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Tráfico nas escolas foge do controle da polícia

Por Agencia Estado
Atualização:

A cena povoa pesadelos de mães há décadas. Virou até estereótipo, como atribuir os erros do filho às "más companhias". Mas acontece mesmo, todos os dias, em São Paulo. A caminho da escola, uma armadilha. Primeiro, a maconha ou crack sai de graça. Algum tempo depois, para surpresa do aluno, vem a cobrança: ele é obrigado a comprar droga para o traficante que o iniciou no vício como compensação pelos "brindes". Daí para furtos em casa, na rua, contato com armas, violência pesada, é um passo. E o pior é que esse esquema de aliciamento nunca esteve tão fora do controle da polícia como atualmente. Segundo os próprios alunos, um dos locais sujeitos a esse ciclo de indução à dependência é a Escola Municipal de Ensino Fundamental (Emef) Felício Pagliuso, no Jardim Iguatemi, zona leste de São Paulo. Com uma agravante. Não era o pipoqueiro como na visão estereotipada, quem passava a droga para os estudantes, mas uma quadrilha da qual faziam parte dois traficantes nigerianos, presos no dia 6 pelo Departamento de Investigações Sobre Narcóticos (Denarc). O Jardim Iguatemi fica numa das regiões mais violentas da cidade. Na Avenida Ragueb Chohfi, principal corredor do bairro, até estouro de cano de escapamento assusta. "A gente pensa que é tiroteio", disse P.M.F, de 38 anos, pai de aluno. É nesse tipo de cenário que os traficantes atuam. O convite surge nas esquinas. "Você curte um tequinho (de maconha ou de crack)?" Uma aluna de 16 anos da Felício Pagliuso conheceu um rapaz de 18 anos vítima desse esquema. Foi assassinado, há dois anos. "Ele começou a fumar droga com os colegas dele. Ele catou pra vender, não tava conseguindo. Os moleques (traficantes) queriam que ele quitasse a dívida do mesmo jeito. Tinha gente que comprava dele e não pagava. A dívida aumentou. Os moleques foram na casa dele e, como o cara não tinha nada de valor, deram uma semana pra ele cair fora daqui. Ele não acreditou, ficou, os moleques assassinaram ele (sic)." Pesquisa - "É assim que funciona", reforçou o presidente do Sindicato dos Especialistas de Educação do Magistério Oficial do Estado de São Paulo (Udemo), Roberto Torres Leme. Há dois meses, pesquisa divulgada pela Udemo mostrou que em mais da metade dos casos de violência nas escolas do Estado há ligação com drogas. Conforme outro levantamento, do Denarc, traficantes agem nas imediações de cerca de cem escolas da capital. Na Felício Pagliuso, alunos dizem que há consumo de maconha no interior do prédio. Um portão lateral tem marcas de tiros. Segundo os estudantes, são resultado de ameaças feitas por traficantes em 2000. Eles dizem que, no ano passado, a escola foi vítima de toque de recolher e o fim das aulas noturnas foi antecipado várias vezes. A unidade é vigiada por guardas-civis. Na escola estadual Simão Matias, na Avenida Ragueb Chohfi, a queixa dos alunos é quanto à falta de aulas de educação física na quadra, desde abril. O motivo: o lugar fica ocupado por invasores. Aos professores, resta a opção de transferir atividades para a classe ou para o pátio do prédio. "A gente passa o dia inteiro fazendo lição. Numa aula de lazer nós não podemos brincar", reclamou um aluno. Uma vizinha disse que os "penetras" consomem maconha na quadra. O alambrado que cerca o lugar tem buracos. As traves estão danificadas. Os alunos culpam os invasores, que entram por um portão dos fundos, aberto. Há marcas de tiros em dois portões do prédio.

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