu quando ele viu dois PMs entrarem pela lateral da residência. Um dos policiais era o major Serpa, do Batalhão Policial do Morumbi. Ele prometeu a Fernando dar-lhe todas as garantias caso ele se entregasse. O seqüestrador mandou os PMs saírem da casa. Mas aceitou o pedido do apresentador de liberar sua família e os empregados. Camisola As filhas de Silvio Santos e uma amiga delas recém-chegada dos Estados Unidos, que dormira na casa, saíram ainda de camisola e pijama. Íris, a mulher do apresentador, estava com um roupão. Elas seguiram para a casa de um vizinho. O major Serpa disse várias vezes para que Fernando mantivesse a calma e nada fizesse. "Ele parecia transtornado e poderia cometer uma besteira", explicou o major. Com a chegada de delegados e investigadores da Polícia Civil, Fernando voltou a ficar nervoso e a fazer ameaças ao apresentador. Exigiu que os civis deixassem a casa e disse que só negociaria com a Polícia Militar, que enviou soldados e oficiais do Grupo de Ações Táticas Especiais (Gate) ao local. Governador Depois de desistir do helicóptero para fugir, Fernando passou a exigir a presença do governador Geraldo Alckmin. "Quero o governador", gritava. "Só ele, mais ninguém." Mas Fernando ficou surpreso com a chegada à casa de Silvio Santos de outra pessoa: o pai, Antônio Sebastião Pinto, levado por policiais civis. O seqüestrador abaixou a cabeça ao ser repreendido por Antônio, que entrou na cozinha, mas manteve a pistola automática na mão direita. "O que você fez, meu filho? Você e seu irmão deixaram a casa de Deus para nos envergonhar." Fernando disse ao pai que estava assustado: os policiais civis queriam matá-lo e a única maneira de escapar era com a presença do governador. Antônio não conseguiu fazer o filho desistir da exigência. Fernando, o pai e Silvio Santos deixaram a cozinha e foram para um quarto na parte térrea da casa. Nem mesmo a chegada da irmã Lilian, também levada para a residência pelos policiais civis, mudou o estado de espírito do seqüestrador. "Quero o governador e um colete à prova de balas para sair daqui." Com isso, o comandante-geral da Polícia Militar, coronel Rui Cesar Melo, que estava na residência, fez contato com o secretário da Segurança, Marco Vinicio Petrelluzzi, no Palácio dos Bandeirantes. O governador somente concordou em ir à casa de Silvio Santos depois de receber um telefonema do próprio apresentador do SBT. O helicóptero de Alckmin pousou na quadra de futebol do Colégio Pio XII, perto da mansão dos Abravanel. Melo recebeu Alckmin e Petrelluzzi diante da casa. Banho O governador entrou na casa, mas ficou na sala. A porta do quarto onde estavam o apresentador do SBT, o seqüestrador e o pai foi aberta. Ao ver Alckmin, Fernando concordou em se render. Antes de entregar as armas, porém, pediu para tomar banho. "Estou sujo. Minhas roupas também. Estou ferido. Dormi no mato e preciso sair daqui limpo." O seqüestrador recebeu roupas e sapatos de Silvio Santos. Após o banho, vestiu-se, tirou a munição das armas e entregou a pistola e o revólver para o comandante do Gate, capitão Diógenes Della Lucca. Fernando pediu perdão ao pai e desculpou-se com Silvio Santos "por tudo o que aconteceu". Saiu da casa algemado direto para um dos carros do Gate, estacionado na garagem. Deus Ao se despedir de Fernando, Antônio o aconselhou. "Eu disse que Deus tenha pena dele e que encontre o caminho para a sua salvação. Meu filho era bom. Não é essa pessoa que tive por algum tempo hoje à minha frente." Fernando foi levado para o Centro de Observação Criminológica (COC), no complexo penitenciário do Carandiru. Lá passou por avaliação médica e por exame de corpo de delito. Depois de medicado no ferimento nas nádegas, Fernando foi autuado em flagrante pelo delegado Itagiba Franco, titular da Divisão de Proteção Comunitária (Diprocom), da Polícia Civil. Responderá por dois crimes de seqüestro, resistência à prisão, duplo assassinato e invasão a residência. Oração Em suas declarações ao ser autuado, Fernando disse ao delegado Itagiba que, durante os dias em que Patrícia ficou no cativeiro, numa casa perto da mansão dos Abravanel ele, a namorada, Jenifer, e seu irmão Esdras, que está preso, chegaram a rezar juntos. "Patrícia pedia para que a gente ajoelhasse e orássemos." O rapaz afirmou que teve a idéia do seqüestro depois de ter perdido o emprego. Ele trabalhava como balconista numa empresa de Cotia e passou a levantar todos os detalhes sobre a vida de Silvio Santos. Com essa idéia na cabeça, leu num jornal sobre o lançamento do livro com a biografia de Silvio Santos. Comprou o livro e passou a planejar o crime. Tinha mesmo a intenção de seqüestrar o apresentador, mas depois se decidiu por uma de suas filhas. Ensaio Convidou para o seqüestro o irmão e o amigo Marcelo Batista, o Pirata. Eles estudaram o plano diversas semanas, chegaram a ensaiar e, para que tudo desse certo, Fernando escreveu num bilhete o que Esdras e Marcelo deveriam fazer no dia em que ocorresse a captura de Patrícia. Fernando arranjou dinheiro para alugar o imóvel que serviria de cativeiro. Deveria ser uma casa com garagem, que não provocasse suspeita. Comprou uma metralhadora, revólveres e perucas. Conseguiu com um amigo uma Bíblia. Bar Fernando levou a Bíblia para o cativeiro e a entregou a Patrícia, que lia passagens do texto todos os dias. "Nós sabíamos que ela era evangélica e conversamos muito sobre religião." Fernando e o irmão eram evangélicos. Deixaram de freqüentar os cultos da Assembléia de Deus e passaram a ir a um bar em São Miguel Paulista. "O Esdras não queria participar deste tipo de crime, mas achamos que seria bastante dinheiro." O plano para a entrega do dinheiro do resgate também partiu de Fernando. O rapaz conhece "todos os atalhos" de Cotia e Jandira, na Grande São Paulo. "Não deu tempo para nada", disse ele a um policial antes de ser autuado. "Gastei com roupas, pouca coisa." O capitão Lucca ficou impressionado com a sagacidade demonstrada pelo rapaz. Afirmou, entretanto, que houve uma "inversão de papéis". Fernando deixou Silvio Santos tomar as rédeas da negociação. O empresário teria prometido pagar o advogado de Fernando, segundo Petrelluzzi.

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