STJ anula provas obtidas pela PF em investigação sobre filho de Sarney

Ministros da 6ª Turma consideraram ilegais as interceptações telefônicas dos envolvidos em[br]supostas irregularidades; empresário chegou a ser indiciado por lavagem de dinheiro, tráfico de influência e formação de quadrilha

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Por Mariângela Galucci/BRASÍLIA
Atualização:

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou as provas colhidas durante a Operação Boi Barrica, da Polícia Federal, que investigou suspeitas de crimes cometidos por integrantes da família do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Os ministros da 6ª Turma do STJ consideraram ilegais interceptações telefônicas feitas durante as investigações.Revelações sobre a Boi Barrica, feitas pelo Estado em 2009, levaram a Justiça a decretar censura ao jornal, acolhendo pedido do empresário Fernando Sarney, filho do senador.Com a anulação das interceptações ficam comprometidas outras provas obtidas posteriormente, resultantes de quebras de sigilo bancário e fiscal. Volta praticamente à estaca zero a apuração de uma suposta rede de crimes cometidos pelo grupo a partir de um saque de R$ 2 milhões em espécie às vésperas da eleição de 2006 e registrado como movimentação atípica pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). Na época, Roseana Sarney era candidata ao governo do Maranhão.Com as escutas e informações sobre movimentação financeira, a PF abriu cinco inquéritos e apontou indícios de tráfico de influência no governo federal, formação de quadrilha, desvio e lavagem de dinheiro.Em julho de 2009, depois de seis horas de depoimento na Superintendência da PF em São Luís, o empresário Fernando José Macieira Sarney, filho do presidente do Senado, chegou a ser indiciado por lavagem de dinheiro, tráfico de influência e formação de quadrilha.Precedentes. O STJ tomou a decisão ao analisar um pedido de João Odilon Soares, funcionário do grupo Mirante de comunicação, que pertence à família Sarney. Soares também foi investigado na Operação Boi Barrica.Para conseguir anular as provas, o advogado Eduardo Ferrão baseou-se em decisões anteriores tomadas pelo STJ e pelo Supremo Tribunal Federal (STF).Em uma dessas decisões recentes, o STJ anulou as provas da Operação Satiagraha, que investigou suspeitas de corrupção envolvendo o banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity. Na ocasião, os ministros da 5ª Turma do tribunal concluíram que foi ilegal a participação de integrantes da Agência Nacional de Inteligência (Abin) nas investigações."Os precedentes do STF e do STJ entendem que as decisões judiciais que autorizam interceptação têm de ser rigorosamente fundamentadas", disse Ferrão ao Estado. "O STJ falou q-ue está nulo porque (a investigação) não respeitou a Constituição Federal e a lei."Devassa. Segundo o advogado, as decisões judiciais não foram fundamentadas. "Eles não indicavam quais eram as suspeitas. E as interceptações foram prorrogadas por 18 vezes. Foram 200 dias de bisbilhotagem, foi uma devassa", afirmou.Ferrão também reclamou que a operação afetou pessoas que não estavam sob investigação, como advogados e jornalistas. De acordo com ele, isso ocorreu porque a Justiça Federal no Maranhão decretou a quebra de sigilo dos e-mails de todos os funcionários do grupo Mirante.O advogado sustentou que a anulação das provas não significa o fim das investigações e, consequentemente, a impunidade dos investigados. "As investigações devem prosseguir. Os investigados têm interesse em que as investigações sejam realizadas e concluídas. Mas de acordo com a lei", afirmou. "Os registros bancários continuarão existindo. Os extratos estarão disponíveis daqui a 10 ou 20 anos."Procurador. Em junho, após o STJ ter anulado provas da Operação Satiagraha, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel. criticou a Justiça. "A Justiça tem tido alguns excessos e tem colocado de lado, não considerando com a devida importância, a necessidade da tutela penal", disse. "Claro que podemos aprimorar a legislação, podemos trabalhar para corrigir este ou aquele equívoco que possa aparecer nas investigações, mas é preciso também que o Judiciário tenha, digamos assim, uma visão mais adequada ao enfrentamento da criminalidade, porque a sociedade clama por isso."A mulher de Gurgel, Claudia Sampaio, é quem cuida atualmente, no Ministério Público Federal, da Operação Boi Barrica. Os dois não foram encontrados ontem para comentar a decisão do STJ.Além de ter anulado provas da Boi Barrica e da Satiagraha, o tribunal tornou sem efeito, no passado, investigações das operações Castelo de Areia e Diamante, também da Polícia Federal. Em todos os casos, o STJ concluiu que ocorreram irregularidades nas autorizações de quebra de sigilo telefônico.

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