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Só uma multa por desrespeito a ciclista

Em 11 meses, apenas um motorista foi autuado em São Paulo pela CET

Por Rodrigo Brancatelli
Atualização:

Leis não faltam para pensar e inserir o ciclista no trânsito de São Paulo. O difícil é levá-las para a realidade. Segundo o Artigo 201 do Código de Trânsito Brasileiro, o motorista que "deixar de guardar a distância lateral de 1,50 metro ao passar/ultrapassar bicicleta" deve ser multado em R$ 85. No período de dezembro de 2007 a novembro do ano passado, no entanto, apenas uma pessoa foi autuada na cidade com base nessa resolução, segundo pesquisa da Gerência de Suporte à Fiscalização da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET). Esse número ínfimo vem a se somar a uma série de falhas nas políticas públicas que deveriam incentivar o uso de bicicletas em São Paulo - ao invés de abrir possibilidades para acidentes como o que matou a massagista Márcia Regina de Andrade Prado, de 40 anos, atropelada na quarta-feira por um ônibus na Avenida Paulista. Márcia, atuante nos movimentos que defendem o uso de bicicletas, sempre dizia para os amigos: "Eu não preciso nem de 1,5 metro. Se os carros dessem 20 centímetros para eu pedalar, já teríamos tranquilidade. Mas nem isso temos." A informação sobre o número de autuações com base no Artigo 201 foi repassada pela CET no fim do ano passado a um grupo de ciclistas por e-mail, ao qual o Estado teve acesso. Procurada, a Assessoria de Imprensa do órgão não respondeu aos questionamentos da reportagem e também não informou como um motorista foi multado - já que os marronzinhos não carregam uma fita métrica para medir a distância entre carros e bicicletas. "Parece até piada isso ", diz o presidente da Comissão de Assuntos e Estudos sobre Direito de Trânsito da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), seção São Paulo, Cyro Vidal. "Não precisamos de mais leis, precisamos de conhecimento e comprometimento." Na manhã de ontem, mais um ciclista foi atropelado por um ônibus, desta vez em Botafogo, na zona sul no Rio. Atleta de saltos ornamentais do Fluminense, Luis Carlos Matias Moreira de Lima tentou atravessar a pista na frente de um coletivo, que não conseguiu frear. O menino de 15 anos morreu na hora. MEMORIAL Às 18 horas de ontem, um grupo de 300 ciclistas se reuniu na Praça do Ciclista, na esquina da Paulista com a Rua da Consolação, para homenagear pelo terceiro dia seguido a massagista Márcia. Eles soldaram na calçada em frente ao local do acidente uma "ghost bike" (bicicleta fantasma, toda pintada de branco), espécie de memorial adotado no mundo inteiro para ciclistas mortos no trânsito. Os manifestantes também entregaram flores a motoristas de ônibus. A ideia do "ghost bike" surgiu em 2002 em São Francisco, em um projeto do artista plástico Jo Slota, e foi adotada em vários países da Europa. O secretário municipal do Verde e Meio Ambiente, Eduardo Jorge, já pediu ao secretário de Subprefeituras, Andrea Matarazzo, para que a "ghost bike" da Paulista não seja retirada por fiscais da Prefeitura. "Cuidaremos sempre para que essa homenagem vire um memorial permanente em São Paulo", disse o cicloativista André Pasqualini, do grupo Ciclo BR. "Também vamos escrever na bicicleta frases marcantes da Márcia, que sempre protestou contra a falta de políticas públicas para os ciclistas. Nós não iremos parar de reclamar nem parar de andar. A CET tem 4.800 funcionários para cuidar do deslocamento dos carros e apenas três cuidam de ciclistas. Uma hora o governo terá de nos enxergar."

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