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TJ usa lei seca para favorecer motorista condenado por beber

Para que haja crime é necessário que condutor tenha 6 decigramas de álcool, diz relator

Por Vitor Sorano e Luisa Alcalde
Atualização:

No Tribunal de Justiça de São Paulo, a lei seca - que completa um ano no dia 20 - foi utilizada para extinguir a pena de motoristas que já estavam condenados por embriaguez ao volante. De dez recursos envolvendo crimes de trânsito e uso do bafômetro julgados de agosto do ano passado a 29 de maio último, 3 livraram os réus das penas impostas na primeira instância. Antes da lei seca, era crime conduzir "sob a influência de álcool" pondo em risco outras pessoas. Agora constitui crime dirigir com 0,6 grama de álcool por litro de sangue ou mais, independentemente de como o motorista esteja conduzindo. A alteração ocorreu no artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB). No entender da 8ª Câmara do Direito Criminal, a mudança extinguiu o crime cometido por um motorista condenado após se envolver em acidente sob influência de álcool em Itapetininga (172 km da capital). Policiais militares o acusaram de ter atingido outros veículos e ser encontrado demonstrando estado de embriaguez. O crime aconteceu em 6 de agosto de 2006. Na primeira instância, o motorista foi condenado a seis meses de detenção em regime semiaberto (convertidos em pena alternativa), suspensão de seis meses da carteira de habilitação, além de multa. "Com a vigência da nova lei, para que haja o crime de embriaguez ao volante é necessário que o condutor esteja com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 decigramas", escreveu o relator do processo, desembargador Louri Bariero. A advogada do réu, Maria de Lourdes Marques Vieira Cesar afirma que seu cliente foi tido como embriagado apenas por constatação subjetiva feita pelos policiais que o detiveram. Outro condutor condenado a oito meses e cinco dias de detenção em regime semiaberto, com suspensão do direito de dirigir e multa, foi absolvido pela 2ª Câmara Criminal do TJ. Policiais e um médico identificaram sinais de embriaguez, ao socorrê-lo após um acidente. A falta de exame de sangue não impediu a condenação à época. Mas, com a lei seca, a manutenção da pena depende da constatação técnica. "A nova norma deve retroagir para beneficiar o acusado e ante a ausência de prova segura da materialidade delitiva, deve o réu ser absolvido." BAFÔMETROS Os testes de bafômetro também têm recebido restrições por parte da Justiça paulista. Em duas das 10 decisões consultadas pela reportagem, os desembargadores argumentam que o exame não pode, por si só, condenar alguém. Nos dois casos, o relator é o desembargador Roberto Martins de Souza. A argumentação é que o artigo 306 fala em "alcoolemia", que significa "estado do sangue que tem álcool". O bafômetro, argumenta o desembargador, não mede a quantidade de álcool no sangue. O teste é considerado, assim, "inservível" para provar o crime. A recusa dos motoristas em se submeter ao bafômetro e ao exame de sangue clínico, já que a legislação estabelece que ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo, são algumas das dificuldades encontradas pela Justiça para fazer valer a lei seca, levar aos tribunais e condenar criminalmente quem bebe além do permitido e dirige. "Há um impasse jurídico penal. Após a recusa, advogados têm alegado que essa prova é imprestável", afirma o promotor Tomás Busnardo Ramadan. Também tramita no Superior Tribunal Federal (STF) uma ação direta de inconstitucionalidade proposta pela Associação de Bares e Restaurantes, que questiona a obrigatoriedade do bafômetro. "Esperamos que prevaleça o interesse público e o direito de proteger a sociedade de quem dirige embriagado", entende Ramadan. NÚMEROS 3 de 10 recursos julgados pelo TJ-SP em casos de crime de trânsito e uso de bafômetro livraram réus das penas estabelecidas em primeira instância 0,6 grama de álcool por litro de sangue é a quantidade mínima para um condutor ser indiciado por dirigir embriagado 8 meses de serviços comunitários foi a pena estipulada para um motorista condenado por dirigir sem habilitação e colocando em risco a vida de outras pessoas. Pena inicial era de prisão

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